O
Brasil, por causa das idiossincrasias de seus governantes, errou
A pandemia completou mais de um ano, mas o Ano Zero — que marcaria a retomada econômica — ainda não começou no Brasil. Estamos muito atrasados em relação ao resto do mundo em decorrência das escolhas equivocadas do mundo político.
Como
diria Galvão Bueno, vai se criando um clima terrível. E, acrescento eu, também
para o governo. Sem uma oposição operacional, o governo se enrola em seu
próprio vestiário. Prosseguindo com a analogia esportiva, o governo caminharia
para o rebaixamento? E o que significa ser rebaixado na política? Sofrer
impeachment ou ser derrotado em 2022.
Com
50% de aprovação entre “ótimo”, “bom” e “regular”, parece improvável que o
governo seja rebaixado. Mas a campanha é ruim. A comunicação é péssima. A
vocação para criar polêmicas inúteis é sem fim.
Com uma esquerda fraturada e um centro sem personalidade, Bolsonaro poderia virar unanimidade nacional, servindo um bufê a quilo de novidades e bondades aos grandes núcleos políticos do país. E, tal qual uma espécie de Lula, poderia caminhar para mais quatro anos, com potencial para eleger o seu sucessor lá adiante.
Apesar
de fazer coisas extraordinárias na política monetária, na expansão do crédito,
na desbancarização, na manutenção das PPIs de Michel Temer e de não atrapalhar
(muito) o avanço de reformas relevantes, Bolsonaro quer capitalizar onde erra:
no combate à pandemia. Com o avanço das mortes, o governo corre o risco de
rebaixamento.
No
campo institucional existem duas certezas. O governo perdeu muito tempo para
agir. E não sabe o que fazer para enfrentar a crise econômica decorrente da
pandemia.
“Mesmo
que as políticas de enfrentamento da pandemia melhorem, a conta a ser paga será
alta”
Parte
do governo age como Édouard Daladier ou Neville Chamberlain,
primeiros-ministros, respectivamente, da França e da Inglaterra, nas tratativas
com Adolf Hitler sobre a anexação da Áustria e a invasão da Checoslováquia. Não
acreditavam na guerra nem se prepararam para ela. Mesmo quando mais que
evidente.
A
morte do Major Olimpio acendeu um tardio alerta de que as instituições terão de
intervir tanto na saúde quanto na economia, já que o repertório do governo é
pobre, desarticulado e mal ensaiado. As iniciativas do senador Rodrigo Pacheco
(DEM-MG) de tentar obter vacinas nos Estados Unidos, de propor um comitê de
emergência com governadores e de querer propor um novo refinanciamento de
dívidas tributárias mostram que as instituições querem agir acima das políticas
do Executivo. O alerta de Arthur Lira, presidente da Câmara, de que os erros no
combate à pandemia são “conhecidos”, “amargos” e alguns “fatais”, teve endereço
certo: o Palácio do Planalto.
Pouco
mais de um ano atrás, escrevi aqui sobre a pandemia e suas potenciais
consequências. O roteiro que tracei indicava um caminho a ser seguido. No
entanto, prevaleceram soluções tópicas, disputas de ego e negacionismo. E
nenhuma visão estratégica. O que escrevi aqui não era novidade, baseava-se no
que sabíamos ocorrer em outras grandes crises mundiais. O Brasil, por causa das
idiossincrasias de seus governantes, foi pela via errada.
No
mundo, a guerra contra a pandemia se encaminha para o final, enquanto no Brasil
o pior pode não ter acontecido ainda. Talvez, em alguns meses, comecem a sobrar
vacinas, mas o preço em número de vidas decorrente de nosso atraso terá sido
incalculável. E as perdas, irreparáveis. Mesmo que as políticas de
enfrentamento da pandemia melhorem, a conta a ser paga será muito alta.
Publicado
em VEJA de 31 de março de 2021, edição nº 2731
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