O Estado de S. Paulo
É exasperante ouvir e observar os ataques
violentos que nossa Carta Magna tem sofrido diuturnamente.
Os regimes autocráticos conhecidos pela
humanidade culminam em ditaduras, governos opressores, violentos e que reduzem
os direitos civis. Restringem – quando não aniquilam – as liberdades
individuais. Em 1947, na Câmara dos Comuns, Winston Churchill, então
primeiro-ministro do Reino Unido, afirmou, acertadamente, que “a democracia é o
pior dos regimes, à exceção de todos os outros”. Principal, mais confiável e
participativo modelo de governo criado há 2.500 anos pelos gregos, a democracia
mantém íntegra a Nação, mesmo que hoje ainda haja quem conteste sua eficiência.
É no mínimo curioso, portanto, que
políticos eleitos democraticamente pelo voto coloquem em xeque as normas e
procedimentos que os levaram aos respectivos mandatos, sobretudo quando estes
proporcionaram inúmeras e abusivas mudanças de regras do jogo em benefício
próprio.
A história do mundo e do Brasil mostra que caminhos similares já percorridos resultaram em anos de restrição de liberdades individuais e comprometimento dos direitos humanos, ampliaram a pobreza, a ignorância e o atraso. É falacioso vociferar que os métodos e regras democráticas são frágeis ao mesmo tempo que se finge defender a democracia. É contraditório avocar o princípio da liberdade colocando em suspeição as eleições. É perigosa a persistência de falsas premissas para sustentar o livre pensamento.
Quatro décadas após o início da
redemocratização do País, depois de 34 anos de discussão e maturação da
Constituição brasileira, ainda há quem queira retroagir e voltar ao passado com
o qual já deveríamos ter aprendido. Esse conjunto de leis, que vez ou outra
sofre mudanças repentinas, por vezes desnecessárias e eleitoreiras, é o que nos
tem permitido formatar um projeto de país, garantia de direitos e respeito à
pluralidade. Resultado de intensa luta, diálogo e debate, nos dá oportunidades
e voz.
Para quem contribuiu diretamente com essa
construção, é exasperante ouvir e observar os ataques violentos que nossa Carta
Magna tem sofrido diuturnamente. Parte da campanha de desinformação promovida
por alguns tem o evidente intuito de nos deixar vulneráveis e duvidosos para
que, menosprezada, a Carta possa ser alterada em benefício direto de quem quer
tolher sua liberdade. No entanto, é a partir dela que balizamos todas as
decisões para a construção de políticas públicas que resolvem os problemas das
pessoas, sobretudo daquelas mais vulneráveis. Foi pela Constituição federal que
nos consolidamos como democracia, cujas regras claras e universais sustentam
nossa liberdade.
Contrariamente ao que dizem seus
detratores, é pela Constituição federal que os direitos básicos são prometidos
e preservados, possibilitando que o País progrida e se desenvolva com a real,
inconteste e definitiva redução das desigualdades e da pobreza.
Fui exilado por duas vezes, durante 14
anos. Na volta, como deputado constituinte, atuei diretamente na reconstrução
da nossa democracia. Fui ministro, senador, prefeito e governador, atuei e
liderei transições de poder e senti pessoalmente o antagonismo entre regimes.
Portanto, posso garantir que a liberdade não é agenda dos autocratas. A
grandeza e o desenvolvimento de um país estão intimamente ligados às
perspectivas que sua sociedade tem sobre suas instituições, sobre a clara
separação entre os Poderes e seus papéis individuais, e a garantia dos deveres
e dos direitos civis. É isso que nos torna livres.
Em outubro próximo, mais uma vez,
demonstraremos a força da nossa democracia. Um novo Parlamento será eleito e
Assembleias Legislativas e governadores serão escolhidos nas 27 unidades da
Federação. A Presidência da República está em jogo e nós estamos muito mais
atentos do que aqueles que tentam desconstruir o que foi feito nos últimos
anos. Cabe a cada brasileira e brasileiro defender e promover o processo
republicano que orientou nossa Constituição.
Em seu livro Sobre Heróis e Tumbas,
Ernesto Sábato afirma que a ditadura se esconde atrás da demagogia. Por isso, é
momento de exigir de todo e qualquer político posições quanto aos princípios
que garantem a liberdade e os valores democráticos. É tempo de combater a
pobreza sem populismo e com integridade, elegendo quem respeita a diversidade
da sociedade; quem garante o debate, mesmo que divirja; defenda as instituições
e tenha clareza quanto ao papel dos diferentes Poderes, garantida sua
independência; que crie caminhos concretos para a geração de empregos e de
renda; e que promova a liberdade real a partir do fortalecimento da democracia.
Repito: o Brasil se tornará estável e
próspero quando mudar com responsabilidade e conservar suas conquistas com
coragem. É deste verdadeiro embate que devemos obter energia para nos livrarmos
de projetos reacionários ou populistas, duas forças com um longo passado no
País, mas que não oferecem futuro.
Sigamos dispostos e esperançosos, como a
maioria da população brasileira, em busca da construção de um futuro melhor
para o nosso país. Continuarei na luta. Não sei viver de outro jeito.
*Senador (PSDB-SP)
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