O Globo
Não é a primeira vez que Damares é acusada
de fake news
Analisar uma campanha política implica
trabalhar muitas variáveis: pesquisas, ação de candidatos, arco de alianças e
redes sociais, estas não apenas para definir a popularidade, mas para seguir as
grandes lendas que propagam.
O trabalho de análise das redes sociais é
mais difícil, não só pela sua extensão, como também pelos instrumentos que
definem sua eficácia. Às vezes, tento colocar a seguinte pergunta: o que dizem
essas notícias escandalosas sobre o estado mental de um país?
Compreendo que essa expressão é muito vaga,
seria quase como perseguir algo que a antropologia descarta com razão: o
caráter nacional.
Já escrevi um artigo sobre a importância do diabo não só na campanha, como na cultura . Satanás continua sendo um personagem dominante nas lendas que circulam nas redes. Num país muito religioso, é natural que isso aconteça.
Talvez possa lançar mão de algum outro
instrumento, como o inconsciente coletivo. É uma invenção do psicólogo Carl
Jung, que, para mim, tem um valor mais poético. Na visão dele, o inconsciente
coletivo são ideias que atravessam os tempos, ideias que herdamos de nossos
antepassados e nem sempre sabemos que influenciam nossa visão de mundo. Pode
ser que aquele clima da Inquisição, o medo de estarmos ao lado do diabo sem
reconhecê-lo, influencie as pessoas. No passado, isso não era uma questão
apenas de fé, mas uma escolha de vida ou morte.
O canibalismo é um componente singular da
campanha política brasileira neste século XXI. Ele surgiu a partir de uma entrevista
de Bolsonaro ao New York Times, em que deu a entender que comeria um índio.
Nesse caso, também há toda uma história de pavor em nossas mentes. O primeiro
best-seller sobre o Brasil no mundo foi o livro de Hans Staden, que escapou de
ser comido pelos índios. O que restou realmente no fundo de nosso inconsciente:
o medo de ser comido num ritual indígena ou a malícia das índias que examinavam
as carnes brancas do prisioneiro europeu?
O diabo e os canibais ainda sugerem uma
linha de investigação possível, embora tão fantasiosa quanto as lendas que os
colocam no topo da campanha. O que é difícil explicar são as palavras da
senadora eleita Damares Alves sobre
exploração sexual infantil na Ilha de Marajó. Ela comete uma ligeira imprecisão
geográfica ao colocar Marajó na fronteira. Confundiu com o Amapá, que está um
pouco adiante. Ainda assim, descreveu um quadro tétrico de crianças cujos
dentes são arrancados para que não mordam ao dar prazer sexual. Ela não tem
provas disso. Acossada, diz que ouviu na rua. Possivelmente imaginou essa
situação e decidiu usá-la como instrumento de campanha. As crianças exploradas
seriam salvas por ela e por Bolsonaro se não fossem impedidos pela imprensa,
pelo Supremo e pelo Congresso.
Há poucas pistas para estudar a imaginação
que produz esse tipo de história. Damares ficou conhecida porque disse ter
encontrado Jesus numa goiabeira. Na época, achei que não deveria ser criticada.
Faço documentários sobre andarilhos e ouço histórias, visões fantásticas e, ao
mesmo tempo, inofensivas. Reconheço o direito ao delírio. Mas isso de construir
uma inominável tortura e se apresentar como a heroína que tentou combatê-la e
foi impedida pelas instituições parece-me um pouco doentio, mesmo numa
atmosfera de caldeirão do diabo onde ardem alguns adversários que serão comidos
pelos canibais do partido rival.
De um modo geral, o TSE tem determinado a
retirada de postagens fantasiosas e ameaça com multa caso desobedeçam. Mas
Damares foi ministra de Direitos Humanos e tornou-se senadora. Sua história
mentirosa foi contada num templo da Assembleia de Deus, no contexto da campanha
política de Bolsonaro. Não é a primeira vez que é acusada de difundir fake
news. Se considerarmos essa prática natural, o diabo estará subindo em nossas
goiabeiras.
4 comentários:
Não escapa um nesse governo de birutas. Essas fantasias sexuais dessa Sra. sublimam aquilo que ela realmente é, Cruz credo!
Concordo. Sexo é sério problema no desgoverno do genocida. Ela, damares, vê perversão sexual onde NÃO TEM (arrancar dentes de crianças pra sexo oral - essa loucura só existe na mente insana dela). No entanto, ela, damares não vê perversão sexual qd "pinta um clima" entre um "homem" de quase 70 anos e meninas de 13/14.
Ambos doentes. Ela é ele.
"Mas isso de construir uma inominável tortura e se apresentar como a heroína que tentou combatê-la"
Dom Quixote é um herói doidão. Damares é doidona tb. Pra ser heroína, basta q ela nos salve do palerma da República. Entraria pra história, talvez como "damares, a louca", mas heroína.
Sem contar os ''hotéis-fazendas'',que segundo Damares é usado para a prática de zoofilia.
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