domingo, 5 de março de 2023

Elio Gaspari - Os agrotrogloditas do Sul

O Globo

Se não bastassem os agrotrogloditas da Amazônia, com suas queimadas e ocupações, o agronegócio precisa se defender também dos trogloditas do Sul. Há cerca de uma semana, 200 trabalhadores baianos foram resgatados no município gaúcho de Bento Gonçalves. Contratados para a colheita da uva, viviam em condições degradantes. Expostas, as vinícolas Aurora, Salton e Cooperativa Garibaldi lastimaram o ocorrido e atribuíram a malfeitoria a uma prestadora de serviços. Esse é o protocolo seguido por todas as empresas apanhadas em malfeitorias semelhantes.

Como o negócio do vinho é sensível a exposições constrangedoras, a resposta foi rápida, clara e talvez possa se provar sincera. Estava nesse pé a coisa quando o Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves resolveu entrar na discussão e saiu-se com o seguinte disparate:

“Há uma larga parcela da população com plenas condições produtivas e que, mesmo assim, encontra-se inativa, sobrevivendo através de um sistema assistencialista que nada tem de salutar para a sociedade.”

O que os doutores quiseram dizer foi o seguinte: programas assistenciais estão drenando o estoque de mão de obra informal, mal paga e, às vezes, aviltada. No século XXI, eles acham que a assistência aos pobres prejudica a economia.

Em vez de oferecer lições de ciência política, os doutores do Centro deviam prestar alguma atenção para a qualidade das relações de trabalho no negócio da uva.

Na metade do século XIX, fazendeiros do Vale do Paraíba achavam um absurdo dar glebas de terras ou pagar salários a imigrantes italianos e alemães. Era isso que se fazia no Rio Grande do Sul. Passou o tempo e hoje há ali um próspero negócio vinícola.

Associá-lo a formas de trabalho aviltantes ou a empresários que satanizam programas assistenciais é colocar nos rótulos dos vinhos gaúchos a marca da estultice de alguns poucos maganos. Para produtores concorrentes, nada melhor.

Nunca tão poucos fizeram tanto mal à indústria vinícola quanto seus agrotrogloditas.

Palocci ganhou todas

O ministro Fernando Haddad tem motivos para comemorar o fato de ter prevalecido sobre as posições petrolíferas da presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Só não deve acreditar que seu adversário fosse ela.

Durante o Lula 1.0, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, ganhou todas. Perdeu só a última, para Dilma Rousseff, porta-voz de Lula.

Frito

O juiz Marcelo Bretas não sairá incólume da investigação a que está sendo submetido no Conselho Nacional de Justiça.

A parte mais delicada, e tóxica, envolve delações premiadas que parecem agenciadas e direcionadas.

A dúvida está no tamanho do estrago.

Melancolia em Orlando

A melancolia de Jair Bolsonaro surpreendeu amigos que acreditaram na sua resistência a uma eventual derrota.

Desconfiado mesmo nos momentos de glória, o capitão registra como traições gestos de puro distanciamento.

Pelo andar da carruagem, Bolsonaro poderá ser preso pelo que se chama de “juiz da sexta-feira”. É o magistrado que prende uma celebridade na sexta, ganha fama e tem a medida revogada na semana seguinte.

Como Marcelo Bretas fez com Michel Temer.

Moraes e os valentões

Com sua experiência de promotor e secretário de Segurança, o ministro Alexandre de Moraes costuma repetir que muitos valentões desafiam a polícia na hora da prisão e, dias depois, sentam na cama da cela para chorar.

Parece exagero, mas um bolsonarista preso em Brasília no dia 8 de janeiro contou ao repórter Tacio Lorran:

“Eu achava que tinha um preparo psicológico, mas não aguentei. Pedi atendimento psicológico lá. Chorar, meu filho, é fichinha. É desespero mesmo. Não tem quem não chore lá dentro. Não vi um pai de família que não chorou.”

Triunfalismo diplomático

Jair Bolsonaro presenteou Lula com uma agenda diplomática de sonhos. O petista soube arquivar o pária e voltar a falar a língua dos povos.

A passagem de Lula pela Casa Branca e a de John Kerry por Brasília sugerem que, por algum motivo, os americanos estão praticando uma política de muita simpatia e pouco resultado.

Lula quer entrar na mediação da guerra da Ucrânia, defende a criação de um organismo internacional de governança ambiental, quer reformar o Conselho de Segurança das Nações Unidas e, se lhe sobrar tempo, aceita o prêmio Nobel da Paz.

Diplomacia barulhenta produz muitos sorrisos e poucos resultados.

O apetite de Lula por cargos na burocracia internacional provocou até piadas, pois a eleição do argentino Bergoglio para o Papado teria sido uma derrota do presidente.

Efeito oposto

A ofensiva petista atrás da cabeça de Roberto Campos Neto terá o efeito oposto. Como ele só sai antes do fim do mandato se quiser, isso pareceria uma infeliz covardia institucional.

Por uma questão de brio, Campos Neto tem que ficar no cargo, mesmo vestindo a camisa amarela com que foi votar e baixando os juros.

Aposta perigosa

Alguns prefeitos de grandes cidades parecem ter feito uma aposta. Deixam a cidade esburacada por falta de obras desde a pandemia e se preparam para brilhar no que vem, perto da campanha.

Esse é o caso de São Paulo, onde o doutor Ricardo Nunes espera ser reeleito.

Correm o risco de os eleitores perceberem a malandragem.

Etiqueta

De um freguês dos programas de canais de notícias que mostram vários analistas compartilhando a tela.

É comum que, enquanto um deles fala, outros baixem os olhos para conferir alguma mensagem em seus celulares. Se nem os colegas de equipe prestam atenção no que se diz, por que os outros deveriam ficar ligados?

Fogo amigo

A divulgação da fala do general Tomás Paiva na qual chamou de “indesejada” a vitória eleitoral de Lula foi um venenoso episódio de fogo amigo provocado pelo ressentimento.

Em 1977, o general Silvio Frota, demitido do Ministério do Exército, julgava-se traído pelo seu sucessor, o general Fernando Bethlem.

 

3 comentários:

Anônimo disse...

Agrotrogloditas existem de norte a sul, e de leste a oeste por todo o Brasil. Todos, sem exceção, apoiavam o criminoso ambiental Ricardo Salles quando era ministro do Meio Ambiente (MMA) do GENOCIDA e ia passando a boiada da desregulamentação, do enfraquecimento da legislação ambiental e da redução ou imobilização da fiscalização ambiental federal. Também apoiavam seu substituto, levado para o MMA pelo mesmo boiadeiro e que continuou a ação inicial do seu chefe no mesmo ritmo e objetivo.

Anônimo disse...

"Por uma questão de brio, Campos Neto tem que ficar no cargo, mesmo vestindo a camisa amarela com que foi votar e baixando os juros."

Se brios tivesse, Campos Neto cumpriria sua obrigação E OS JUROS BAIXARIAM. Ficar e sair não têm o condão.de lhe devolver a dignidade, o q somente será alcançado se atuar com competência. Juros estratosféricos como os nossos é q lhe tiraram os brios.

ADEMAR AMANCIO disse...

Várias notícias.