quarta-feira, 5 de junho de 2024

Hélio Schwartsman - Tem arenque na praia

Folha de S. Paulo

Esquerda utilizou fake news para se opor a PEC sobre terrenos de marinha

Sou contra a mal chamada PEC das Praias, mas o que me impressiona nesse caso é que a polarização está gerando um nível de ruído que compromete a própria discussão.

Opositores da emenda afirmaram que ela levaria à privatização das praias do país. Seria um ótimo argumento contra a medida, se ele fosse verdadeiro, mas não é. A PEC nem trata de praias, mas dos terrenos de marinha, isto é, áreas que ficam acima da linha da areia —mais especificamente, o que fica na faixa das 15 braças craveiras (33 metros) a contar da preamar média de 1831— e já são hoje concedidas a particulares mediante o pagamento de taxas específicas. Pelo atual regime, quem ocupa legalmente um terreno de marinha já pode fazer uso privativo dele e nele construir. Pode também transmiti-lo a terceiros, inclusive herdeiros. Em algumas situações, já pode até comprá-lo e tornar-se proprietário de fato e de direito.

Daí não se segue que a emenda seja inofensiva. Uma preocupação mais realista é que a mudança de estatuto possa enfraquecer a proteção ambiental nesses terrenos e dificultar o acesso de pessoas a algumas praias. Vale observar, porém, que tais efeitos só ocorreriam se outras legislações fossem descumpridas. O problema aí não é tanto a PEC, mas o fato de nem sempre levarmos as leis a sério.

De toda maneira, a PEC extingue imediatamente uma fonte de receita para a União e cala sobre inúmeras questões relevantes, o que, a meu ver, torna temerário aprová-la.

O interessante aqui é constatar que, embora seja a extrema direita que tenha se especializado em distribuir fake news, neste caso específico foi a esquerda que se valeu do artifício. Combinou a falácia do arenque vermelho (introduzir pistas falsas para desviar a atenção da questão central) com a falácia do espantalho (usar uma versão distorcida do argumento do adversário) para produzir a ideia estapafúrdia de que as praias seriam privatizadas.

 

3 comentários:

Daniel disse...

O problema é que as ideias estapafúrdias de que um presidente é contra vacinas e a favor da tortura, um ministro do meio ambiente é um criminoso ambiental e trabalha contra a legislação ambiental, um ministro da educação ataca universidades e professores, um ministro da saúde não conhece o SUS, entre outras ideias estapafúrdias, foram plenamente confirmadas no último governo federal, comandado pelo pai do senador que propôs esta PEC. Ou seja, ideias estapafúrdias têm boa chance de serem propostas e defendidas pelos bolsonaristas, e quase sempre com vários tipos de mentiras envolvidas como tentativas de justificá-las!

laurindo junqueira disse...

"Terra da Marinha" ou "Terra de marina"? O que diz a lei original do século XIX? A Marinha do Brasil cobra laudêmio até de terras da beira do Rio Tietê, em SP (é o caso de Alfaville). O argumento, neste caso, seria o de que esse curso d'água tem importância estratégica, caso o Paraguai resolva invadir o Brasil ... Tem sentido isso?
Por que razão o laudêmio cabe à Marinha?

ADEMAR AMANCIO disse...

A esquerda errou.