Correio Braziliense
As emendas representam R$ 50 bilhões do
Orçamento, que os parlamentares podem destinar às suas bases eleitorais, sem
compromisso como sucesso das políticas públicas
O Congresso Nacional aprovou a toque de caixa
o Orçamento da União de 2025, que estava engavetado desde o ano passado, por
causa do impasse com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino,
que exigiu dos congressistas mais transparência na execução das emendas
parlamentares.
Três meses após o prazo, o Orçamento aprovado traz um teto de despesas sujeitas ao arcabouço fiscal de R$ 2,2 trilhões e uma folga de recursos (superávit) estimada em R$ 15 bilhões. O projeto havia sido aprovado no início da tarde pela Comissão Mista de Orçamento (CMO), ou seja, foi a voto sem que houvesse tempo para ser analisado pela maioria dos senadores e deputados.
Relator do projeto, o senador Ângelo Coronel
(PSD-BA) calculou um superávit – sobra de valores após gastos do ano – de R$ 15
bilhões para 2025, ou seja, quatro vezes mais do que o previsto no texto
enviado pelo Poder Executivo, que já era considerado otimista pelos analistas.
O valor respeita a meta fiscal de déficit zero, com tolerância de até R$ 31
bilhões, para mais ou para menos.
O texto aprovado aumenta em R$ 11,9 bilhões
as despesas do governo federal, totalizando R$ 5,7 trilhões. Esse valor inclui
despesas que ficam fora do limite de gastos estipulado pelo arcabouço fiscal,
como as do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e
as transferências constitucionais e legais a estados, municípios e Distrito
Federal.
A Saúde teve um aumento de R$ 24,4 bilhões,
consequência da exigência legal de que metade dos recursos das emendas
individuais sejam destinados ao setor. Com isso, seu orçamento total é de R$
246 bilhões. Também receberam grandes dotações a Educação, R$ 197 bilhões; o
Bolsa Família, com R$ 159 bilhões, cerca de R$ 7,7 bilhões a menos do que o
governo queria; e os investimentos, que passaram de R$ 63,5 bilhões para R$ 80
bilhões, a maior parte destinada ao Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC).
O Ministério do Meio Ambiente, no ano da
COP30, que se realizará em Belém (PA), em novembro, teve o orçamento
ligeiramente reforçado para R$ 4,2 bilhões. O programa Pé-de-Meia, que
incentiva a permanência de jovens de baixa renda no ensino médio, porém, não
recebeu a verba necessária no Orçamento: R$ 1 bilhão, muito abaixo dos R$ 13
bilhões estimados para custear o programa ao longo do ano. Entretanto, se
confirmado, o superávit previsto pode ser utilizado para viabilizar esse gasto.
Blindagem eleitoral
O Orçamento estipula um salário mínimo de R$
1.518, reajustado em janeiro. Mais R$ 27,9 bilhões para reajustes salariais de
servidores públicos e recursos para novos concursos públicos, incluindo uma
nova edição do Concurso Nacional Unificado (CPNU). O auxílio-gás recebeu R$ 3,6
bilhões, R$ 200 milhões a menos, e a Farmácia Popular, R$ 4,2 bilhões, menos R$
1,2 bilhão do que o previsto.
R$ 50 bilhões foram destinados às emendas
parlamentares, que pulverizam recursos do Orçamento, a pretexto de que
deputados e senadores conhecem melhor a “vida real” do que o Executivo e, por
isso, devem destinar verbas para suas bases eleitorais em caráter impositivo.
No semipresidencialismo clássico, o parlamento responde pelo sucesso ou não das
políticas públicas. Aqui, não, o modelo é informal, uma espécie de
“semipresidencialismo caboclo”, mais uma jabuticaba política.
Como temos uma Constituição de viés
parlamentarista num regime presidencialista, esses recursos são aplicados sem
que os deputados e senadores tenham compromisso com a qualidade de seus
resultados, sem falar na conformidade com a execução financeira. Há uma invasão
na competência do Executivo, sem que se estabeleça institucionalmente um regime
no qual o Congresso assuma integralmente responsabilidades de governo e preste
contas dos resultados.
Do montante previsto no Orçamento, R$ 24,7
bilhões vão para emendas individuais (cada parlamentar recebe um valor fixo
para destinar como quiser); R$ 14,3 bilhões serão para bancadas estaduais; e R$
11,5 bilhões para emendas de comissão (que não são de execução obrigatória).
Também foi aprovado um dispositivo que impede o governo de cancelar emendas
parlamentares sem autorização do autor da emenda.
As emendas impositivas, criadas para acabar
com o “toma lá dá cá”, têm dois efeitos colaterais: um é o desvio de recursos
públicos para formação de caixa dois eleitoral ou formação de patrimonial
pessoal por alguns parlamentares, que estão sendo investigados em sigilo pelo
Supremo; o outro é a blindagem generalizada dos mandatos, com a vantagem
estratégica de disporem de grande volume de recursos para reproduzi-los
(estruturas de gabinetes, emendas impositivas e mais até R$ 3,5 milhões de
fundo eleitoral). É uma disparidade de armas na disputa eleitoral cujo objetivo
é obstruir a renovação política.
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