terça-feira, 28 de outubro de 2025

O café servido por Lula, por Thiago Bronzatto

O Globo

O presidente deverá apostar em se conectar com a indignação dos eleitores

O cafezinho servido no Palácio do Planalto tem sido usado como metáfora para ilustrar a estratégia do presidente Lula para 2026. Integrantes do governo costumam dizer que não adianta servir um expresso com pouco adoçante a quem gosta da bebida pura e aos que preferem uma dose extra de açúcar. O meio-termo desagradará aos dois extremos. Segundo essa lógica, não dá para atender ao mesmo tempo o público moderado e o radical. Por isso o plano do chefe do Executivo envolverá uma combinação de elevar o tom dos ataques ao statu quo, reforçando o coro do “nós contra eles”, com medidas que toquem no bolso da classe média.

Daqui até 2026, o Lula que deverá se lançar à reeleição se aproximará mais da figura política controversa de 1989, que emergiu atacando as elites, que do político pragmático de 2002, signatário da “Carta ao povo brasileiro” para tranquilizar o país. O discurso conciliatório na posse em 2023 e a promessa de unir a nação numa frente ampla de partidos de centro têm cedido terreno à retórica antissistema, alicerçada na retomada da popularidade e na dispersão de líderes da direita.

Lula deverá apostar cada vez mais em se conectar com a indignação dos eleitores, criticando a Faria Lima e antagonizando o Congresso. A ideia é hastear as bandeiras da redução da jornada de trabalho, da taxação das grandes fortunas e da tributação das bets. Se não conseguir emplacar essas pautas, a culpa será dos “outros que não deixaram”.

A lógica maniqueísta, que joga contra o futuro do país, será impulsionada tanto pelo bunker eleitoral montado no entorno do presidente quanto pela investida do PT na guerra digital contra a oposição. Além de contar com os conselhos do marqueteiro Sidônio Palmeira, mandachuva da comunicação do governo, Lula terá a seu lado o deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP), novo ministro da Secretaria-Geral, que recebeu a missão de mobilizar os movimentos sociais a favor das pautas do Planalto. O parlamentar fará dobradinha palaciana com a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, ex-presidente do PT, que tem se tornado mais porta-voz da polarização do mandatário que articuladora política.

Alinhado com essa estratégia, o PT reestruturou seu braço de comunicação para aumentar o engajamento das brigas compradas pelo presidente. O partido montou uma equipe própria que atua em sintonia com um grupo de influenciadores digitais arregimentados para espalhar conteúdos de interesse de Lula, nutrindo o algoritmo da polarização política. Entre os assuntos designados pela legenda para propagar nas redes, está um organograma que, sem provas, associa o ex-mandatário Jair Bolsonaro ao empresário Antônio Carlos Camilo Antunes, o “careca do INSS”, no escândalo de desvio de aposentadorias que ameaça o atual governo.

Além da retórica, o presidente aposta num combo de medidas eleitorais para reconquistar parte da classe média, segmento em que a gestão petista derrapa desde a recessão e o escândalo do petrolão que minaram o governo Dilma. A ideia é ampliar o alcance da imagem de Lula para além do “pai dos pobres”. Nesse terreno, são adubados a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil e um novo modelo de crédito imobiliário para comprar a casa própria. Nas palavras de um auxiliar palaciano, as eleições de 2026 deverão ser vencidas ainda em 2025, fazendo a máquina pública girar a favor da reeleição do líder petista.

A cartilha seguida por Lula contraria a do Lula candidato em 2022, quando criticou o então presidente Jair Bolsonaro por ser radical e usar o Planalto a seu favor nas urnas:

— Temos um cidadão que está na Presidência e que está usando a máquina do governo para fazer campanha (…). Quando eu era presidente, a gente só saía para fazer campanha às seis da tarde — disse à época o líder petista , que agora ativa o modo eleitoral antes do fim do expediente.

 

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