Dois dias depois de revelar, em entrevista coletiva, que teve um câncer no sistema linfático, a ministra Dilma Rousseff acompanhou o presidente Lula a Manaus, para cumprir extensa programação político-eleitoral.
E, lamentavelmente, a ministra não passou no primeiro teste de palanque. Não por sua culpa, mas em razão da já tradicional incontinência verbal do presidente da República.
Lula é conhecido por se deixar embriagar pela vertigem do palanque. As impropriedades que tem falado ao longo dos anos já pertencem ao folclore político brasileiro.
Embalado pela adrenalina de palanque, Lula já declarou que sua mãe nasceu analfabeta, já afirmou que não pode ser um médico que diz ao doente que ele "sifu", já beijou a mão de Jader Barbalho (?!), já abençoou Severino Cavalcanti.
O presidente chegou mesmo a revelar aspectos de sua vida íntima, ao declarar em palanque que "nordestino não nega fogo" e que tinha engravidado dona Marisa já na noite de núpcias.
Isto faz parte da personalidade do presidente.
Mas ontem (anteontem) ele errou feio, ao levar o câncer da ministra Dilma para o palanque. Ao pedir à população que ore pela ministra.
Lula é um intuitivo, não é um maquiavélico. Em outras palavras: diz impropriedades mais por incontinência do que por maquinação. Não faz de caso pensado, em geral.
Seus assessores mais próximos, ao contrário, já articulam as formas de explorar a doença da ministra para aumentar sua popularidade.
O ministro alternativo das Relações Exteriores, Marco Aurélio Garcia, declarou mesmo que a doença de Dilma vai reforçar sua candidatura.
Confesso que não sei se isso é bom para a candidatura da ministra. A situação por que ela está passando é séria, e sua postura positiva pode atrair muita solidariedade e simpatia.
Mas explorar a luta contra a doença para aumentar seu cacife eleitoral me parece uma crueldade desnecessária.
Lucia Hippolito é cientista política, historiadora e jornalista. É comentarista política do site do GLOBO, da Rádio CBN, do Uolnews e da Globonews.
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