quarta-feira, 27 de junho de 2012

Calote aumenta no país; juros caem

A inadimplência atingiu 8% em maio, mesmo nível de novembro de 2009, no auge da crise. No cartão de crédito, o atraso bateu 30% da dívidas. Já os juros nos empréstimos a pessoas físicas caíram de 41,8% para 38,8%, o menor em 18 anos. O governo lança hoje plano para injetar na economia até R$ 6 bilhões

Calote no caminho do crédito

Inadimplência atinge 8%, o maior nível desde 2009. No cartão, atraso é de 30%

Gabriela Valente

BRASÍLIA - A inadimplência das famílias voltou a subir em maio, chegando a 8%, mesmo taxa de novembro de 2009, no auge da crise global. O atraso na quitação do cartão de crédito bateu recorde histórico. Quase 30% das dívidas contraídas no cartão estão sem pagamento há mais de 90 dias. Em maio, o percentual médio de calote subiu de 28,7% para 29,5%. É o maior em 12 anos.

Nem mesmo a cruzada da presidente Dilma Rousseff para diminuir os juros ao consumidor foi capaz de frear o aumento dos atrasos acima de 90 dias. Mas, de acordo com dados do Banco Central (BC) divulgados ontem, a pressão do governo surtiu efeito: a taxa nos empréstimos às pessoas físicas caiu de 41,8% ao ano para 38,8% ao ano em maio. É o menor nível em 18 anos.

O BC insiste que a tendência é de queda da inadimplência até o fim do ano e argumenta que as pessoas estão aproveitando os juros mais baixos para reorganizar as finanças. De fato, a concessão dos créditos mais onerosos despencaram no mês passado. O valor das novas operações de rotativo no cartão de crédito diminuiu 13%, e o daquelas do cheque especial, 6,7%.

O economista Marcelo Arnosti, da BB Gestão de Recursos, acredita que a inadimplência superior a 90 dias vai cair a partir do segundo semestre:

- A inadimplência de 15 a 90 dias está caindo, passou de 6,97% em abril para 6,7%, o que é bom antecedente.

Crédito já chega a 50% do PIB

Já o crédito consignado explodiu. Só no mês passado, as instituições financeiras emprestaram R$ 9,5 bilhões com desconto na folha de pagamento. As novas concessões cresceram quase 31%. Nos últimos 12 meses, o crescimento desse tipo de crédito está em 44%. Mas analistas alertam para o risco dessa escalada.

- Não há nada de errado em o governo querer estimular o crescimento, mas tudo tem seu preço. Eu não gosto da história de incentivar o crédito com a inadimplência alta - disse a economista-chefe do RBS, Zeina Latif.

Ela lembra que uma nova camada da população que não tinha acesso ao crédito e não sabe lidar com ele passou a contratar empréstimos:

- É preciso dar tempo para a inadimplência reagir. Pelo menos três trimestres de corte de juros e de postura mais conservadora do consumidor.

O administrador Nilson Sansão parcelou sua viagem para Belém e a organização do orçamento ficou mais complicada, a ponto de voltar de viagem com o nome incluído na lista de inadimplentes sem acesso a crédito. A saída foi cortar gastos. De um mês para o outro, já reduziu em cerca de mil reais as despesas. Um ajuste que recai sobre saídas, restaurantes e presentes.

- Houve um descontrole. Mas vou resolver isso.

Assim como Sansão espera normalizar sua situação financeira, o economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito, acredita que o quadro geral de inadimplência deve se normalizar nos próximos meses, porque os bancos estão mais cautelosos.

Para o Banco Central, o foco do problema continua sendo a inadimplência nos financiamentos de veículos, que bateu novo recorde: chegou a 6,1% em maio. A explicação é que o dado ainda reflete os empréstimos feitos em 2010, antes de o BC adotar medidas para frear operações de prazos muito longos e sem entrada. Para o chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel, as medidas adotadas pelo governo para estimular o consumo - como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) - não devem aumentar a inadimplência.

- Os bancos aprenderam a lição e estão mais cautelosos na hora de emprestar - afirmou Maciel.

Em maio, o volume de crédito no Brasil chegou a 50% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país), alcançando R$ 2,1 trilhões. A estimativa do BC para o crescimento dos empréstimos neste ano foi mantida em 15%, mas em relação à proporção do PIB a previsão subiu de 51% para 52%, o que confirma que o BC espera alta menor da economia este ano.

- Não há risco. O crédito cresceu junto com a renda da população e tem sido um elemento importante no crescimento do Brasil - afirmou Maciel, justificando que parte dessa expansão vem do crédito habitacional, ainda baixo comparado a outros países.

Não é essa a percepção do Banco de Compensações Internacionais (BIS), espécie de banco central dos bancos centrais. No último fim de semana, ao divulgar seu relatório anual, alertou que o endividamento das famílias e empresas está crescendo a níveis demasiadamente altos. O banco alerta também que um boom imobiliário pode estar se formando no país, sobretudo no Rio de Janeiro e São Paulo, onde o preço dos imóveis disparou.

Colaboraram Fabiana Ribeiro e Daniel Haidar

FONTE: O GLOBO

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