Qualquer cidadão tem o direito de fazer o que bem entender da vida. Com ex-presidentes da República não é diferente. Mas Luiz Inácio Lula da Silva consegue exercitar o sagrado direito ao livre arbítrio afrontando todo tipo de boa norma que se possa imaginar. Para quem se anunciava como um pregador mundial pela justiça social, ele está se saindo um excelente caixeiro-viajante, com uma portentosa carteira de negócios a propagandear.
Quando deixou a presidência, há pouco mais de dois anos, Lula disse que gastaria seu tempo livre assando coelhos em beira de represa em São Bernardo do Campo. E que se dedicaria a projetos de combate à fome, principalmente na África. Que nada. Sabe-se agora que o ex-presidente devota-se mesmo é a encher os bolsos de dinheiro e a defender projetos de grandes empreiteiras mundo afora.
Não há nada de errado em Lula ganhar dinheiro fazendo palestra para matraquear os feitos de sua experiência de oito anos como presidente do Brasil. Há gosto para tudo e, infelizmente, muita audiência incauta capaz de comprar o que ele fala pelo valor de face.
Entretanto, o que a reportagem que a Folha de S.Paulo publica hoje tem de mais valioso é justamente desmascarar os propósitos que movem o "líder do povo" em suas andanças pelo mundo. Esqueça aquela história de combate à fome e à pobreza; as palestras de Lula são eventos de negócios, gordos negócios.
Com base em telegramas oficiais emitidos pelas embaixadas brasileiras (alguns originais merecem ser lidos), o jornal mostra que quase metade das viagens de Lula à África e à América Latina é patrocinada por empresas com negócios e interesses tanto junto ao governo brasileiro, quanto em países visitados pelo ex-presidente.
Lula é um mestre da lábia e, em meio a suas falas em defesa da inclusão e da justiça social, sempre dá um jeito de enfiar recados à audiência em favor de seus financiadores. Ou seja, um garoto-propaganda dos sonhos de qualquer conglomerado econômico: aparentemente isento, embora regiamente remunerado.
Em Maputo, em novembro de 2012, por exemplo, depois de falar de inclusão, "foi insistente sobre as possibilidades que se abrem para Moçambique com a presença de empresas brasileiras de reconhecida competência", segundo minucioso relato da embaixadora Lígia Maria Scherer. (Vale ter presente que os moçambicanos nutrem especial hostilidade pelas empresas brasileiras, que desenvolvem os maiores negócios hoje lá existentes.)
No giro que fez nesta semana por Gana, Benin, Guiné Equatorial e Nigéria, Lula também viajou sob patrocínio de conglomerados como Odebrecht, Queiroz Galvão e Andrade Gutierrez. Segundo a Folha, uma palestra no exterior pode render ao ex-presidente R$ 300 mil, sem contar gastos com hospedagem, alimentação e transporte. Para o Instituto Lula, é tudo em prol dos "interesses da nação brasileira"... Claro.
Enquanto as palestras de Lula se restringem a interesses privados, o problema é apenas de quem paga para ouvi-lo sem saber exatamente que está sendo enganado. Mas a coisa torna-se mais grave quando envolve o uso do prestígio do ex-presidente para manipular decisões do governo brasileiro.
Foi o que aconteceu em maio de 2011. Em visita ao Panamá, Lula pediu "muito empenho" ao embaixador naquele país para que informasse ao Itamaraty que, na volta ao Brasil, trataria de três pontos com a presidente Dilma Rousseff: estimular a Petrobras a entrar em negócios de etanol no Panamá, convencer a Embraer a instalar lá um centro regional e ajeitar uma audiência do ministro de Economia panamenho com seu colega Guido Mantega.
Não se sabe se algum dos pleitos prosperou. Mas neles repete-se o modus operandi lulista: tentar dobrar decisões que deveriam ser eminentemente empresariais sob o peso da influência política. A Petrobras está aí como prova viva do mal que a prática fez à outrora maior companhia brasileira e à economia do país.
As práticas de Lula como ex-presidente guardam semelhança com o papel que ele escolheu desempenhar enquanto foi chefe da nação. O líder petista notabilizou-se como o mais eficaz mercador que se tem notícia à frente do país, transformando sua gestão num vastíssimo balcão de negócios. Seria muito contraditório, uma vez fora do Planalto, ele passar a se dedicar apenas a assar coelhinhos.
Fonte: Instituto Teotônio Vilela
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