Lula não quer, mas sua candidatura a presidente vive
- Valor Econômico
Duas interpretações dominaram a exegese eleitoral da entrevista que o ex-presidente Lula deu a blogueiros aliados do PT e ao que se seguiu a ela até ontem, nos escalões do partido. A primeira, dos arautos do apelo "Volta, Lula", que viram no discurso do ex-presidente praticamente um lançamento oficial de sua candidatura, com direito a ataques aos culpados de sempre - a oposição, a imprensa e, desta vez, a própria presidente, que precisa atuar mais, ser mais agressiva, partir para cima, acabar com a CPI da Petrobras e dizer ao país o que pretende fazer da economia no segundo mandato, quiçá neste ano, quiçá já...
A segunda, dos que defendem o direito de Dilma se candidatar ao segundo mandato e creem estar a presidente neste caminho, não havendo hipótese de substituição da chapa. A entrevista teria sido, portanto, para Lula dizer que ainda tem a força e reelegerá Dilma. Os que advogam essa tese acham, inclusive, que Lula deixou passar demais o tempo e terá dificuldades de lançar-se pois o mau governo que vem fazendo Dilma Rousseff vai não só derrubá-la, como também a ele. Nesse particular, há especialistas que contrariam a tese, concordam com o acerto do atraso, pois quanto mais demorar mais livre ficará o ex-presidente de ser o alvo dos concorrentes. Tem avaliação para todo gosto.
A virtude, por acaso e só por acaso, está no meio. Lula recusou a candidatura até dezembro do ano passado, de lá para cá ficou suscetível a esse destino, mas oficialmente sua decisão oficial ainda é dizer que não é candidato e não gostaria de ser. Porém, há uma situação em que admite ser candidato.
Informam seus amigos e interlocutores frequentes que não será se Dilma cair mais três pontos nas pesquisas de intenção de voto, ou se o governo ficar pior do que já está na avaliação do próprio ex-presidente e do eleitorado. Lula será candidato no caso de impedimento de Dilma, por uma razão de saúde, por exemplo, a partir da desistência dela, e nunca antes disso. Se ela desistir, não há um terceiro nome, é Lula.
O tom da entrevista, em que a novidade foi ter associado pela primeira vez o projeto antes eufemisticamente chamado de "regulação da mídia" a medidas de controle de conteúdo, ou seja, censura, teria tido o objetivo de dizer-se vivo, atuante, no comando da campanha e em posição de influir em mudanças no governo, para provar que ainda decide.
Mas, para isso, ela precisa ajudar, e não o fez. Dilma não respondeu efetivamente a nenhuma das propostas ou conselhos de Lula.
O seu principal conselho chegou acompanhado de grave constatação pelo peso do analista: a economia não está dando certo e ela precisa dizer ao país o que vai fazer para dar respostas aos problemas como o da inflação. A equipe, também, deveria ser trocada para o governo ganhar credibilidade.
Dilma não só não fez nada disso como emitiu sinais, captados por circunstantes de sua campanha, de que fará exatamente o contrário. O que significa fazer o contrário? Prestigiar o secretário Arno Augustin, alçá-lo a um primeiro posto e realizar um segundo governo, sem preocupações reeleitorais, livre de amarras políticas ou ideológicas.
Ao anunciar ontem a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2015, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o governo decidiu reduzir o superávit primário do setor público de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2,5% do PIB no próximo ano, um sinal ao mercado sobre o que Dilma pretende na área fiscal.
É alguma notícia, mas não era exatamente isso o que pedia o ex-presidente quando apelou a Dilma para anunciar seus planos destinados a evitar que a inflação dissolva o poder de compra dos salários, fator corrosivo para intenções de voto em candidatos à reeleição.
Além de não ter apresentado nada para o futuro da economia, ao contrário, Dilma está fazendo um governo considerado globalmente ruim: Ricardo Berzoini, na avaliação dos petistas, entrou tarde, e já não há mais tempo para coordenar os partidos aliados, que desconhecem Dilma e suas dificuldades do momento.
Devem estar esperando, como de praxe, a hora de saltar fora; a Polícia Federal está sem comando, fazendo o que quer, mas Dilma não trocará o ministro José Eduardo Cardozo, de quem gosta e admira a fleuma; os ministérios da área social seguem sua rotina; o setor elétrico vive uma crise sem precedentes e não se ouve a voz do ministro das Minas e Energia no momento em que o racionamento de energia ronda a urna; os escândalos de corrupção se multiplicam, atingindo petistas e seus aliados; a presidente não se mostra sensibilizada nem com a CPI da Petrobras lhe batendo à porta.
Dilma não segurou a CPI, como aconselhou Lula, ao contrário, ampliou-a, prejudicando a ambos. A Copa do Mundo, com seu potencial de estrago na candidatura, espera por uma campanha de convencimento do eleitorado, ainda engavetada a um mês e meio do chute inicial. Como criar a agenda positiva? Ninguém sabe. Lula mandou os ministros falarem, Dilma mandou-os se calarem.
Na falta de clareza do cenário, reproduzem-se no PT algumas assertivas que ilustram o estado da arte da disputa entre Lula e Dilma no contexto do quadro eleitoral: "Eduardo Campos e Aécio Neves não têm capacidade de ganhar a eleição, mas Dilma tem capacidade de perder", é um dos teoremas do momento. O outro é "Lula não quer ser candidato, mas não pode assegurar que não será".
Longe de se enfraquecerem, necessidade sinalizada pelo ex-presidente Lula nos conselhos a Dilma, o ministro Guido Mantega e o secretário Arno Augustin se fortaleceram sobremaneira nos últimos dias. Conseguiram levar à demissão Leonardo Rolim, o Secretário de Políticas de Previdência Social do Ministério da Previdência, por ter feito e passado ao ministro Garibaldi Alves, que os passou ao Valor, cálculos que repõem a realidade dos dados do deficit previdenciário. Toda a discussão se deve ao fato de o Ministério da Fazenda projetar um déficit da previdência de R$ 40 bilhões para este ano. Já a estimativa do ministério da Previdência é de um rombo de R$ 49,9 bilhões, o mesmo valor registrado em 2013.
Garibaldi confirmou que o Ministério da Fazenda estava subestimando as despesas e o Ministério da Fazenda mandou degolar o homem que calculava.
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