- O Globo
O Governo Federal reconhece que há uma crise de água, mas não admite a de energia. Faz reunião sobre o tema e aparece magnânimo ajudando governos estaduais. Se o sistema elétrico depende de água, e há escassez hídrica, é claro que há risco de desabastecimento de energia também. Em Brasília e em São Paulo os governos falharam em evitar os riscos.
Tudo o que dependeu dos governantes não foi feito. Por razões eleitoreiras, o Brasil foi levado para perto de um colapso de abastecimento de energia e água. Brasília diminuiu o preço da energia, São Paulo reduziu a tarifa de água para quem consumiu menos, mas não subiu para quem consumiu mais.
A semana, que começou com um apagão por falta de energia para atender à demanda, termina com a incompreensível reunião que trata “apenas” de água, como se fosse possível separar. A ministra do Meio Ambiente é que falou — pouco e mal — como se só houvesse problemas nos estados e fosse restrito à água. Anunciou-se mais uma obra do PAC como se fosse resolver o problema emergencial.
A presidente Dilma reduziu o preço da energia de olho na eleição de 2014. O governador Geraldo Alckmin diminuiu o preço da água em ano de grande escassez. O PMDB no Rio ficou em silêncio sobre o nível do Rio Paraibuna.
O ministro das Minas e Energia, Eduardo Braga, avisou que se os reservatórios chegarem a 10% não há como gerar energia. “Nenhum reservatório de hidrelétrica pode funcionar com menos de 10% de água. Há problemas técnicos que impedem as turbinas de funcionar”, disse. O nível vem caindo diariamente. No dia 11 de janeiro, os reservatórios do Sudeste estavam em 19,5%. No dia 22, em 17,28%, com 11 dias seguidos de queda. Estamos nos aproximando perigosamente do limite.
Entrevistei o novo secretário de Recursos Hídricos de São Paulo, Benedito Braga, e perguntei se ele podia garantir que não haveria colapso de água em São Paulo. Ele disse: “não posso prometer isso porque existe uma condição meteorológica. Oferta de água não depende só do governo, depende do clima. O que estamos fazendo é todo o empenho para trazer mais água e fazer reuso para não chegar na situação de colapso”.
O que há de comum entre o secretário de Recursos Hídricos de São Paulo e o ministro das Minas e Energia vai além do sobrenome. A barra dos “Bragas” é que eles entraram agora em governos que erraram, estão tentando justificar o injustificável e dão notícias alarmantes a conta-gotas. Benedito Braga negou que tivesse havido falta de planejamento nos 20 anos de governo tucano em São Paulo. Disse que, “como hidrólogo”, não poderia prever o que está acontecendo:
— Nós estamos vivendo uma era de incerteza climática muito grande. Se olharmos os últimos 125 anos de dados do Instituto Agronômico de Campinas, já tivemos períodos de chuvas muito baixas, mas algo parecido com 2014 e 2015 nunca foi observado.
Isso também se diz em Brasília. “Nunca foi assim”. Pois é, esse é o tempo em que o clima fará surpresas, e o bom governante é aquele que se prepara para o improvável.
Eduardo Braga falou em racionamento se o país passar o nível “prudencial” de 10%. Ora, se abaixo de 10% as turbinas não funcionam, não é prudente esperar chegar a 10%.
A falta de noção de urgência das autoridades de Brasília e São Paulo se junta à do governador do Rio, Luiz Fernando Pezão. O estado entrou no volume morto do Paraibuna do Sul sem um sinal de alerta à população. A água pode acabar no Rio, mas Pezão descarta racionamento. As autoridades decidiram pular no precipício com a esperança de que nada aconteça. E o risco é nosso.
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