segunda-feira, 3 de abril de 2017

Quem pode salvar o Rio | Ricardo Noblat

- O Globo

É impossível não sentir vergonha pelo que está acontecendo no Brasil Luis Roberto Barroso, ministro do STF

Futuro do Rio depende dos que vivem aqui. “É impossível não sentir vergonha pelo que está acontecendo no Brasil" Luís Roberto Barroso, ministro do STF Como você reagiria à acusação pública de que acertou em sua própria casa o pagamento regular de propina a membros de um tribunal? E que nomeou dois representantes para que no futuro cuidassem diretamente do assunto em seu nome? Por inocente, eu ficaria indignado. Desmentiria meu acusador, exigiria ser acareado com ele e o processaria depois. Não se brinca com a honra alheia. É o bem mais caro.

LUIZ FERNANDO PEZÃO NÃO deve pensar assim. À Lava-Jato, Jonas Lopes de Carvalho Júnior, ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE), contou que Pezão, quando vice-governador de Sérgio Cabral, foi responsável pela montagem do esquema que garantiu o pagamento a conselheiros do tribunal de 1% do valor de cada contrato assinado pelo governo acima de R$ 5 milhões.

OS CONSELHEIROS PASSARAM a receber também 15% sobre a verba destinada à compra de comida para presos. Além de R$ 300 mil de mesada fixa. Cada um, mais tarde, ainda embolsou R$ 75 mil mensais para defender os interesses de empresários de transporte público. Obra de Jorge Picciani, cacique do PMDB e todo-poderoso presidente pela sexta vez da Assembleia Legislativa.

NATURALMENTE, PICCIANI SOLTOU uma nota negando tudo. Pezão limitou-se a afirmar que desconhece o conteúdo integral da delação de Jonas Lopes, e que por isso nada comentaria. Seria preciso conhecer a delação em todos os seus detalhes para só então repelir com veemência o ataque à sua honra? Ou não faz diferença para Pezão ser citado pela imprensa como peça importante da sofisticada organização criminosa que assaltou o Rio?

JONAS LOPES REVELOU A identidade dos dois representantes de Pezão que passaram a falar por ele junto à presidência do TCE: Afonso Henrique Monnerat, atual secretário de Governo, e Marcelo Amorim, subsecretário de Comunicação, casado com uma sobrinha de Pezão. A Marcelo Amorim, segundo Jonas Lopes, coube 1% do volume de dinheiro destinado aos conselheiros do tribunal.

SEMPRE SE DIRÁ QUE O DELATOR está obrigado a provar o que disse sob pena de perder o prêmio negociado, quase sempre menos anos de cadeia. Mas é justamente por isso que o delator evita mentir. No máximo, não diz toda a verdade. O que revelou Jonas Lopes foi corroborado pelo filho dele, encarregado de receber o dinheiro em espécie. E também por fartas provas e indícios colhidos pela Polícia Federal.

VEM AÍ A DELAÇÃO DE CABRAL que promete entregar deputados estaduais corruptos – e eles existem aos montes na apodrecida assembleia comandada por Picciani – e juízes e desembargadores igualmente corruptos. É provável que sobre para autoridades e ex-autoridades federais. Se, com justa razão, deu-se o nome de “delação do fim do mundo” à da Odebrecht, a de Cabral poderá ser a versão carioca dela.

NA SEMANA PASSADA, em meu blog, perguntei: “Quem salvará o Rio dos seus políticos?” Um leitor respondeu: “A pergunta deveria ser: quem salvará o Rio de sua população? Foi ela que colocou os políticos no poder”. Outro observou: “O que identifica o eleitor é seu desleixo moral com direitos que são gostosamente barganhados pelo Carioca Way of Life". E mais um: “Não existe sociedade mais permissiva do que a nossa”.

O FUTURO DO RIO DEPENDE dos que aqui vivem. Ou aproveitamos as eleições de 2018 para promover um gigantesco expurgo político capaz de entrar para a História do Estado e, por tabela, do país, ou não haverá salvação à vista.

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