quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Refúgio de furacões | Míriam Leitão

- O Globo

Foi mais um dia de alguma notícia boa na economia e muita turbulência na política. O presidente Temer será novamente investigado, desta vez com autorização do ministro Luís Roberto Barroso. Na economia, o Banco Central avisou que os juros vão cair mais devagar, mas permanecerá sendo usado o estímulo monetário. Isso pode levar os juros ao menor nível da era do real já em dezembro deste ano.

Também aumentaram as chances de a Selic chegar a 6,75% em janeiro. Como a projeção de inflação para 2018 está em 4,15%, o país pode iniciar o ano com juros reais de 2,6%, uma taxa baixa para os nossos padrões. O comércio em julho ficou parado, mas no acumulado do ano teve a primeira alta desde 2014.

Pelo que disse na Ata do Copom, divulgada ontem, o Banco Central vê a economia em recuperação gradual, mas com alta capacidade ociosa, seja na indústria, seja no mercado de trabalho. Isso favorece a retomada do crescimento do PIB sem pressionar a inflação. O mercado prevê o IPCA em torno de 4% para o ano que vem, o próximo, e o seguinte. Ou seja, acha que a inflação caiu e lá permanecerá. Ao mesmo tempo, o BC diz que o cenário externo é favorável, com baixas taxas de juros no mundo, muita liquidez e apetite por risco, o que ajuda na vinda de dólares para o Brasil. Tudo somado, a Selic poderá ter mais três cortes de juros antes que se encerre o ciclo atual.

Para os membros do Copom, grande parte da queda da inflação é explicada pela forte redução dos alimentos, que ficaram 5,2% mais baratos nos 12 meses até julho. Um recuo nesses preços já era esperado, mas não nessa intensidade. Com os alimentos mais baratos, o orçamento das famílias fica menos pressionado, e isso ajuda na recuperação do comércio.

O IBGE divulgou ontem que houve estagnação nas vendas em julho, mas isso depois de três altas consecutivas, quando acumulou 2,2%. No ano, de janeiro a julho, o volume de vendas teve crescimento de 0,3%, a primeira alta desde 2014. Quando a comparação é feita sobre os mesmos meses de 2016, são quatro altas seguidas, com crescimento de 3,1% em julho, o melhor resultado desde maio de 2014.

Alguns setores estão ainda em queda e outros em alta. Nos números do varejo há o forte crescimento do setor de eletrodomésticos. No acumulado do ano, o crescimento chega a 7,2%, a maior taxa entre todos os grupos que compõem o índice do IBGE. O setor de vestuário, calçados e tecidos também cresceu forte nos sete primeiros meses de 2017: 7,1%. O segmento de supermercados teve leve recuo, de 0,3%, com quatro altas e três quedas no ano. Como a recuperação ainda está longe de apresentar vigor, há setores caindo bastante, como o de móveis, que recuou 10%, o de livros, jornais, revistas e papelaria, que caiu 3,3%, e o de combustíveis e lubrificantes, com -3,1%.

A temperatura da economia está apenas morna, não se pode falar nem de reaquecimento porque os números bons são tímidos. Mas perto da série de furacões que se abate sobre a política, parece até um refúgio seguro. Por isso, o presidente Temer tenta fugir para a economia, atribuindo a si mesmo todos os sucessos. Ele teve algum mérito ao escolher uma boa equipe econômica e tomar decisões certas antes da crise que engoliu o rumo do seu governo.

Depois de 17 de maio, quando foi divulgada a delação de Joesley Batista, a principal meta de seu governo passou a ser manter-se no poder. Só isso explica por exemplo concessões políticas que vão representar perda de arrecadação em momento em que o país está com uma meta de déficit fiscal de R$ 159 bilhões e ainda correndo risco de não cumpri-la.

O Copom avisou que na inflação há riscos “em ambas as direções”. O que é curioso, porque normalmente o risco inflacionário era sempre de alta. Desta vez, pode cair mais se continuar a deflação de alimentos. Mas, segundo avisou, há risco de novas altas se houver “frustração das expectativas sobre a continuidade das reformas e as medidas de ajuste”. Neste momento em que a crise política volta a se intensificar, o governo diz que aprovará as reformas e as medidas de ajuste, mas sabe bem que não teria 308 votos agora.

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