quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Utopia e renovação | Murillo de Aragão

- Blog do Noblat

Chegamos aonde chegamos por conta de nossas elites. Uma parte “privatizou” o Estado de acordo com seus propósitos, tanto ideológicos quanto financeiros. Em alguns casos, inclusive, corrupção e corporativismo andaram juntos no assalto aos cofres públicos. Outra parte das elites, por desprezo à política, preferiu se omitir e, de longe, criticou a tudo e a todos. Em especial, o governo, por não atender às suas expectativas, mas poucos quiseram ir lá, a Brasília, defender de peito aberto suas convicções.

Nossas elites intelectuais se dividiram entre uma utopia socialista e um nacionalismo tacanho que tem o Estado como centro de tudo. Nossas elites sindicais estão acomodadas em uma espécie de “neopeleguismo”, parcialmente rompido com o fim do imposto sindical. Na base de tudo existe um brutal desprezo aos princípios e às instituições, fruto da precariedade de nossa Sociedade frente ao avassalador predomínio do Estado, que, acredita-se, tudo pode e tudo deve nos dar.

Além de nossa pouca educação como cidadãos, gravitamos em torno de um quadro patológico que é o do “Estadodependência”, quando, na verdade, o que devemos almejar é um Estado que seja verdadeiramente subserviente à Sociedade. Sem, finalmente, entendermos que a raiz de tudo está na abissal diferença entre os poderes do Estado e a Sociedade, a expectativa de uma genuína renovação política continuará utópica.

Um exemplo da nossa vocação para o “Estadodependência” está nos obstáculos criados para reformar a Previdência. Uma decisão que deveria ter sido tomada há 20 anos, cujos fundamentos financeiros são inquestionáveis e razoabilidade política cristalina está encalhada no Congresso.

A proposta corre o risco de chegar ao final do ano sem ser votada, comprometendo o futuro do Estado que se supõe defender e empobrecendo a Sociedade que assiste o erro sem se envolver.

O que fazer? Participar racionalmente do processo eleitoral. Votar com cuidado, observando quem defende os interesses da Sociedade e quem defende os interesses de corporações e subsegmentos econômicos e/ou laborais. Procurar questionar o fluxo da informações disponíveis para não ser tragado pela deliberada inundação de desinformação – aquilo que Robert Proctor, da Universidade de Stanford, chama de “agogynotol”.

Nos tempos de “fake news” e de ativismo periodista, estar superinformado não quer dizer, necessariamente, estar bem informado. O caminho da renovação reside, acima de tudo, dentro de nós.
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Murillo de Aragão é cientista político

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