Às vésperas de o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes completar um ano, a Polícia Civil e o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro prenderam e formalizaram a acusação por duplo homicídio contra um policial militar reformado e um ex-policial militar. A longa demora na apresentação de resposta ao crime gerou reiteradas — e justificadas — manifestações de preocupação por parte de entidades ligadas à defesa dos direitos humanos. Afinal, aprofundados estudos de investigação criminal demonstram que as primeiras 48 horas após o homicídio são decisivas para a efetiva elucidação do assassinato. Quanto mais os investigadores se afastam desse prazo sem a prisão de um suspeito, menor chance têm de obter sucesso em apontar o criminoso responsável.
Nas primeiras horas seguintes ao assassinato de Marielle e Anderson, a Polícia Civil parecia tão desorientada que não foram poucos aqueles que apostaram que o crime aumentaria o absurdamente alto índice de homicídios não solucionados no estado do Rio. Para ter ideia precisa, dos 6.695 homicídios ocorridos no estado no ano passado, pouco mais de 800 foram esclarecidos — apenas 12%. Parte desse fracasso pode ser atribuída a uma política de segurança pública equivocada, em que ações de confronto despendem mais recursos humanos e financeiros do que ações de inteligência e investigação.
Não se pode deixar de registrar como auspiciosa surpresa o trabalho técnico, minucioso e recheado de indícios relevantes apresentado na terça-feira 12 pela Polícia Civil e pelo Ministério Público na operação que resultou na prisão de Ronnie Lessa e Élcio Vieira de Queiroz, denunciados pelos homicídios qualificados de Marielle e Anderson e pela tentativa de homicídio da assessora Fernanda Chaves. O crime foi arquitetado e levado a cabo por homens experientes e treinados, ex-agentes públicos com suspeita de extensa folha de serviços prestados a contraventores, milicianos e outros frequentadores do submundo marginal.
A primeira etapa — a identificação dos executores — pode ser dita como bem encaminhada para análise pelo Tribunal do Júri que definirá os acusados como culpados ou não. A segunda etapa — a elucidação dos mandantes do crime — é novo desafio, ainda mais duro e necessário. As investigações em andamento apontam para lideranças político-milicianas de longa tradição no Rio de Janeiro. Faltam ainda provas cabais de tal vinculação com o duplo homicídio, mas estas devem ser perseguidas de forma tenaz por aqueles que defendem a depuração da atividade política na Câmara Municipal e na Assembleia Legislativa do Rio.
A ação inescrupulosa de agentes do Estado que buscaram turvar o trabalho dos investigadores arrolando falsas testemunhas para dificultar a identificação dos reais mandantes do crime deve ser punida exemplarmente. É assombroso que suspeitas recaiam sobre quadros da elite da Polícia Federal, numa manobra de lançar fumaça para não ser descoberto de onde realmente partiu o fogo.
Lamente-se o fato e afastem-se desde já dos holofotes aqueles que — contrariando passado recente de declarações e atos públicos constrangedores de apoio a brutamontes — desejam agora obter ganhos políticos em cima do trabalho policial feito com excelência e técnica. Enfim, para que a sociedade e as instituições saiam mais fortes dessa imersão depuradora no mundo do crime, cabe responder com clareza à questão que falta: quem mandou matar Marielle e Anderson?
Um comentário:
Quem mandou matar Marielle? Parece enredo de novela das oito.
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