sexta-feira, 15 de março de 2019

Reinaldo Azevedo: Lava Jato sem caixa forte

- Folha de S. Paulo

Quando esses valentes estão na arena, só uma postura é aceitável: dizer 'sim'

A Lava Jato viu frustrada a sua maior jogada até agora em sua luta para ocupar nas consciências o lugar do imperativo categórico. Não terá a sua bilionária fundação de direito privado com grana da Petrobras. E os juros multimilionários que ela ensejaria.

Os já nem tão novos utopistas —ou distopistas— estão furiosos. E atribuem seu insucesso a uma grande conspiração liderada por aqueles que teriam interesse no fim da operação, e claro!, por Gilmar Mendes, do STF. Dada a estupefação unânime do mundo jurídico e associados, concluí que o ministro manda em todo o Judiciário, no TCU, nas entidades de classe de juízes, nos órgãos de representação dos advogados...

Não consegui encontrar um só defensor daquela estrovenga, a não ser os membros da força-tarefa, coordenada por Deltan Dallagnol. A Constituição veda expressamente a maracutaia em pelos menos três artigos. E um quarto impede a homologação do acordo, o que feria de morte o despacho da juíza Gabriela Hardt, que não vale mais.

Tratei do assunto aqui na sexta passada. À tarde, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, ex-Batman do Menino Prodígio, foi às redes sociais esculhambar os críticos da fundação. Num trecho notável de seu ataque, compartilhado por Robin, lia-se: “Sobre as críticas à destinação de 2 bilhões e 500 milhões de reais, pode-se dizer que há os que não leram e criticam; há os que leram, não entenderam, e criticam; e há os que leram, entenderam, e, por má-fé, criticam.”

Notem que esse arauto de um novo tempo da democracia brasileira não considera a hipótese de haver alguém que tenha lido e entendido e que discorde de boa-fé. Quando esses valentes estão na arena do debate, só uma postura é aceitável: dizer “sim”. Não é por acaso que a Lava Jato pegou carona em Jair Bolsonaro, e Jair Bolsonaro, na Lava Jato. E também não é à toa, para quem sabe como funciona o circo, que o presidente da República busca agora meios de conter a escalada de Sergio Moro, seu “indemissível ad nutum”...

Má-fé, Carlos Fernando? Má-fé é o que está no Item 8 das Considerações iniciais do acordo. Consta que ou valem os termos lá contidos, que preveem a fundação, ou o dinheiro terá de ser recolhido ao Tesouro americano, já que deriva de multa que seria paga naquele país. Como demonstrou a procuradora-geral, Raquel Dodge, no recurso enviado ao Supremo contra aquela excrescência, tal exigência não está no entendimento celebrado com o Departamento de Justiça dos EUA. Trata-se apenas de uma mentira bilionária.

É preciso que se diga: Dallagnol quer mesmo é ser procurador-geral da República e tem Moro como cabo eleitoral. Decisão tomada no dia 1º pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal define que só subprocurador-geral, dois degraus acima de onde ele está, pode ocupar o cargo. E também isso é vendido ao distinto público como parte da grande conspiração contra a Lava Jato. Leiam a Lei Complementar 75.

O Artigo 67 dispõe que só subprocurador-geral pode ser vice-procurador-geral. Entenderam? O vice de Dallagnol estaria bem acima dele na carreira. Piada. Só a democracia, por meio do voto direto dos cidadãos, permite que capitão tenha um general como segundo. E não dá certo. Não vai dar, Dallagnol. Para com essa agressividade choramingas.

Mais uma: a conversa de que processos unificados na Justiça Eleitoral, quando envolvem acusações de caixa dois e eventuais crimes conexos, concorreriam para a impunidade e agrediriam a Lava Jato é outra fantasia totalitária dos espadachins da reputação alheia. Sem contar o absurdo da premissa: a de que o juiz iria, necessariamente, atuar em desfavor da lei e da sociedade. A imprensa comprou a pauta e não se dá conta de suas implicações. Impor a divisão implicaria admitir o princípio ou da incompetência ou da má-fé.

E olhem que essas tentações ainda nem contam com uma fundação bilionária e o que isso renderia de juros... Não! A Lava Jato não vai mergulhar na caixa-forte de Tio Patinhas. Isso era coisa para os Irmãos Metralha.
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Tiros na Raul Brasil: Há só um caminho moral para os indivíduos e só uma escolha ética para os homens públicos no caso da tragédia de Suzano: medidas em favor da tolerância e contra a violência. Há quem ache que isso se realiza com a generalização do porte de armas. Você escolhe se é moral. Os homens públicos vão escolher se é ético.

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