- Folha de S. Paulo
Crise impõe ação emergencial de governo e Congresso
Estamos em maio, mês das noivas. O atual presidente gosta de fazer metáforas com namoro, noivado e casamento. Que ele aproveite e faça um noivado com o crescimento. Não se conforme com o desastre de crescimento de 1%, no máximo, se a economia continuar patinando.
De maneira acertada e realista, o governo definiu a reforma da Previdência como central para evitar a desorganização completa das contas públicas. Agora, a Comissão Especial da Câmara vai aprimorar a proposta e fazê-la mais justa para não impor a maior parte dos custos aos milhões de brasileiros que só têm o INSS como aposentadoria.
No entanto, estropiado por anos de desgoverno petista, o Brasil tem pressa. Há milhões de brasileiros vivendo mal, sem trabalho e com fome. Os comércios não param de fechar, investimentos estão sendo engavetados e até os bicos estão cada vez mais difíceis. Isso vale para São Paulo, a “terra das oportunidades”, como para todo o país.
Governo e Congresso, com a sensibilidade que se espera de quem representa o povo, devem unir esforços para uma ação emergencial e inadiável, buscando saídas para a crise.
As reformas são importantes, sim, mas é preciso atuar em outras frentes. Cabe especialmente ao presidente se empenhar na centralidade desse desafio.
Jair Bolsonaro (PSL) já disse que não entende de economia. E tem silenciado quando se trata de exigir de sua equipe econômica que faça o dever de casa e não deixe a economia real à deriva, com todos os indicadores despencando. A indústria teve o pior trimestre desde o fim de 2016, a confiança de empresários e consumidores está em baixa e o desemprego assola mais de 13 milhões de pessoas. Para a construção civil, o ano, que mal começou, já acabou. Tudo posto, a conclusão é uma só: não vai ter crescimento.
O governo não pode continuar perdendo tempo —e oportunidades— com futricas e factoides. Por que não age com a severidade que a crise exige? Do jeito que vai, a Previdência passou de tábua de salvação para bode expiatório de um governo desorientado, com uma agenda grotesca que só agrava o ambiente político/institucional, “distraindo” a sociedade do que realmente importa: crescimento, emprego, renda, combate às gritantes desigualdades.
Há o que fazer. Há margem para reduzir a taxa Selic sem pressão inflacionária. Retomada de investimentos e concessões. Agir rápido sobre renovação e/ou caducidade de concessões rodoviárias e aeroviárias. Aprovação de projeto de lei no Senado permitindo autorização (não concessões) para novas ferrovias.
Raspa do tacho para algum incremento no investimento público. FGTS. Ações focadas do BNDES para modernização de pequenas e médias empresas. Diálogo pragmático de resultado com a indústria. Política externa concentrada para ampliação do comércio exterior.
O governo deve agir menos por impulso. Impedir que a cozinha vire sala, para que as conversas sejam mais produtivas. Vieram há pouco medidas de desburocratização e diz-se que a equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) prepara agora algum pacote. Que venha logo e sirva para ajudar a recuperar confiança na condução da economia e, principalmente, ânimo para investir.
Em 1995, no início do mandato, o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) mandou na abertura dos trabalhos do Congresso o pacote de propostas de emendas constitucionais. O Brasil de agora não admite urgência menor, pelo contrário. E o Congresso, depois de três meses de atividades, deve assumir o protagonismo que lhe cabe.
Quanto menor o crescimento do PIB neste ano, mais difícil será reanimar as expectativas e restabelecer um quadro de normalidade no país. Como estamos, o tempo para o retorno do emprego e da renda vai se tornando uma miragem.
O que não vale é o governo dizer que o tempo até aqui foi curto. Sim, pouco mais de quatro meses não revertem um desastre de muitos anos. Mas não se jogam fora os meses mais venturosos de um governo recém-chegado, que tantas expectativas de mudança criou, com um inútil jogo de cena, ignorando a gravidade da crise e deixando tudo para o pós-Previdência.
O risco de um cenário pessimista parece cada vez maior. Mudar essa impressão depende, sobretudo, do governo e, especialmente, do presidente.
*José Aníbal, Economista, ex-presidente nacional do PSDB e do Instituto Teotônio Vilela; ex-deputado federal por São Paulo e atualmente suplente do senador José Serra
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