quinta-feira, 13 de junho de 2019

Luiz Carlos Azedo: Guerra cibernética

- Nas entrelinhas / Correio Braziliense

“Há certa angústia no governo quanto à possibilidade de novas revelações sobre as conversas de Moro, que saiu fragilizado do episódio, apesar da solidariedade que vem recebendo”

O governo suspeita que os ataques de hackers à Operação Lava-Jato seriam o deslocamento da fronteira da “guerra cibernética” para o Brasil. Especialistas militares temem que o jornalista Glenn Greenwald, do site The Intercept, esteja recebendo as informações que publicou de hackers russos que operam para grandes corporações, doleiros internacionais e o próprio governo de Vladimir Putin. A teoria conspiratória ganhou mais força depois da invasão de um grupo do aplicativo russo Telegram por meio do celular de um dos membros do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o conselheiro Marcelo Weitzel, do Ministério Público Militar.

O hacker que clonou seu celular se anunciou como tal e disse que poderia acessar “quem quiser e quando quiser”. A conversa ocorreu na noite de terça-feira passada, quando mensagens do perfil de Weitzel questionaram a atuação de procuradores da força-tarefa da Operação Lava-Jato. Um dos integrantes questionou o hacker: “Marcelo, essas mensagens são suas? Não está parecendo seu estilo. Checa teu celular aí”. Uma pessoa que se passava pelo procurador militar respondeu: “Hacker aqui. Adiantando alguns assuntos que vocês terão de lidar na semana, nada contra vocês que estão aqui, mas ninguém melhor que eu para ter acesso a tudo, né”.

Vários procuradores foram hackeados. Em troca de mensagem com o procurador regional José Robalinho Cavalcanti, ex-presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, o hacker deu a entender que era uma espécie de mercenário cibernético: “Eu não tenho ideologias, não tenho partidos, não tenho lado, sou apenas um funcionário de TI (tecnologia da informação)”. Ainda não se sabe se é o mesmo hacker que entrou nas conversas do ministro da Justiça, Sérgio Moro, com os integrantes da força-tarefa da Lava-Jato.

Há quatro inquéritos na Polícia Federal investigando o caso, mas a Procuradoria-Geral da República quer que sejam unificados. Os ataques de hackers aos integrantes do Ministério Público vêm ocorrendo desde quando tentaram invadir as contas do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, sem, entretanto, obter o mesmo sucesso de agora. Há certa angústia no governo quanto à possibilidade de novas revelações sobre as conversas de Moro, que saiu fragilizado do episódio, apesar da solidariedade que vem recebendo . Ontem, na Câmara, o ministro foi convocado a dar esclarecimentos sobre os vazamentos na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Outra coisa
A suposta existência de uma guerra cibernética, como suspeitam os militares, porém, não interdita o debate jurídico sobre a atuação do ministro Sérgio Moro como juiz da Operação Lava-Jato, que hoje divide a opinião pública e o mundo jurídico. Ontem, o ministro relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, disse que o andamento dos processos relacionados à operação não serão prejudicados: “A Lava-Jato é uma realidade, e não acredito que essa realidade venha a ser afastada por qualquer circunstância conjuntural”, afirmou. Segundo o ministro, a Lava-Jato “não é suscetível de qualquer retrocesso”.

Nos bastidores do Supremo, porém, há muitos questionamentos sobre a atuação de Moro e da força-tarefa da Lava-Jato. Pelo menos cinco ministros já estariam propensos a considerar nulas certas decisões tomadas por Moro de comum acordo com os procuradores. Ontem, questionado pela imprensa, o ministro Luiz Fux, vice-presidente do STF, disse ter certeza de que o assunto será judicializado, mas se recusou a fazer juízo de valor. O pano de fundo da questão é o julgamento do pedido de habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula das Silva, marcado para o próximo dia 25.

O clima no Supremo não é dos melhores para o governo. Decisões tomadas pelo presidente Jair Bolsonaro começam a ser questionadas judicialmente. Ontem, por exemplo, o plenário da Corte formou maioria para impedir, provisoriamente, a extinção de conselhos da administração pública federal que tenham amparo em lei. Votaram contra a extinção: Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Celso de Mello.

Marco Aurélio, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Luiz Fux votaram com a ressalva de que somente não podem ser extintos os conselhos criados expressamente por lei. Ainda não votaram Dias Toffoli e Gilmar Mendes. O julgamento deve ser encerrado hoje, com decisão de caráter provisório: Bolsonaro ficará proibido de extinguir conselhos da administração que tenham aval do Congresso Nacional até o julgamento do mérito da questão. Os que foram constituídos por decreto, portarias e resoluções poderão ser extintos caso a caso. A Advocacia-Geral da União (AGU) estima que existem no país 2,5 mil conselhos e colegiados, quase a metade criados por portarias, medidas provisórias e decretos.

Volto já — por uns dias, me ausentarei da coluna.

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