quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Ribamar Oliveira - Opção preferencial pelos militares

- Valor Econômico

Investimentos da Defesa se tornam obrigatórios

Contrariando o discurso oficial, que prega a redução do engessamento orçamentário, o governo aceitou que os investimentos do Ministério da Defesa programados para 2020 não sejam objeto de limitação de empenho, ou seja, não poderão sofrer contingenciamento. Os investimentos da Defesa serão, portanto, obrigatórios no próximo ano. Os únicos do Orçamento.

O governo poderia ter vetado o dispositivo da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) - lei 13.898/2019 - que dá tratamento privilegiado aos investimentos da Defesa, como fez com outros gastos que os deputados e senadores tentaram proteger da tesoura no próximo ano, mas não o fez.

Os parlamentares incluíram na lista das despesas que estão livres do contingenciamento 13 novas ações e programas. Eles excluíram dos cortes, por exemplo, todas as ações vinculadas à educação, os gastos com o programa Mais Médicos e as ações do Plano Nacional de Segurança Pública. Tudo isso foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro, depois de ouvido o Ministério da Economia.

A explicação para os vetos foi a seguinte: “Os itens propostos não são passíveis de limitação de empenho, o que, por consequência, eleva o nível de despesas obrigatórias e reduz o espaço fiscal das despesas discricionárias, além de restringir a eficiência alocativa do Poder Executivo na implementação das políticas públicas”. O governo também argumentou que “a inclusão contribui para a elevação da rigidez do Orçamento, dificultando não apenas o cumprimento da meta fiscal como a observância do Novo Regime Fiscal, estabelecido pela EC nº 95/2016 [teto de gastos], e da ‘regra de ouro’, constante do inciso III, do art. 167 da Constituição Federal”.

Os mesmos argumentos, no entanto, não foram válidos para os investimentos do Ministério da Defesa e para as despesas com ações vinculadas à função ciência, tecnologia e inovação, no âmbito do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). Quando encaminhou ao Congresso a mensagem modificativa da proposta orçamentária de 2020, o governo informou que incluiu na relação das despesas obrigatórias do próximo ano dotações de R$ 4,1 bilhões do Ministério da Defesa e R$ 3,1 bilhões do MCTIC.

Na mesma mensagem modificativa, o governo ampliou em R$ 5,4 bilhões as chamadas despesas discricionárias, que são os investimentos e o custeio estrito da máquina pública. Elas estavam com valores muito baixos na proposta orçamentária original. Do total, 44% foram destinados ao Ministério da Defesa, ou R$ 2,376 bilhões. A área de infraestrutura ganhou só 17,6% do total e o Ministério da Educação, ficou com apenas 11%.

Não houve explicações oficiais para a maior destinação de recursos ao Ministério da Defesa nem para a inclusão dos investimentos do órgão no rol das despesas obrigatórias da União, principalmente diante da carência de recursos em áreas vitais da infraestrutura, no momento em que o país passa por um verdadeiro apagão logístico.

Os investimentos do Ministério da Defesa que passarão a ter execução obrigatória no próximo ano são: programa de desenvolvimento de submarinos (Prosub) e programa nuclear da Marinha (PNM), com dotação de R$ 1,5 bilhão; desenvolvimento de cargueiro tático militar de 10 a 20 toneladas, com R$ 166,430 milhões; aquisição de aeronaves de caça e sistemas afins, projeto FX-2, com R$ 951,370 milhões; aquisição de cargueiro tático militar de 10 a 20 toneladas, projeto KC-390, com R$ 613,830 milhões; implantação do sistema de defesa estratégico Astros, com R$ 155,7 milhões; implantação do projeto Guarani, com R$ 338,1 milhões; e implantação do sistema integrado de monitoramento de fronteiras (Sisfron), com R$ 239,7 milhões. Os dados constam da mensagem modificativa da proposta orçamentária de 2020.

Mais gastos
Por meio do decreto 10.120, de 21 de novembro deste ano, o presidente Jair Bolsonaro elevou os limites para despesas com pessoal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) e do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFJ). Especialistas em finanças públicas ouvidos pelo Valor estimam que os novos limites permitem que os dois órgãos elevem seus gastos com pessoal em até 45% ou algo em torno de R$ 1,4 bilhão.

A Constituição determina que o gasto da União com pessoal não pode exceder a 50% da receita corrente líquida, sendo o limite de 40,9% para o Executivo. Deste total, 3% serão distribuídos entre o Distrito Federal, o TJDFT, o MPDFT e o quadro em extinção dos ex-territórios do Amapá e de Roraima. Com o decreto, o limite do TJDFT passou de 0,275% para 0,399%, enquanto que o limite do MPDFT passou de 0,092% para 0,133%. Os limites dos ex-territórios foram diminuídos, o do Distrito Federal foi mantido, respeitando o limite global de 3%.

Consultado pelo Valor sobre a mudança, o Ministério da Economia informou que o decreto 10.120 “não altera os gastos no total, tendo em vista os limites estabelecidos pela emenda constitucional 95, de 2016, ou seja, para aumentar a despesa com pessoal, os órgãos envolvidos deverão reduzir os mesmo valores nas despesas discricionárias”.

Segundo o Ministério da Economia, “a alteração partiu de demanda do órgão em comum acordo com os outros órgãos submetidos ao mesmo limite para ajustar à realidade da divisão de gastos de pessoal entre os envolvidos”.

É preciso considerar, no entanto, outros aspectos desta questão. Em 2012, o TJDFT usava 65,1% do seu limite para gasto com pessoal e em 2019 foi para 87,3%. O MPDFT, por sua vez, saiu de 57,8% de seu limite para 86,1%, no mesmo período. Os dados indicam que há uma tendência nesses dois órgãos para uma política de pessoal expansionista. A modificação realizada não é neutra do ponto de vista fiscal, pois abre espaço para a continuidade dessa política.

Um eventual aumento do gasto com pessoal dos dois órgãos terá que ser compensado pelo corte de outras despesas para que a regra do teto seja cumprida. A questão é que haverá, mais uma vez, aumento de despesa obrigatória, com redução das despesas discricionárias, o que é, justamente, o que o atual governo deseja evitar.

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