Blog do Noblat / Metrópoles
Os partidos que apoiam Lula caem no
negacionismo ao exigirem que ele, se eleito, revogue a reforma trabalhista
Há três anos somos governados por um
negacionista, cuja cabeça é orientada por crenças do passado. Este espírito
revogatório da realidade exige a unidade dos democratas para obterem os votos
necessários e impedir sua reeleição. Tudo indica que o caminho para isto é o
voto em Lula.
Mas faltando cinco meses para a eleição, muitos eleitores começam a temer que Lula traga também um espírito negacionista, tentando revogar a realidade, com base em crenças diferentes do Bolsonaro, mesmo assim crenças baseadas em ideologias que negam a realidade onde funciona a economia contemporânea de qualquer país. A visão de líderes próximos a Lula assustam aos que não querem mais governos negacionistas, assustam ainda mais ao perceber-se o risco de que por isto ele perca votos e milhões de antibolsonaristas optem pelo voto nulo, em consequência reelegendo Bolsonaro.
Não perceber as mudanças que acontecem no
mundo é uma forma de negacionismo tão grave quanto dizer que a Terra é plana. A
Terra não é apenas redonda, ela ficou global: em sua economia e sociedade,
dividida por uma cortina de ouro que separa pobres de ricos, mas global. Negar
a globalização é como negar a contaminação por vírus; negar as novas
tecnologias e suas consequências sobre as relações entre capital e trabalho é
como negar o papel das vacinas; não perceber os limites fiscais é uma forma de
negacionismo científico.
Os partidos que apoiam Lula caem no
negacionismo ao exigirem que ele, se eleito, revogue a reforma trabalhista, a
PEC do Teto, a reforma do ensino médio e da Previdência. É negacionismo diante
da realidade do mundo atual e reacionarismo diante da marcha do progresso. Um
governo progressista deve reformar as reformas, aprimora-las, fazê-las mais
progressistas. Mas revoga-las é negar a realidade, é imaginar que a crise
civilizatoria é uma gripezinha da sociedade, e recusar as vacinas que a
economia contemporânea precisa, sob a forma de reformas e até revoluções.
O mais grave é que ao negar a realidade, o
PT e outros partidos empurram a candidatura de Lula para o isolamento que pode
custar sua eleição e condenar o Brasil a, pelo menos, mais quatro anos de
Bolsonaro.
O negacionismo de Bolsonaro custou algumas
centenas de milhares de mortes, o negacionismo da esquerda reacionária e
nostálgica pode custar a perda da sintonia do Brasil com a realidade socioeconômica,
ou custar ao Brasil a continuação do negacionismo de Bolsonaro. Lula precisa
perceber que o progresso sempre exige reformas, que o marco legal vigente vem
de uma Era Sócio-Econômica Anterior e que serviram pouco para incluir dezenas
de milhões de pobres excluídos; mas a garantir direitos a parcelas já
incluídas. No lugar do anti-reformismo, deve se comprometer com as reformas que
os últimos governos conservadores não fizeram: radical reforma politica e
eleitoral; fim de privilégios, mordomias e subsidios improdutivos e
concentradores social e regionalmente; zerar os gastos secretos e o fundo
partidário; reduzir substancialmente o custo de campanhas; reforma para quebrar
o círculo vicioso da desigualdade social, decorrente da desigualdade como a
qualidade da educação de base é oferecida conforme a renda e o endereço da
criança.
No lugar de um governo revogatório voltado
ao passado, Lula precisa ter proposta reformista olhando para o futuro. Sem
visão para frente ele governará reacionariamente ou nem governe, por perder a
eleição e deixar o Brasil condenado ao abismo. Melhor o atraso do que o abismo,
mas o Brasil tem direito a querer mais do Lula: reformas, não revogação.
*Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador
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