Folha de S. Paulo
A movimentação faz parte da disputa para
reorganizar território que vai do centro à ultradireita
A renúncia de João Doria à candidatura presidencial é um marco na irresistível caminhada do PSDB rumo à irrelevância. Pela primeira vez desde a sua fundação, há 34 anos, a sigla não terá candidato ao Planalto. Exibe assim seu fracasso em recuperar o que perdera em 2018: a capacidade de aglutinar e representar o antipetismo no plano nacional.
Hoje está claro que o terremoto político que desalojou Dilma Rousseff do
Planalto não destruiu a liderança do PT entre as forças situadas do centro para
a esquerda do espectro político. Antes, desorganizou o jogo de poder no terreno
adversário, abrindo espaço para a vitória eleitoral e a afirmação política da
barbárie populista.
Na realidade, a movimentação da chamada terceira via faz parte da disputa para reorganizar o congestionado território que vai do centro à ultradireita, por meio da criação de uma liderança nacional distinta do extremismo autoritário encarnado por Jair Bolsonaro. Analistas respeitáveis acreditam que a desistência do ex-governador de São Paulo abre brecha promissora para uma candidatura que concorra com o ex-capitão pelos votos de quem não quer o PT de volta.
Pesquisas de opinião indicam que, entre os
bolsonaristas fiéis e aqueles que gostariam de levar Lula de novo ao Planalto,
existem eleitores que rejeitam o presidente e o antagonista. Mas o que os
números afirmam, a experiência passada parece negar.
O professor Fernando Limongi, da Fundação
Getúlio Vargas em São Paulo, argumenta que, embora em toda eleição o desfecho
seja incerto, as regras da disputa presidencial geram um padrão discernível.
Desde 1994, a competição se dá entre dois grandes blocos, opondo esquerdas e
direitas, com escasso espaço para uma terceira candidatura.
Orientados pelas pesquisas, partidos e
eleitores fazem voto útil já na primeira rodada, de tal forma que a seguinte,
quando ocorre, apenas confirma o resultado anterior.
Neste ano, as condições são especialmente
difíceis para candidatos apropriadamente apelidados "nem-nem". Pela
primeira vez estarão na arena um presidente que aspira à reeleição, com a
caneta e outros recursos à disposição dos mandatários, e um ex-presidente que
participou de seis das oito corridas do gênero, ganhou duas e deixou o cargo
aprovado por inéditos 87% dos cidadãos. É pouco provável que esse quadro se
altere até outubro.
Os resultados para os governos estaduais e
as câmaras legislativas definirão o porte das direitas não bolsonaristas.
Para o bem da democracia, tomara que não
sejam eclipsadas pelo que há de mais brutal e primitivo na política brasileira.
*Professora titular aposentada de ciência
política da USP e pesquisadora do Cebrap.
Um comentário:
Eu nunca considerei o PSDB um partido de direita,a disputa era entre a esquerda petista e a social-democracia-centrista.
Postar um comentário