Folha de S. Paulo
Presidente apela ao golpismo diante da
derrota que se anuncia
Bolsonaro já está
convencido de que não se reelege, e tem medo. Há dois meses até a eleição,
tempo que não levaria um candidato esperançoso a providências de desespero.
Paulo
Guedes e outros estão acionados em duas linhas avançadas. Uns têm
feito sondagens nos tribunais superiores sobre possível
contenção dos processos criminais de Bolsonaro.
Outros são portadores de propostas em que
atitudes positivas de Bolsonaro e o encerramento dos processos se compensariam.
Mesmo que parte do Supremo Tribunal Federal argumente com a conveniência de instituições pacificadas e eleições tranquilas, não há sinal de maioria aberta a acordo.
Por diferentes modos, está muito presente o
entendimento de que Bolsonaro
avançou demais nos ataques à legalidade democrática, e o regime cobra
atitudes.
Diante da derrota que se anuncia e da
recusa de desvios no roteiro legal e moral dos processos, o
que os medos de Bolsonaro têm a oferecer é a covardia travestida, que
apela ao mais estúpido, ao mais violento —no caso, o golpismo, sua cloroquina
política.
Com isso, a
clareza trazida pelas pesquisas mais confiáveis tanto distensiona o
ambiente quanto exige reação redobrada aos riscos do regime.
Nela incluídas atenções
redobradas com a proteção de Lula: os estímulos à posse de arma visam ao
seu uso.
Entre as precauções, uma das principais
está esquecida. É
a de interferência externa. Sua ocorrência nem seria novidade, apenas de
procedência diferente.
No seu despreparo abobalhado, o
recém-eleito Collor informou publicamente a ida imediata aos Estados Unidos
para um agradecimento pessoal ao então presidente Bush-pai pela ajuda —não
esclarecida, porém.
Bill Clinton mandou ao Brasil o que chamou
de estrategista, para propor espertezas à candidatura de Fernando Henrique.
Sergio Moro poderia dizer algumas coisas
sobre a eleição presidencial de 2018, seja quanto a funcionários americanos
mandados a Curitiba, seja sobre suas próprias idas aos Estados Unidos e
contatos por lá, durante
a Lava Jato.
Putin não terá menos sem-cerimônia aqui do
que na eleição em
que "os serviços" russos contribuíram para a eleição de Trump.
Ter a seu favor um país como o Brasil é
proveitoso para Putin em vários sentidos. Apesar disso, o eleitorado brasileiro
está despreparado, por falta total de informação, para ser tão impermeável
quanto possível a manipulações via internet.
Interessado, como diz o ministro da Defesa,
na segurança das eleições, o Exército e seus inesperados experts em informática
eleitoral deveriam ter estudado, e feito aplicarem-se, barreiras às redes
internacionais de interferências que se expandem também por pequenos países
asiáticos. Não conviria a Bolsonaro.
Substituta da ex-ministra Damares Alves,
Cristiane Britto cometeu a útil gafe de uma
prova da possível interferência externa pró-Bolsonaro.
Diz ela que ouviu do ministro do exterior
húngaro apenas
uma "mensagem de apoio e simpatia entre autoridades".
É mentira. Seu relatório da conversa diz
que ele "questionou se haveria algo que o governo húngaro poderia fazer
para ajudar na reeleição do presidente Bolsonaro". Frase translúcida.
Viktor Orbán, que golpeou a democracia e
encabeça o governo ultradireitista da Hungria, foi visitado por Bolsonaro em
seguida à visita a Putin e então chamado de irmão pelo brasileiro fascinado.
Visto como eixo da conexão internacional do
autoritarismo originado em novo modelo de golpe, pelo confronto entre os
poderes, Orbán concedeu encontros e comunicações à distância com Eduardo
Bolsonaro.
Já foi dito que veio dele o conselho a
Bolsonaro para ir a Putin, um apoio às vésperas do ataque russo à Ucrânia.
Lógica e óbvia, pois, a pergunta revelada por Cristina Britto.
As
manifestações recentes contra todo golpismo, com inclusão até do sistema
bancário iniciada por controladores do Itaú Unibanco, mudaram o cenário. As
pesquisas desinquietam.
Mas o que é capaz de conter os ímpetos
tumultuosos de Bolsonaro, mais exacerbados pela derrota prevista e pelo medo,
não dá nem dará garantias de respeito à democracia.
Declarações e acordos assinados antecederam
todos os tantos golpes militares, tentados e consumados, do passado sinuoso e
mediocrizado pelos tanques e fuzis.
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