O Estado de S. Paulo
A análise de Norberto Bobbio sobre o
ex-primeiro-ministro italiano tem pontos que nos transportam, sem escalas, ao
Brasil de hoje
O filósofo italiano Norberto Bobbio
costumava dizer que a Itália é um laboratório político. Ele sabia o que estava
dizendo. Nascido em 1909 e falecido em 2004, Bobbio viu e comentou os grandes
acontecimentos do século 20, aí incluídos o regime fascista de Mussolini e os
governos de Silvio Berlusconi na Itália.
Bobbio escreveu que o fascismo “morreu e
não há celebração que possa fazê-lo reviver” (a “queda do fascismo”), mas o
“laboratório político” italiano ainda lhe reservava surpresas. Em 1994, o
megaempresário Silvio Berlusconi torna-se primeiro-ministro da Itália.
Em seus artigos na imprensa, Bobbio era um
crítico contumaz do polêmico político. Ele deplorava o fato de que Berlusconi,
proprietário de “três grandes máquinas de formação do consenso (emissoras de
televisão) tivesse constituído um partido pessoal próprio” e, “com o apoio
desse sustento incomum”, se tornado primeiro-ministro (Contra os novos
despotismos: escritos sobre o berlusconismo).
Num artigo escrito durante a campanha que antecedeu as eleições de 1994, Bobbio já via em Berlusconi um “fenômeno sem precedentes” e se perguntava: “Já aconteceu algo parecido na Itália ou em qualquer outro país”? Bobbio insinua que não. Mas o “laboratório” italiano não traça fronteiras, e a análise de Bobbio sobre Berlusconi tem pontos que nos transportam, sem escalas, ao Brasil de hoje.
O filósofo italiano reprovava, por exemplo,
as anacrônicas declarações de Berlusconi de que sua tarefa era “proteger os
valores cristãos ameaçados pelos comunistas ateus”, ou que o principal objetivo
de seu partido era não “deixar o país cair nas mãos dos comunistas”. Essa
obsessão pelo finado comunismo lembra alguém?
Bobbio reprovava, também, o hábito do
ex-primeiro-ministro de “se fazer de vítima de complôs, de conspirações, de traições,
ingênuo alvo de inimigos malvados e de pérfidos aliados”. Além disso, “insulta
os juízes e tenta deslegitimá-los de todos os modos”.
Bobbio criticava Berlusconi, ainda, pela
forma como se dirigia à população. De um lado, já se autodenominou “ungido pelo
Senhor”; de outro, ao ser cobrado pelo não cumprimento de suas promessas
eleitorais, afirmava que “não o deixaram trabalhar”. Esse horror à
responsabilidade lembra alguém?
E não é só Bobbio que, analisando
Berlusconi, nos remete a Jair Bolsonaro. Seu compatriota Umberto Eco
(1932-2016), num artigo de 2003 (ano em que Berlusconi também foi
primeiro-ministro) destacava: “A figura de Berlusconi se presta à sátira, seus
adversários às vezes se consolam pensando que ele passou das medidas, e têm
certeza (...) que ele corre em direção à própria ruína”. Mas Eco acreditava que
Berlusconi estava “colocando em ação, justamente com os gestos mais
incompreensíveis, uma estratégia complexa, sagaz e sutil”.
Entre as técnicas de Berlusconi, Eco cita
“promessas que, boas, ruins ou neutras, (...) se apresentem aos olhos dos
críticos como uma provocação. E deve produzir uma provocação por dia, tanto
melhor se inconcebível e inaceitável”. A provocação deve ser tal que “a
oposição seja obrigada a aceitá-la e a reagir com energia”. Isso porque
“conseguir produzir todos os dias uma reação indignada das oposições (...)
permite a Berlusconi mostrar ao próprio eleitorado que ele é vítima de uma
perseguição”.
Ainda sobre provocações, a estratégia de
Berlusconi seria “lançar a provocação, desmenti-la no dia seguinte (...) e
lançar imediatamente uma outra”. Haveria dois objetivos essenciais nessa
estratégia, diz Eco. Primeiro, trata-se de um balão de ensaio que, se não
suscitar reação enérgica da opinião pública, “significa que até mesmo o mais
ultrajante dos caminhos poderia ser, com a devida calma, percorrido”.
O segundo objetivo é o que Eco chamava de
efeito bomba. No exemplo dele, “se eu fosse um homem de poder enredado em
muitos e obscuros negócios, e ficasse sabendo que dentro de dois dias
estouraria nos jornais uma revelação que esclareceria meus malefícios (...),
mandaria colocar uma bomba (...) numa praça na saída da missa”. Desse modo,
“por pelo menos 15 dias as primeiras páginas dos jornais (...) só teriam espaço
para o atentado”. Desviar o foco das atenções é, também, uma especialidade do
nosso presidente.
Eco traz sugestões para contrapor-se a essa
estratégia, mas elas não cabem neste espaço. Aqui, o objetivo é reportar
semelhanças no comportamento dos dois políticos (geralmente identificados ao
populismo) e notar que Berlusconi, depois de tantos anos, ainda exerce
influência na política italiana.
É incerto se o mesmo ocorrerá com
Bolsonaro. O que parece certo é que sua mentalidade seguirá presente na
sociedade brasileira (basta notar quão frequentes se tornaram, de uns anos para
cá, avaliações elogiosas da infame ditadura militar). Ou seja: se a Itália,
como dizia Bobbio, é um laboratório político, o Brasil é o de Frankenstein.
*Doutor em direito pela USP e pela Università degli studi di Torino, integrante do Instituto Norberto Bobbio, é professor da FADI e FACAMP
2 comentários:
Realmente a gente tem um paralelo com a Itália histórico, a operação mãos limpas na Itália começou prendendo os mafiosos que infestavam a administração pública causando graves prejuízos financeiro einstitucional pra nação italiana ,
Foi feito uma limpa, centenas de presos e a quadrilha mafiosa foi desbaratada, com seus Chefões presos, no entanto logo após houve uma reviravolta o juiz morreu em um atentado e muito foi desfeito
Aqui da mesma forma, a lava jato prendeu mais de uma centena de corruptos, inclusive o chefe Lula da Silva, que saqueavam o Brasil de forma sistema e institucional
Os ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello denominaram o governo Lula de Claptocracia
Governo dos ladrões,
Enquanto juiz Sérgio Moro,? que conduziu de forma brilhante esse processo e que teve 6 bilhões de reais devolvido dos corruptos do dinheiro público roubado, hoje é perseguido e caçado por esses mesmos que outrora foram condenados, com ajuda claro dos seus cúmplices , os 7 ministros indicados pelo PT no STF
Tanto lá quanto cá, os poderosos acostumados ao dinheiro fácil desviado do imposto suado do brasileiro , mostraram que estão dispostos a lutar com unhas e dentes para manutenção de seus privilégios
Estamos vendo agora aqui no Brasil essa guerra frenética, insana apoiado em mentiras, para recolocar Lula de volta à cena do crime e tudo correr bem como antes, a harmonia total entre os poderes à base de muito dinheiro
do povo trabalhador
Assim como os heróis se parecem,os vilões também.
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