terça-feira, 20 de setembro de 2022

Hélio Schwartsman - A Multiplicação das igrejas

Folha de S. Paulo

Vantagens tributárias e outras conferidas pelo Estado brasileiro explicam o fenômeno além da fé

Jesus multiplicou os pães, pastores multiplicam as igrejas. Deu em O Globo que, ao longo da última década, foram abertas no Brasil 21 igrejas evangélicas por dia. Em 2013, havia 71.745 instituições desse tipo; em maio de 2022, elas já eram 178.511.

Não duvido de que a fé responda por muito desse movimento, mas questões tributárias e outras vantagens que o Estado brasileiro confere a igrejas, também.

Digo-o com conhecimento de causa, pois já fui o feliz proprietário de uma instituição religiosa. No ano da graça de 2009, num experimento jornalístico, eu e colegas da Folha criamos a Igreja Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio.

Seus estatutos traziam um amontoado de delírios entremeados de elucubrações teológicas sem sentido, mas, como não contrariavam nenhuma disposição do Código Civil, pudemos registrar a nova fé em cartório, tirar um CNPJ de organização religiosa e, com ele, abrir uma conta bancária na qual fizemos aplicações financeiras isentas de imposto.

A aventura nos custou R$ 418. Publicada a reportagem, iniciamos os procedimentos para fechar a igreja. Haveria várias outras vantagens de que não nos utilizamos, como a imunidade sobre IPTU e IPVA para imóveis e veículos da instituição e contas de luz, água etc. muito mais baratas, já que livres do ICMS.


O Congresso tem na fila outras bondades para as religiões. Minha favorita é o direito de propor ações diretas de inconstitucionalidade ao Supremo Tribunal Federal.

Essa multiplicação de igrejas aliada à multiplicação de benesses explica muito do fracasso do Brasil. Cada grupo de interesse com influência sobre o Congresso, sejam religiosos, empresários, servidores públicos ou qualquer outro, dá um jeitinho de inscrever em lei isenções e vantagens exclusivas. Uma vez fixadas, ninguém mais tira.

O resultado disso é que a conta vai ficando cada vez mais impagável e fica cada vez mais difícil aprovar regras que beneficiariam a todos.

 

2 comentários:

Anônimo disse...

A junção de pastores safados com políticos podres e corruptos (=bolsonaristas) caracteriza uma autêntica quadrilha que rouba em nome de Deus! Além de 100 anos de sigilo, será que conseguirá 100 anos de perdão?

ADEMAR AMANCIO disse...

Aleluia! Glória e Louvado Seja!