Folha de S. Paulo
Escândalos do ex-presidente começam a andar
como andavam escândalos em governos menos blindados
Com o caso da falsificação
do registro de vacina, os escândalos de Jair
Bolsonaro começam a andar como andavam os escândalos em
governos menos blindados. Agora é ver quem vai delatar.
Em outros governos, a coisa começava com
uma denúncia, pela imprensa ou pelas autoridades. A denúncia gerava
desdobramentos políticos, como CPIs, quedas de ministros, inquéritos, delações
premiadas, mobilizações da opinião pública e até pedidos de impeachment.
A turma do Jair chegou ao poder pisando nas
ruínas do sistema político, destroçado pela Lava Jato.
Aprenderam a lição: os partidos tradicionais haviam tolerado democracia demais,
liberdade de imprensa demais, investigações demais, autonomia institucional
demais, transparência demais.
Os bolsonaristas estavam decididos a não repetir o erro: blindaram-se com os militares, fizeram guerra à imprensa e ao STF, aparelharam o Ministério Público e a Polícia Federal, compraram o Congresso com o orçamento secreto. Suas relações suspeitas preferenciais foram com países árabes que só não são menos transparentes que a Coreia do Norte. Tudo isso com um toque de gênio: o apoio de Sergio Moro, a face pública da Lava Jato.
Com essa proteção, os bolsonaristas
conseguiram evitar que as denúncias virassem CPIs, ações da PGR, processos de
impeachment. Assim, o ouro dos pastores no MEC, a fraude na compra de vacinas,
o próprio orçamento secreto, todos logo saíram do noticiário e foram morrer nas
colunas de opinião, inclusive nesta.
Se o mesmo tivesse acontecido com o mensalão, ele
teria sido só uma história sobre fraude nos Correios. Se o mesmo tivesse
acontecido na Lava Jato, ela teria sido só uma história sobre lavagem de dinheiro
usando postos de gasolina.
Agora Jair não é mais presidente, o
golpe de 8 de
janeiro deu errado e muita gente tem passado bolsonarista para
limpar com gestos de independência.
A denúncia de falsificação
de registro de vacinação não está com cara de que vai morrer no
berço. Pelo contrário: já começou a se desdobrar. Entre as provas colhidas pela
polícia está um áudio do ex-major Ailton Barros para o ajudante de ordens de
Bolsonaro, Mauro Cid, em que propôs um golpe de Estado em dezembro de 2022.
Se as coisas voltarem a funcionar como
antes, vamos assistir a uma progressão de prisões, confiscos de celulares,
novas provas, novas denúncias, até que alguém faça delação premiada. Aí acaba
para Bolsonaro.
Por enquanto, os dois principais candidatos
a delator são Mauro Cid e o ex-ministro da Justiça Anderson
Torres. Ambos devem pegar cadeia longa, cadeia dura, se
continuarem protegendo Bolsonaro.
E a questão começa a se impor: por que
fariam esse sacrifício? O golpe deu errado. Jair ficará inelegível. Os
políticos que pretendem sucedê-lo, como Tarcísio de Freitas e Romeu Zema, vão
gastar capital político tentando tirar Anderson Torres ou Mauro Cid da cadeia?
Os militares vão se meter nisso?
É sempre possível, porque tem gente aí que
pode ter rabo preso na história do golpe. Mas os delatores em potencial não
parecem confiantes.
Os bolsonaristas cometeram crimes de
maneira tosca, de maneira mal disfarçada, porque contavam com o golpe. Contavam
que não sobraria Estado de Direito para investigá-los. Semana passada ficou
claro que sobrou mais do que eles esperavam. Veremos se será suficiente.
3 comentários:
Uma vergonha esse cara afirmar que o sistema político foi destroçado pela Lava-jato. Em 2013 ele já estava totalmente desmoralizado, pois já estava claro que se tratava de um conjunto d quadrilhas especializadas em capturar o poder político e desviar recursos públicos. A Lava-jato só tornou transparente como isso era feito. Caras como esse, que abundam em nosso jornalismo fake, só se encarregam de normalizar a ladroagem e passar o pano para esses criminosos.
Eu não vejo erros na Operação Lava Jato!
Até faço alguns reparos à Operação e aos que buscaram carreira política a partir dela, como::
i))achei excessiva a condução coercitiva de Lula; e
ii) Para mim foi uma grande decepção o ex-juiz Sérgio Moro, após fazer um trabalho razoavelmente bom para combater corrupção, eleitoralmente ter ido se juntar a um ator politico sabidamente corrupto e antidemocrático como Jair Bolsonaro.
Mas há muito de elogiável na Operação Lava Jato@
Corrigindo: Mas há muito de elogiável na Operação Lava Jato!
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