O Globo
Suas excelências querem um tipo penal sob
medida para protegê-las
Não bastam as imunidades, as mordomias e os
penduricalhos. Suas excelências agora querem um tipo penal sob medida para
protegê-las.
A Câmara aprovou projeto que cria o crime
de discriminação contra pessoas politicamente expostas. A ideia foi apresentada
por Dani Cunha, filha do deputado cassado Eduardo Cunha.
No texto, ela descreve os políticos como vítimas de “atos de cunho discriminatório”. A pretexto de reparar injustiças, a deputada propõe novos privilégios para a casta que integra.
De acordo com a proposta, o gerente que
negar crédito a um político pode ser punido com até quatro anos de prisão. A
regalia é estendida a parentes e “estreitos colaboradores”, o que beneficiaria
todo tipo de aspone e laranja.
Dani alega que as regras de combate à
lavagem de dinheiro impediriam parlamentares de fazer saques e abrir contas
bancárias. Curiosamente, o pai dela não encontrou dificuldades para virar
correntista na Suíça.
A deputada também propôs aumentar a pena
imposta a quem atentar contra a honra de políticos, inclusive os já condenados
por corrupção. Num surto de lucidez, o relator Cláudio Cajado sumiu com o
artigo na versão final do projeto.
Discípulo de Cunha, o deputado Arthur Lira patrocinou
um arranjo para votar o texto a toque de caixa. A aliança para aprová-lo uniu o
PT de Lula ao PL de Bolsonaro. Só não entraram na corrente siglas pequenas como
Novo e PSOL.
O debate em plenário ofereceu momentos de
puro nonsense. O deputado Julio Lopes, personagem da corte de Sérgio Cabral,
solidarizou-se com um aliado que teria sido impedido de trocar dólares ao
chegar de viagem.
O deputado Elmar
Nascimento, fiel escudeiro de Lira, bradou contra a “discriminação leviana”
que causaria sofrimento a “homens de bem”. Ele fez questão de esclarecer que
também se inclui na categoria.
Num esforço para dissuadir os colegas, o
deputado Chico Alencar citou
palavras de Frei Vicente do Salvador, franciscano que tentou explicar o Brasil
no início do século XVII: “Nenhum homem nesta terra é repúblico, nem zela ou
trata do bem comum, senão cada um do bem particular”.
“Este projeto tem o nome e o sobrenome
desse tipo de visão nefasta”, emendou Chico. Se o Senado não barrar o texto, em
breve teremos a Lei Eduardo Cunha.
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