Folha de S. Paulo
Ajudante de ordens tentou organizar
'golpe-festa surpresa' a Bolsonaro
Na semana passada, a Polícia
Federal encontrou no celular de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens
de Jair
Bolsonaro, planos e conversas sobre como
executar e justificar o golpe de Estado tentado pelo ex-presidente
após a eleição
de 2022.
No celular de Cid havia uma minuta de
golpe, como a encontrada
na casa do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, Anderson
Torres. A minuta declararia estado de sítio e GLO (Garantia da Lei e da
Ordem). Os golpistas tomaram o cuidado de cobrir a assinatura do documento com
uma folha de papel.
Mas esse não era o único plano sendo
discutido. Segundo outros documentos presentes no celular de Cid, também se
pensava em apresentar um documento ao comando das Forças
Armadas relatando "abusos", tanto do Judiciário quanto da
mídia, e pedir um golpe nos
termos daquelas idiotices do Ives Gandra sobre artigo 142 e
"Poder Moderador".
Não sei por que achavam que precisavam disso. Nenhum juiz sério aceitaria as teses de Gandra sem uma arma apontada para sua cabeça. Mas se os bolsonaristas já tivessem colocado a arma na cabeça do juiz, quem precisaria de um argumento jurídico? Qualquer tuíte do Carluxo bastaria, e a tese de Gandra é só marginalmente melhor.
No celular de Cid havia, também, uma
conversa com Jean
Lawand Junior, coronel do Exército Brasileiro. Nas mensagens, Lawand
implora que Cid convença Bolsonaro a dar a ordem para o golpe. Cid diz que Jair
relutava porque não confiava no comando do Exército.
O ajudante de Bolsonaro nunca responde que
o presidente não planeja um golpe. Muito pelo contrário: em vários momentos,
responde aos apelos de Lawand com "Estamos na Luta!" ou "Muita
coisa acontecendo...Passo a passo...".
Lawand contra-argumenta que "se a
cúpula do Exército não está com ele [com Bolsonaro], de [general de] Divisão
pra baixo, está". Conta que um amigo seu ouviu do general de divisão Edson
Skora Rosty que, se Bolsonaro desse a ordem para o golpe, seria obedecido.
Lawand estava, inclusive, pronto para se
insurgir contra superiores que resistissem ao golpe: "Como é que eu vou
aceitar a ordem de um General que não aceitou a ordem do Comandante?",
perguntava-se.
A conversa ajuda a jogar luz na
dimensão-chave do golpe bolsonarista: os movimentos, em geral, opacos, dentro
das Forças Armadas. Havia oficiais legalistas e golpistas, e ainda não sabemos
bem quem era o quê, ou quantos havia de cada lado.
E
todo o resto, as manifestações, as depredações, as postagens em redes
sociais, mesmo os planos terroristas, eram pensados para ajudar os militares
golpistas a recrutar colegas relutantes.
Os advogados de Bolsonaro,
naturalmente, alegam
que seu cliente não tem nada a ver com isso.
Se for verdade, Cid tentou organizar um
golpe por Jair, sem combinar com Jair. Seria uma espécie de golpe-festa
surpresa.
Como seria isso? Imagino que Michelle seria
encarregada de tirar Jair de casa para fazer alguma dessas coisas que todo
casal faz junto, como extravio de joias ou rachadinha. Na volta ao Alvorada, um
Bolsonaro algo perplexo encontraria o palácio às escuras.
Quando acendesse a luz, os chefes das
Forças Armadas bateriam palmas, gritariam "Surpresa!" e Ives Gandra
sairia de dentro do bolo, vestido de Marilyn
Monroe, cantando "Happy golpe, Mr. Presideeeeeeent".
Vai ver era isso mesmo, sei lá eu.
*Doutor em sociologia pela Universidade de
Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".
Um comentário:
🤭🤭🤭
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