O Globo
Em Brasília, todos aguardam a manifestação do
PGR nos inquéritos que pedem que Bolsonaro e 25 militares sejam tornados réus
Todas as atenções de Brasília estão voltadas
para Paulo Gonet, que está na muda. Ninguém sabe se estamos a dias ou semanas
das manifestações do procurador-geral da República nos inquéritos envolvendo
Jair Bolsonaro e aliados, mas não se fala nem se respira outro assunto na
capital federal.
O maior grau de ansiedade pode ser sentido na
oposição, notadamente na ala mais bolsonarista, e nas Forças Armadas. A
expectativa entre os militares é que Gonet faça algum tipo de triagem para
reduzir o número de denunciados de farda ou de pijama em relação aos indiciados
pela Polícia Federal na investigação do golpismo no governo Bolsonaro.
Dos 37 indiciados, 25 são militares, da ativa ou da reserva, de diversas patentes. É muita gente, entendem interlocutores das três Forças. A avaliação colhida em Brasília é que o PGR será mais criterioso que a PF, instituição em que se enxerga alinhamento maior aos desígnios do ministro Alexandre de Moraes, relator deste e de outros inquéritos que aguardam a caneta de Gonet.
A discrição na atuação do substituto de
Augusto Aras à frente do Ministério Público Federal é vista como ponto positivo
pelos ansiosos da capital federal. Embora seja difícil a qualquer um obter uma
pista de quando ele despachará, existe uma crença generalizada de que procurará
verificar a existência de indícios concretos de forma individualizada para
definir quantos dos indiciamentos transformará em denúncia.
Como a PF anunciou que prepara um relatório
adicional ao inquérito da tentativa de golpe, fruto das investigações
decorrentes da fase final das investigações, quando houve buscas e apreensões e
a prisão de figuras como o general Walter Braga Netto, o temor é que Gonet
espere essa peça para só então se pronunciar.
A indefinição pode ser nociva para o
propósito do governo de avançar com a pacificação entre Lula e o estamento
militar. Alguns fatos recentes — como as propostas de ajuste fiscal da Fazenda
e o vídeo da Marinha ironizando as alegações de que militares têm privilégios,
tendo o ministro Fernando Haddad como alvo — causaram mal-estar e certo
congelamento nesses esforços diplomáticos.
A decisão de permanência de José Mucio na
Defesa, a pedido de Lula, tem, entre outros objetivos, o de esfriar um pouco os
ânimos às vésperas de momentos que deverão ser ainda mais tensos, com a
manifestação de Gonet.
— Estamos todos esperando Gonet — resume um
senador oposicionista, fazendo um trocadilho, que deve ter acompanhado o
procurador-geral a vida toda, com a peça “Esperando Godot”, de Samuel Beckett.
A preocupação com a iminência de Bolsonaro e
outros expoentes da direita serem tornados réus no horizonte próximo ajuda a
explicar os inúmeros balões de ensaio lançados dia após dia, com possíveis
atalhos para neutralizar ou anular decisões judiciais contra o ex-presidente,
seus aliados e até os executores do 8 de Janeiro. Todas com pouquíssimas
chances de vingar, diga-se.
Tanta pressão de todos os lados fez Gonet
fazer uma espécie de desabafo na abertura do ano judiciário, ao dizer que está
pronto a agir com “serenidade” e “desassombro” e que, como o Judiciário, o
Ministério Público não se furtará às suas responsabilidades. Como o pano de
fundo de sua fala foi o compromisso com a defesa da democracia, todo mundo
juntou “lé com cré” e reforçou a crença, já disseminada, de que denúncias
virão, só não se sabe ainda quando e voltadas a quantos futuros réus.
Uma denúncia que poupasse alguns militares
poderia até ajudar na recomposição das relações do governo com as Forças
Armadas, mas muita gente, na política e no sistema de Justiça, avalia que
falará mais alto a necessidade de chancelar o que o inquérito apontou, mantendo
a sinergia entre Supremo, PF e PGR.
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