O Globo
O Supremo tornou-se a saída
para o governo e, em consequência, importante peça política na disputa entre os
Poderes da República.
O fato de o governo Lula 3 ser o que mais apelou ao Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2003 para tentar reverter medidas que são de seu interesse direto, como revelou o jornal O Estado de S.Paulo, acrescenta mais um problema para a conturbada atuação do STF nos anos recentes. Com o fortalecimento do Legislativo diante do Executivo, por ter maioria formada por uma oposição variada ao governo petista, e, especialmente, por ter garantido quinhão substancial no orçamento da União por meio das emendas impositivas, o Supremo tornou-se a saída para o governo e, em consequência, importante peça política na disputa entre os Poderes da República.
A politização do Supremo
foi, assim, inevitável, como também a acusação da oposição bolsonarista de que
ele serve ao Executivo. A mesma acusação, aliás, feita pelos petistas quando
Lula foi preso depois de ter sido condenado em segunda instância, como previa
decisão do STF. Se poderia dizer que, acusado pelos dois lados, o Supremo
demonstra independência na polarização. Mas a mudança de posição de diversos
ministros da Corte diante das mesmas questões, documentada por vídeos da época,
sugere, ao contrário, que as decisões variam de acordo com as circunstâncias
políticas, o que leva a uma insegurança jurídica perigosa.
O Supremo ganhou importância
política central no país, mas, por causa da nossa Constituição, não se limita a
ser um tribunal constitucional. Também cuida dos crimes cometidos pelos que têm
foro privilegiado que, como os partidos políticos, são muitos, distorcendo
nossa democracia. Nos debates que se sucedem sobre mudanças constitucionais,
houve um momento em que foi proposto que o Supremo não tratasse mais dos crimes
comuns cometidos por quem tem foro privilegiado, criando um tribunal especial
para esses casos e deixando que o STF se ocupasse apenas das questões
constitucionais.
A proposta foi feita pelo
hoje presidente do Tribunal, Luís Roberto Barroso, considerado um dos maiores
constitucionalistas do país. Na mesma hora, a reação do ministro Gilmar Mendes,
também considerado um dos melhores constitucionalistas brasileiros, foi
contrária, alegando que criaríamos um supertribunal, dando poder descomunal aos
novos juízes. Ficamos, então, com esse poder descomunal depositado no próprio
Supremo, que se torna pivô político fundamental no país, distorcendo o sentido
de balanço de Poderes previsto por Montesquieu.
O peso que o Supremo carrega
foi aumentado com a tentativa de golpe a que o governo Bolsonaro se dedicou
durante todo seu mandato. Coube aos ministros do STF barrar em diversas
oportunidades os avanços antidemocráticos, por isso foram alvos de ameaças pessoais
e, soube-se mais tarde, de tentativas de assassinato. É preciso ser muito
sensato para não transformar ameaças pessoais em institucionais. Mas é
necessário que juízes supremos não se vejam como heróis que podem tudo.
Durante o período da
Operação Lava-Jato, descobriu-se o maior escândalo de corrupção já acontecido
no país, com ramificações por toda a América Latina. Os governos do PT
colaboraram com a maioria dos candidatos de esquerda, dando apoio operacional
com enviados para ajudar na propaganda política, como Duda Mendonça e João
Santana, e apoio empresarial com as empreiteiras brasileiras que se
internacionalizaram e tinham interesses em obras na região, entre elas a
Odebrecht.
Por isso diz-se hoje que o
Brasil exportou corrupção e agora importa impunidade, com o asilo extemporâneo
dado à ex-primeira-dama do Peru Nadine Heredia, condenada por corrupção em seu
país por ter recebido, a pedido de Lula, conforme delação premiada de Marcelo
Odebrecht, US$ 3 milhões para a campanha eleitoral de seu marido, o
ex-presidente Ollanta Humala, preso em seu país. O desmanche da Lava-Jato deu
margem a que todos, acusados e condenados, sem exceção, fossem liberados pela
Justiça brasileira com base em decisão do Supremo. A partir daí, a ética
política que vinha sendo redimida com a punição inédita a políticos e
empresários envolvidos em corrupção, sofreu retrocesso terrível entre nós. A
corrupção voltou a valer a pena no Brasil.
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