segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Denúncias de corrupção trazem reforma política de volta à pauta

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Raquel Ulhôa, de Brasília

Como ocorre sempre que vem à tona um grande escândalo político no país, o discurso em defesa de uma reforma político-eleitoral ressurgiu com a divulgação da imagem do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM), recebendo um maço de dinheiro durante a campanha eleitoral em 2006 e de deputados distritais de sua base aliada recebendo e guardando grandes somas em paletó, meia e cueca.

Da Europa, ao comentar o caso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrou do Congresso Nacional a realização da reforma política. Defendeu uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva para, depois das eleições de 2010, tratar do tema. "Não tem um ser vivo no Brasil que não entenda que tem de ter reforma política", disse.

O ministro da Justiça, Tarso Genro, manifestou expectativa de que a revelação do esquema de corrupção do DF sirva de "impulso" para a aprovação da reforma política. Na sua opinião, se houvesse financiamento público de campanha no país, 80% dos casos de caixa dois não existiriam.

"Toda vez que tem um problema grave, aparece quem aponte a reforma política como solução.
Mas sempre a colocam de forma genérica. É como se fosse uma coisa mágica", diz o deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP).

"Minha avó nos dava melhoral infantil para tudo: de dor de cabeça e febre a dor no pé. A reforma política ficou igual a melhoral infantil", afirma o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), que elaborou o projeto original da lei eleitoral aprovada este ano.

Para Dino, é preciso diferenciar problema de política de problema de polícia. "O caso do governador Arruda é mais um problema de polícia. Todas aquelas condutas são criminosas.

Nesse sentido, o discurso da reforma política serve mais como um véu. O problema real de corrupção não pode ser encoberto por nenhuma reforma política. Corrupção é crime e problema de polícia", diz ele.

Para o deputado, ex-juiz federal, um ponto da reforma política poderia, de fato, contribuir para a redução dos casos de corrupção nas campanhas eleitorais: o financiamento público.

"O sistema atual empurra para a ilegalidade os doadores e os receptores. Hoje o candidato tem que pedir dinheiro, por não ter fonte alguma garantida. Com o financiamento público, se a pessoa não quiser entrar nesse esquema, não pede. O financiamento público dá mais chance para o honesto", diz.

A relação entre o parlamentar e seus doadores é apontada pelos próprios políticos como raiz da maioria dos casos de corrupção. A necessidade de o chefe do Executivo organizar uma base parlamentar que lhe garanta governabilidade é outro foco de desvios de recursos públicos ou repasses irregulares.

Madeira, que está em seu sétimo mandato eletivo consecutivo (três como vereador e quatro como deputado federal), acha que o ponto fundamental de uma reforma da legislação para melhorar o quadro político é a adoção do voto distrital.

"O nó hoje é que o povo não se sente representado pelos parlamentares que elege. Só há uma solução para isso: fazer a distribuição espacial dos votos, ou seja, instituir o voto distrital. É colocar o cabresto no parlamentar pelo distrito pelo qual foi eleito", afirma. Além da aproximação do político com o eleitor, outra solução para "inibir práticas criminosas", segundo Madeira, é o Poder Judiciário tornar-se "mais ágil" para julgar. "As pessoas precisam ter medo da punição", diz.

No Congresso, algumas iniciativas em defesa da reforma política foram retomadas, na esteira do mensalão do DEM. O deputado Raul Jungmann (PPS-PE) apresenta amanhã projeto de decreto legislativo que prevê a convocação de um plebiscito para consultar o eleitorado sobre a votação de uma reforma política na próxima legislatura. O plebiscito seria realizado na data do primeiro turno das eleições gerais de 2010.

O objetivo de Jungmann é que o Congresso seja "obrigado" pela sociedade a votar projetos de reforma política. O deputado está convencido de que os parlamentares jamais farão alterações amplas na Constituição espontaneamente. "Para mudar, é preciso apelar para a vontade popular", afirma. Ele aponta dois grupos que resistem: "Os que não querem mudar nada por interesses privados - é o que chamo de Partido do Business (PB) - e os que têm medo de não ser reeleitos se as regras forem outras".

O projeto de Jungmann não entra no mérito das propostas. Trata apenas de convocar o plebiscito para perguntar ao eleitor se o Congresso "deve alterar a Constituição, aprovando uma reforma política em sua primeira sessão legislativa, que terá início no dia 2 de fevereiro de 2011".
Deputados e senadores terão de votar a reforma, caso o eleitorado, por maioria simples, responda afirmativamente.

O deputado defende uma reforma política que aproxime os eleitores dos seus representantes e crie mecanismos efetivos de combate à corrupção - que, para ele, quase sempre tem origem no sistema de financiamento de campanha. O financiamento público, segundo Jungmann, permitiria maior controle das contas. Defende o voto distrital, que aproxima o eleitor do representado, e a votação em lista, que forçaria o partido a escolher melhor os candidatos.

Para o deputado José Genoino (PT-SP), autor de uma proposta de emenda constitucional que propõe a realização de Constituinte exclusiva para fazer a reforma política e eleitoral, é preciso reduzir os custos das campanhas e dar sentido programático às disputas eleitorais.

Ele atribui às dificuldades de realizar a reforma a "fortes reações individuais que se sobrepõem ao interesse coletivo".

Para que uma emenda constitucional seja aprovada, são necessários dois turnos e votos favoráveis de três quintos de cada Casa. O petista defende financiamento público, fidelidade partidária e votação em lista. "Um Congresso Revisor é o meio eficaz de pavimentar as reformas acima dos interesses individuais e momentâneos dos mandatos", disse.

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