terça-feira, 6 de julho de 2010

Ditador respeita democracia e direitos humanos, diz Lula

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

"Negócios são negócios", afirma Celso Amorim sobre ida à Guiné Equatorial

Os chefes de Estado "concordaram em não fazer ingerências" um no país do outro; foram assinados cinco acordos


Ana Flor
Enviada especial a Malabo (Guiné Equatorial)

Ao lado do ditador Obiang Nguema Mbsogo, há 31 anos no poder na Guiné Equatorial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou acordos e divulgou um comunicado afirmando que os países são comprometidos com a democracia e o respeito aos direitos humanos. Mbsogo é acusado por organizações internacionais de perseguir opositores do regime, fraudar eleições e violar direitos humanos. É também um dos mandatários mais ricos do mundo.

Os dois assinaram cinco acordos nas áreas de defesa, supressão de vistos oficiais e de cooperação bilateral. No comunicado conjunto, ambos os presidentes "concordaram em não fazer ingerências" um no Estado do outro. Após o encontro, o Brasil divulgou nota afirmando que os países "renovaram sua continuada adesão aos princípios da democracia, ao respeito aos direitos humanos".

Lula também chancelou o pedido de Mbsogo para ser admitido na CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). A língua foi incluída entre os idiomas oficiais há pouco tempo, como parte do pleito do ditador.

NEGÓCIOS

Ao chegar ao palácio presidencial -um suntuoso edifício com chão de mármore e lustres de cristal- o ministro Celso Amorim (Relações Exteriores) justificou a visita de Lula afirmando que "o exemplo tem muito mais força do que a pregação moralista". Segundo Amorim, "negócios são negócios" e o Brasil não pode desprezar as possibilidades de trocas comerciais com o país. "Tem empresa com mais de US$ 1 bilhão investidos [na Guiné Equatorial], não é pouca coisa. Não podemos jogar isso fora, nenhum país do mundo joga isso fora, nem Estados Unidos nem Alemanha nem França", afirmou. Amorim demonstrou irritação quando questionado sobre os negócios do Brasil com um país acusado de não respeitar direitos humanos. "Você tomou café da manhã? Olhou de onde vem a manteiga? Da França", disse, dando a entender que, se a Europa não ignora o país, o Brasil não deve fazê-lo. A posição brasileira se choca com a que foi tomada em episódios como o de Honduras, em que mesmo após as eleições o Brasil não reconhece o novo governo. Uma coletiva de imprensa marcada para depois da assinatura de atos foi cancelada sem explicações. Até os ministros brasileiros foram surpreendidos pela decisão.

O presidente seguiu no fim do dia para o Quênia, onde inicia sua primeira viagem ao leste da África. Tentará ativar o comércio com o país mais industrializado da região. Atualmente, o comércio entre os dois países é pequeno até se comparado com outros países do continente: US$ 91 milhões, sendo que US$ 89,4 milhões são exportações brasileiras -90% de produtos industrializados.

A convite do Palácio do Planalto, a repórter Ana Flor viajou de Cabo Verde à Guiné Equatorial e ao Quênia numa aeronave da Força Aérea Brasileira.

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