sexta-feira, 1 de maio de 2015

Marta Suplicy - Sonhos

- Folha de S. Paulo

Vi uma propaganda na TV: "Todo mundo tem sonhos. Depende de cada um o que se faz com eles". A propaganda era de automóvel. Os sonhos variam. Vão do consumismo utilitário, podem passar pela casa própria, por cursar uma faculdade, pelo casamento deste ou daquele jeito. Passam também por mudar um país, o mundo, ajudar os outros, agradar aos pais, ser famoso... Tem de tudo.

Podem persistir uma vida inteira, ser largados no meio do caminho, ser reajustados ou trocados. Quem não tem sonho não tem projeto. Vive ao largo da própria vida. A diferença está na dificuldade da conquista do sonho e a determinação em conquistá-lo.

Saindo do PT lembrei de Erundina e Marina, que me precederam. Quais foram seus sonhos e o que temos de parecidas? A determinação, a coragem e coerência no processo é uma certeza que tenho sobre nós três.

O que também nos une é que não abaixamos a cabeça ao partido, nos rebelamos com acordos espúrios ou injustos... E fomos buscar nossos caminhos levando os mesmos princípios e, por que não dizer, sonhos que nos encontraram no início da jornada.

Os meus sonhos de infância e juventude eram bem pueris: ajudar os pobres. As cores tinham o colorido da culpabilidade assimilada no colégio de freiras. E eu queria fortemente fazer o bem e contribuir para melhorar o mundo.

Esta ideia, ainda vaga, se confirmou quando escolhi estudar psicologia, "para ajudar as pessoas". E se consolidou quando tomei a decisão de aceitar fazer na TV um programa sobre comportamento sexual, para escândalo do meu pai, mas com apoio familiar.

O passo seguinte foi uma forte atração por um partido novo, que defendia a ética na política, a justiça social, gays e mulheres. Tudo que era meu sonho para um país e um mundo mais justo!

Fui ao encontro da fundação do partido no colégio Sion e meses depois me filiei. Militei até esta semana dando o melhor de mim para construção do sonho deste "mundo melhor", que desmoronou paulatinamente nos últimos anos. É difícil aceitar o que já se percebe pois o investimento de paixão pelo sonho, companheirismo, realizações, sem esquecer o mecanismo de negação, são muito fortes.

Chega um momento que não dá mais e se arruma coragem de fazer o que se percebe como caminho da coerência.

Assim, em busca da realização de meus sonhos, fui deputada e prefeita e hoje sou senadora. Fiz coisas de que me orgulho, mas também cometi erros. Hoje, mais madura, tenho a humildade de reconhecer isso. O importante é que procurei aprender com eles. Nunca deixei de sonhar e para o futuro recordo o poeta Antonio Machado ao dizer que "o caminho se faz ao caminhar".

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Marta Suplicy é senadora (Sem partido)

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