Vinicius Sassine e Martha Beck – O Globo
• BC transfere responsabilidade de parecer para Fazenda Nacional
BRASÍLIA - O Banco Central, o Ministério da Fazenda e a Advocacia-Geral da União estão fazendo um jogo de empurra para se eximir da necessidade de dar parecer formal sobre a existência ou não de infração à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) na prática das chamadas "pedaladas fiscais". Diante do risco de o Tribunal de Contas da União (TCU) rejeitar as contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff, ninguém quer ser o responsável por botar mais lenha na fogueira.
A Procuradoria-Geral do Banco Central foi instada a se manifestar sobre o assunto, mas transferiu a responsabilidade de um parecer sobre as pedaladas e a LRF à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, como mostra documento de agosto de 2014. O órgão da Fazenda, por sua vez, diz que o assunto é da AGU, que afirma se tratar de um assunto sigiloso.
Os ministros do TCU, em sessão no último dia 17, decidiram dar um prazo de 30 dias para a presidente Dilma se explicar sobre 13 indícios de irregularidades nas contas de 2014, entre eles as "pedaladas". Existe um risco de aprovação de parecer pela rejeição das contas, o que não ocorre desde 1937. O julgamento definitivo será do Congresso Nacional, com base no parecer do TCU.
As "pedaladas" consistiram num atraso nos repasses de recursos do Tesouro Nacional para os bancos públicos, constatados em auditoria do TCU. A prática ocorria desde 2009, segundo o tribunal. A demora obrigou os bancos oficiais a pagar despesas da União (como seguro-desemprego, benefícios do Bolsa Família e abono salarial) com recursos próprios. Para os ministros do TCU, isso caracterizou descumprimento à LRF, pois configura-se empréstimo de instituição controlada (no caso, os bancos) ao controlador (a União), o que é vedado pela lei.
No governo, no entanto, as áreas responsáveis por essa avaliação vêm fugindo de produzir um parecer formal sobre o assunto. Em agosto de 2014, a Procuradoria do BC foi instada a se manifestar e produziu um parecer. O órgão concluiu o parecer dizendo não ter atribuição para analisar a LRF, e que essa era uma competência do Ministério da Fazenda.
"A análise dessa questão, entretanto, extrapola as atribuições legais do Banco Central, pois não se confunde seu papel de entidade responsável pela manutenção da estabilidade financeira, na condição de regulador e supervisor do sistema financeiro", afirma um trecho do parecer da Procuradoria. O documento foi encaminhado à Procuradoria da Fazenda Nacional, que atua no âmbito do Ministério da Fazenda. A instituição, por sua vez, remeteu a responsabilidade à Advocacia Geral da União (AGU).
Procurado pelo GLOBO, o Ministério da Fazenda limitou-se a dizer que "o assunto está sendo tratado pela AGU". A AGU preferiu não se posicionar. O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, tem dito publicamente que não houve desrespeito à LRF nas operações, pois elas não seriam empréstimos e sim contratos de prestação de serviços nos quais quando há atrasos de uma parte, a outra tem que ser ressarcida com correção. No entanto, a AGU informou ao GLOBO que "a política da PGFN é no sentido de não se manifestar em assuntos que estão em sigilo, como a investigação que ora o TCU realiza em relação às contas do governo".
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