- O Globo
“Não se trata mais de achar ou querer o fico ( de Dilma), mas de saber se ele é possível”
Fernanda Torres, atriz e escritora
Em menos de cinco dias, o governo surpreendeu o distinto público duas vezes. A primeira ao anunciar a disposição de remeter ao Congresso a proposta de ressuscitar a CPMF, conhecida como imposto do cheque. A segunda ao desistir de fazê- lo dada à recepção negativa à proposta. O governo mais impopular da História queria valer- se do imposto mais impopular da História. Coisa de gênio!
E TUDO PORQUE há um buraco de R$ 80 bilhões a R$ 100 bilhões no Orçamento da União para 2016. Entre eliminar despesas ou arrecadar mais via aumento de impostos ou a criação de um novo imposto, Dilma e sua turma se renderam à solução mais confortável. Não ocorreu a ninguém disparar algumas dezenas de telefonemas para empresários e políticos perguntando a opinião deles a respeito.
SE ISSO TIVESSE SIDO FEITO, o governo teria se poupado de mais um desgaste. De resto, não reforçaria a sensação de que se comporta como uma barata tonta. Barata tonta é Dilma, não a sua equipe. No regime presidencialista brasileiro, o poder do chefe do governo é incontrastável. E a depender do temperamento dele, pode-se tornar quase absoluto para efeito interno.
DE JANEIRO ÚLTIMO para cá, alardeou-se a ideia de que Dilma delegara poderes ao vice-presidente Michel Temer e ao ministro da Fazenda Joaquim Levy. Os dois seriam seus avalistas em suas respectivas áreas de atuação – a política e a economia. Temer chegou a circular empavonado como o coordenador político do governo, oferecendo cargos e dinheiro para garantir o apoio de deputados federais e senadores. Balela!
O PODER CONTINUOU concentrado nas mãos de Dilma. E bastou que ela duvidasse da lealdade de Temer para acabar com sua rotina glamorosa. Nem se deu ao trabalho de chamá-lo para agradecer pelos serviços prestados. Dilma não agradece, só repreende. Quando menos esperava, Temer percebeu que Dilma o deixara com o pincel na mão. Não foi a primeira vez. Não seria a última.
PARA NÃO PARECER que havia sido dispensado pela presidente, Temer concordou em encenar a farsa de que passaria a cuidar da macro politica, essa, sim, uma tarefa que Dilma jamais repassaria a quem quer que fosse. Não durou muito. Soube pela imprensa da possível ressurreição da CPMF. Não acreditou. Soube também pela imprensa do recuo do governo. Escaldado, acreditou.
SE DEPENDESSE de Levy, o ajuste fiscal teria sido bem maior do que de fato foi. Ele quis atacar o desequilíbrio estrutural que faz com que as despesas obrigatórias do governo cresçam num ritmo mais forte do que a economia. Dilma impediu. Foi Nelson Barbosa, Ministro do Planejamento, o pai do resgate da CPMF. Levy ficou na dele. Quando decidiu defender a CPMF, era tarde. Viu-se pendurado no pincel.
A ESPERANÇA QUE, em 2002, venceu o medo, está perdendo para o desencanto pelo escandaloso placar de 7 x 1. O único gol dos mais de 12 anos de hegemonia do PT foi a redução da miséria. Os sete gols que tomou até aqui: economia em baixa; corrupção em alta; base de apoio no Congresso esfacelada; corte de benefícios sociais; péssimos índices de Educação e Saúde; violência urbana crescente; e a criação de uma geração de desiludidos com a política.
DILMA VOLTOU a repetir na semana passada que não haverá retrocesso nas conquistas obtidas pelos brasileiros desde que Lula chegou ao poder pela primeira vez. Para variar, mentiu. Já houve.
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