- O Globo
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tem recomendado paciência ao PSDB, considerando que a crise ainda se agravará, criando as condições políticas para que o processo tenha um fim, seja pelo impeachment ou mesmo pela renúncia da presidente, sem que possa ser acusado de “golpe” pelos petistas.
Ele acredita que as investigações da Lava-Jato, juntamente com as do TCU e do TSE, demonstrarão que o governo petista está baseado em ilegalidades que tiram a legitimidade do mandato conseguido nas urnas por artifícios nada republicanos.
A presidente Dilma, ao dizer ontem que usar a crise para tirá-la do governo será uma versão moderna dos golpes de Estado, cometeu um erro de estratégia política que insiste em cometer: ela mesma traz para o debate da sociedade a validade ou não do impeachment, admitindo que ele está em avaliação no Congresso.
Mas ela não vai ser retirada do governo devido à crise econômica, que, realmente, não pode ser motivo para mudança de governo no presidencialismo, a não ser que tivéssemos por aqui o instrumento do “recall”, que permite ao eleitorado punir o mau governante com a interrupção de seu mandato, mandando-o para casa antes do tempo.
Se Dilma for impedida de continuar governando, o será pelos delitos que cometeu em seu 1º governo e na campanha. Contra ela há o tempo, que encurta a cada erro estratégico que comete — como o Orçamento deficitário enviado ao Congresso ou mesmo a insistência na aprovação de uma nova CPMF — e que pode trazer sempre revelações nas investigações da Lava-Jato.
A crise política, que inviabiliza a solução da econômica, apenas evidencia que ela já não tem capacidade de governar. Se estivéssemos no parlamentarismo, Dilma já teria sido obrigada a renunciar e chamar novas eleições, mesmo que nenhum crime contra ela fosse provado.
Dilma insiste em tratar a crise em que meteu o país como um fenômeno externo, que não depende de seu controle para acontecer. É exatamente essa postura cínica que impede que consiga um apoio da sociedade para aprovar no Congresso medidas amargas.
Não há disposição da sociedade de ajudar o governo a sair das cordas, pois todos já sabem que foi o próprio governo que nos meteu na enrascada, na maioria das vezes para garantir a reeleição da própria Dilma. Ações em benefício próprio — sejam políticas, como as que a ajudaram a vencer a eleição, ou financeiras, que reverteram em benefícios pessoais para membros do PT e da própria Dilma, pois sua campanha foi financiada com dinheiro escuso desviado da Petrobras, segundo diversas delações premiadas — provocam agora medidas de arrocho que pedem o sacrifício da sociedade.
Como ter ânimo para ajudar este governo? Como acreditar que Dilma saberá governar mesmo que supere a crise atual? Quais os compromissos que o PT e a presidente assumem diante da população? É essa desconfiança generalizada que impede Dilma de refazer sua base aliada e que, em consequência, torna ingovernável o país por esse grupo que tomou de assalto o governo e agora pede ajuda, sem nem mesmo admitir os próprios erros.
O processo de impeachment será demorado e cuidadoso, como requer uma democracia amadurecida como a brasileira. O próprio processo no TCU já demorou mais do que o prazo legal permite, tudo para que o governo não possa alegar que não teve condições de se defender. A base da defesa da Advocacia Geral da União (AGU) é o argumento de que “(...) a reprovação das contas de 2014 violaria o princípio da ‘segurança jurídica’, uma vez que o TCU não condenou as ‘pedaladas’ e a liberação dos créditos orçamentários em outros anos”.
A fundamentação, de pronto, admite a ocorrência das “pedaladas”, avalizando eventual parecer do TCU no sentido da efetiva existência de tais ilícitos. A justificativa pertinente à “segurança jurídica” é bisonha, na avaliação de especialistas.
O fato de o TCU não ter condenado aquelas práticas “em outros anos”, sabe-se lá o porquê, não significa sinal verde para cometimento dessas ilicitudes. O Direito não pode retirar suas normas a pretexto de que foram violadas e que os responsáveis não foram punidos.
Dilma precisa, antes de acusar os adversários de tentar dar um golpe, demonstrar que consegue governar. Sua incapacitação será consequência das ilicitudes cometidas em seu 1º governo e na campanha eleitoral.
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