segunda-feira, 18 de julho de 2016

Simples e profunda – Editorial / O Globo

• Corrupção política há em todo o mundo, mas no Brasil mecanismos legais, mas deletérios, a impulsionam

A eleição de um novo presidente da Câmara, semana passada, em substituição ao afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), abre perspectivas positivas para o Legislativo levar adiante uma reforma política eficaz. Esta é uma demanda que se arrasta no sistema representativo do Brasil por anos, jamais enfrentada com a necessária seriedade pelos parlamentares. Eleito o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), a Casa, pelas palavras dele, tem a oportunidade de enfim se reencontrar com a agenda política do país.

Antes, o presidente interino, Michel Temer, já havia sinalizado, de um Executivo que busca implementar necessárias mudanças no país (política, econômica e fiscal) para um Congresso que ainda reluta em abandonar o crônico paradigma do excesso de fisiologismo, quais os pontos mais imediatos de uma reforma política simples, como deve ser, mas não menos profunda: a adoção de uma cláusula de desempenho para os partidos e a proibição de coligações nas eleições proporcionais.

A oportuna particularidade de, no espaço de poucos dias, os chefes do Executivo e de uma das Casas do Legislativo terem mostrado sintonia num tema vital para o futuro político do país não pode ser desperdiçada. A degradação do sistema de representação do país passa não só pelos gargalos mais visíveis, expressos em mecanismos que perpetuam o jogo do toma lá dá cá. Nela há também um inequívoco componente cultural, na forma de parlamentares que disputam eleições para, ao anteparo de seus mandatos, obter dividendos materiais. Neste particular, esta não é uma exclusividade do Brasil. Corrupção política, em maior ou menor grau, existe em todo o mundo. O que lhe dá no país a dimensão de “malfeitos” levados ao extremo são os dispositivos — legais, mas deletérios — que, na prática, a “institucionalizam”.


A proliferação própria de um sistema como o brasileiro, que não impõe critérios realistas para o funcionamento das legendas, é uma grande mola a impulsionar práticas deletérias como o fisiologismo e o clientelismo, as faces mais visíveis da corrupção política. E, ainda que se abstraia esse aspecto — num esforço de apequenamento do papel da política na vida do país —, é impossível que a pulverização represente, sem redundância, o arco de opiniões da sociedade e que negociações políticas envolvendo 28 partidos sejam produtivas. No caso das coligações, o efeito mais nocivo está no fato de o eleitor votar num candidato e eleger outro, não raro sem qualquer afinidade ideológica.

O correto, na reforma sugerida por Temer e, espera-se, a ser abraçada por Maia, seria criar uma barreira pela qual a legenda se veria obrigada a atrair 5% dos votos nacionais, sendo 2% em pelo menos nove estados, para ter assento na Câmara. Em 2006, uma cláusula de desempenho foi posta nestes termos para o STF apreciar. Na época, o Supremo a barrou — equívoco que agora, por certo, em face do novo perfil da Corte, não se repetiria. Mas que hoje o Legislativo pode, e deve, vir a desfazer no Congresso, pela sanidade do futuro político do país.

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