terça-feira, 6 de setembro de 2016

Justiça bloqueia R$ 8 bi de suspeitos de desvios

• Funcionários de Caixa, BB, Correios e Petrobras são prejudicados

Dirigentes e empresários estão afastados dos cargos atuais

A PF investiga desvios bilionários nos fundos Funcef (Caixa), Petros (Petrobras), Previ (BB) e Postalis (Correios), que têm 1,3 milhão de trabalhadores e aposentados. Dois diretores da Funcef foram presos. Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS condenado na Lava-Jato, e os empresários Wesley e Joesley Batista, do grupo da JBS, além de ex-dirigentes de fundos, estão entre os investigados, que tiveram R$ 8 bilhões bloqueados.

Fraude em fundos de pensão

• Operação da PF prende diretores e ex-presidentes da Funcef e bloqueia R$ 8 bi em bens

Jailton Carvalho, Gabriela Valente, de Danielle Nogueira e Rrennan Setti - O Globo


-BRASÍLIA E RIO- A Polícia Federal (PF) prendeu dois atuais diretores e dois ex-presidentes da Funcef, fundo de pensão dos funcionários da Caixa. e levou de forma coercitiva para depor, ontem, os empresários Wesley Batista, um dos donos do Grupo J&F Investimentos; Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS; e mais 26 grandes empresários e executivos. No total, são 40 pessoas investigadas na chamada Operação Greenfield, que investiga fraudes em Funcef, Previ, Petros e Postalis, os quatro maiores fundos de pensão do país. Juntos, eles reúnem mais de 1,3 milhão de beneficiários. Joesley Batista, irmão de Wesley, também foi alvo de um mandado de condução coercitiva. A ordem só não foi cumprida porque ele estaria no exterior. Foram bloqueados, por ordem da Justiça, bens no valor de R$ 8 bilhões, montante recorde.

Pelos cálculos do Ministério Público Federal (MPF) e da Polícia Federal, só em dez casos analisados as fraudes seriam de R$ 8 bilhões.

As ordens de condução coercitiva foram expedidas pelo juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília. O juiz também determinou o afastamento de Joesley, Wesley, Pinheiro e outros executivos investigados do comando de empresas e de atuação no mercado financeiro. E ordenou que os dirigentes e ex-dirigentes dos fundos investigados sejam afastados de suas funções e se abstenham de frequentar os prédios públicos onde atuavam. O juiz também estabeleceu medidas cautelares alternativas para todos os 40 investigados. Suspendeu o exercício de qualquer atividade no mercado financeiro, em direção de empresa ou em função pública, direção ou gerência e até em conselhos em entidades de previdência complementar. Seus passaportes deveriam ter sido apreendidos, segundo o juiz.

Na Funcef, foram presos os diretores Carlos Augusto Borges (Participação Societária), Maurício Marcellini Pereira (Investimentos) e os ex-presidentes Carlos Alberto Caser e Guilherme Lacerda. Policiais fizeram apreenderam documentos em 106 endereços de pessoas e empresas investigadas.

Léo Pinheiro, que também é investigado na Operação Lava-Jato, que estava em prisão domiciliar, também foi alvo de dois mandados, um de prisão e outro de condução coercitiva. Esta última foi expedida pelo Vallisney, em Brasília, devido às suspeitas de envolvimento com fraudes na Funcef. A ordem de prisão veio do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, devido ao surgimento de novas suspeitas contra ele nas investigações sobre fraudes na Petrobras.

Nome vem de modalidade de investimento
A primeira fase da Operação Greenfield se concentrou em supostas fraudes da Funcef, embora as investigações tenham atingido transações relacionadas a Petros, Postalis e Previ. Mas outras etapas já estão em andamento para esmiuçar supostas negociatas nesses três fundos. Investigadores não descartam a possibilidade de as investigações chegarem à seara política, já que dirigentes dos fundos suspeitos de envolvimento nas fraudes têm fortes laços com grupos políticos.

O nome da operação, de acordo com a PF, refere-se a investimentos que envolvem projetos iniciantes, ainda no papel, como se diz no jargão dos negócios.

Ao todo, foram expedidos 127 mandados de prisão temporária, condução coercitiva e buscas em escritórios particulares e prédios públicos em Distrito Federal, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Amazonas, sendo mobilizados 560 policiais. A operação contou ainda com a participação de fiscais da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da Superintendência Nacional da Previdência.

A PF informou terem sido apreendidos cerca de R$ 350 mil, US$ 100 mil e € 50 mil, além de obras de arte, joias e veículos de luxo. Estes, porém, foram entregues aos donos, que ficam como depositários fiéis dos bens e não podem dispor dos veículos sem autorização judicial.

Entre os alvos de mandado de condução coercitiva e de buscas está o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto. Policiais apreenderam documentos na casa de Vaccari em São Paulo, mas não precisaram levá-lo para depor: ele está preso em Curitiba, no âmbito da Operação Lava-Jato. Em nota, o PT criticou a ação contra Vaccari.

Boa parte das fraudes estava relacionada a aquisições de cotas do Fundo de Investimentos em Participações (FIP) pelos fundos de pensão. De acordo com as investigações, dirigentes dos fundos endossavam avaliações superfaturadas dos ativos de determinadas empresas e, com isso, aumentavam de forma artificial os valores a serem aplicados nas transações. Os negócios, quase sempre, resultavam em pesados prejuízos para os fundos — e as empresas privadas na outra ponta do negócio lucravam.

Joesley e Wesley Batista, do J&F, são investigados por suspeitas relativas à fusão das empresas Florestal e Eldorado. Segundo os investigadores, eles teriam se beneficiado do “aporte de capital de Funcef e Petros, com prejuízo financeiro aos referidos fundos de pensão”. Léo Pinheiro é suspeito de se beneficiar dos investimentos de Funcef, Petros e Previ na Invepar, controlada pela OAS.

As transações da OAS com os fundos teriam sido avalizadas de forma indevida pela consultoria Delloite Touche Tohmatsu, também investigada. Na relação estão ainda Engevix e Sete Brasil. À tarde, a Funcef afirmou, em nota, que tem “rigorosos padrões éticos em todos os investimentos e na relação com seus participantes e assistidos”. A entidade informou que está à disposição das autoridades e confirmou a prisão de dois diretores, mas disse que só comentaria o assunto após falar com os advogados dos investigados.

A Invepar, que administra o Metrô Rio e a Linha Amarela, além de integrar o consórcio que opera o Aeroporto de Guarulhos, confirmou que agentes da PF estiveram em sua sede, no Rio, e na de sua subsidiária, a GRUPar (que opera o aeroporto paulista), em São Paulo, onde foram cumpridos mandados de busca e apreensão.

A J&;F informou que sua controlada, a Eldorado Celulose, recebeu em 2009, por meio de um FIP, R$ 550 milhões de Funcef e Petros, e que esses recursos, atualizados, montavam R$ 3 bilhões em dezembro de 2015, segundo laudo feito pela Deloitte. OAS, Engevix e Sete Brasil não quiseram comentar. Já a Deloitte informou estar cooperando com a PF.

Outra empresa onde também houve busca de documentos, a Rio Bravo Investimentos, cuja sede fica no Rio, disse que “tem poucas relações com os fundos de pensão objeto da investigação” e que “fará tudo a seu alcance para apoiar as ações das autoridades”.

Entidades ressaltam colaboração com PF
A PF esteve ainda nas sedes da BEM Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários e da gestora de recursos Bradesco Asset Management, ambas do grupo Bradesco. Em nota, as duas disseram que “seguem estritamente o regulamento dos fundos sob sua gestão e administração e as regras definidas pelos reguladores”.

A Previ disse em nota que toda a documentação requerida foi disponibilizada e afirmou ter “um modelo de governança maduro e transparente”. A Petros frisou que a decisão judicial sobre a busca e apreensão refere-se a investimentos cujo processo de decisão ocorreu até 2011. E ressaltou que nenhum dirigente da atual gestão ou empregado do fundo está envolvido — atual diretoria assumiu em março de 2015.

A Funcef reiterou ter “rigorosos padrões éticos em todos os investimentos”. Já o Postalis informou estar à disposição das autoridades e disse ter interesse em que “os fatos investigados sejam esclarecidos com celeridade”. A Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão (Anapar) ressaltou que “nem todo resultado negativo de investimento é fruto de desvios, de má-fé”.

Colaborou Ramona Ordoñez

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