quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Presidente, Temer terá pouca margem para errar – Editorial / Valor Econômico

O fim do mandato de Dilma Rousseff após votação do impeachment no Senado coincidiu com a divulgação da sexta queda consecutiva do Produto Interno Bruto, de 0,6%, uma amostra da herança que deixa para o novo presidente e dos desafios que Michel Temer terá pela frente - a recuperação da economia é apenas um deles. Sinal de fragilidade, até mesmo a batalha vencida para desalojar Dilma foi marcada por atritos que podem causar avarias políticas na base do governo. O impedimento de Dilma por crime de responsabilidade, mas com a manutenção dos direitos políticos, óbvia contradição, foi vista por PSDB, DEM e PSD como um acordo por trás dos panos entre PMDB e PT, que "não dá segurança sobre a parceria no futuro", como disse o senador tucano Aécio Neves.


A ascensão de Temer, três décadas depois que o PMDB subiu a rampa do Planalto com José Sarney, põe fim a 13 anos e meio de domínio petista. Herda de Dilma Rousseff o maior déficit público da história recente do país, a maior recessão em quase um século e a maior dispersão partidária no Congresso na República. O PMDB, que presidiu, mantém-se como maior força política nos municípios e na Câmara dos Deputados, embora tenha encolhido quase à metade na última década.

A lua de mel com seu governo praticamente acabou, após pouco mais de 100 dias de interinidade. A aprovação da proposta de emenda constitucional que limita a evolução dos gastos à da inflação do ano anterior, em primeiro lugar, e a reforma da Previdência que lhe dará viabilidade, em segundo, testarão decisivamente a força do presidente Michel Temer nos próximos meses. Derrotas importantes nessas duas frentes ditarão o fim precoce de seu mandato, tornando-o refém de uma base governista de múltiplos interesses. A mesma que apoiou Dilma e a abandonou.

Como a delicada situação econômica exige medidas imediatas, insucessos de Temer colocarão um enorme ponto de interrogação sobre a solvência da dívida pública, sobre sua capacidade de controlar a inflação e sobre a dinâmica da recuperação do emprego e da produção.

Na economia, o programa de Temer é o oposto do de Dilma. As promessas são de menos intervenção na economia, mais concessões e privatizações, inflação e contas públicas sob controle. Para executá-las, a ideia é resgatar ao longo do tempo o tripé de câmbio flutuante, resultados primários positivos, inflação dentro da meta e realizar as reformas trabalhista e da Previdência.

Líder de um partido fisiológico, dominado por caciques regionais, Temer tem a seu favor as expectativas positivas de empresários e investidores e o currículo de hábil negociador político. A partir de agora, definitivamente na cadeira de presidente, terá de usá-lo para colocar limites ao que pode ou não ser concedido para atingir os fins propostos por seu programa liberal.

Como interino, sua experiência política esteve a serviço da conciliação, da aceitação de medidas que pioram a situação fiscal, como os aumentos generalizados ao funcionalismo e as concessões aos Estados. Os recuos nessa fase seriam artimanhas para obter o maior número possível de adeptos para derrubar legalmente Dilma Rousseff. Livre desse obstáculo, terá de dizer o que quer e se esforçar para consegui-lo. No caminho, enfrentará o imponderável, como a Operação Lava-Jato, que ainda gesta delações importantes com efeitos multipartidários.

Dilma e o PT saem machucados do poder, no que pode ou não ser o ocaso do partido. A legenda deve levar uma surra nas eleições municipais, que disputa com bem menos intensidade, e seu candidato para 2018, Luiz Inácio Lula da Silva, foi indiciado e tem futuro político incerto. O que é certo é que, como disse Dilma após o impeachment, fará oposição "firme, incansável e enérgica" ao governo Temer. Se será ou não capaz de arrastar atrás de si os movimentos sociais, depende do grau de sucesso ou fracasso do governo em consertar a economia ou de ao menos devolvê-la à rota do crescimento, ainda que modesto.

Desafios maiores serão manter unida a base política oportunista, sem concessões que desfigurem as políticas de governo, e driblar as disputas internas que podem surgir de possíveis candidatos à sucessão, como os ministros José Serra e Henrique Meirelles. PSDB e DEM se lançarão à conquista da Presidência, e desembarcarão do governo e para o governo interessa que o desembarque seja pacífico. Para governar, Temer precisa se sair bem nessas costuras políticas.

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