domingo, 5 de março de 2017

Congresso teme ‘cataclismo’ com delações

Pelo lado do governo, preocupação é salvar reformas previdenciária e trabalhista do turbilhão político

Eduardo Bresciani e Jailton de Carvalho | O Globo

BRASÍLIA - A expectativa por uma nova lista com dezenas de investigados de diversos partidos, desta vez com base nas delações da Odebrecht, faz parlamentares preverem um “cataclismo” no cenário político para os próximos meses. Aliados do governo Michel Temer trabalham, agora, para tentar salvar as reformas previdenciária e trabalhista do turbilhão de acusações. A Procuradoria-Geral da República deve encaminhar ao Supremo Tribunal Federal, nesta semana, uma lista com mais de 30 pedidos de abertura de inquérito contra deputados, senadores e ministros suspeitos de receberem propina da Odebrecht. Na segunda lista de Janot estão ainda governadores e pelo menos um ministro do Tribunal de Contas da União.

Os pedidos têm como base depoimentos, emails, mensagens eletrônicas e outras provas fornecidas por 78 executivos da maior empreiteira do país que, no final do ano passado, fecharam acordo de delação premiada com a equipe de Rodrigo Janot. As acusações atingem deputados, senadores e líderes políticos de todos os grandes partidos, inclusive nomes cotados para as próximas eleições presidenciais.

Para o líder do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP), houve uma criminalização do modelo de financiamento de campanhas e isso levará ao questionamento de todo o sistema político.

— Nós vamos ter uma situação complicada. Como houve a criminalização do financiamento privado, essa divulgação vai ser um verdadeiro cataclismo no mundo político. A grande maioria dos políticos vai aparecer e quanto mais investigar e se verificar outros ramos, mais vai aparecer. O que está se demonstrando é que o sistema de financiamento de campanha era generalizado, não era só do PT. Todos participaram desse sistema. Criminalizar da forma como fizeram com o PT é um absurdo, e agora está demonstrado que todos estão na mesma situação — afirma o petista.

CONTAMINAÇÃO DA AGENDA ECONÔMICA
A contaminação da agenda econômica por uma crise política é o maior temor do governo Temer. Líderes aliados já ensaiam um discurso de que a continuidade das investigações não pode paralisar os debates no Congresso.

— A nossa intenção é que a agenda econômica tenha prioridade para o Brasil. É preciso ter maturidade de toda a sociedade para entender que as reformas são uma agenda para o país, para a sociedade, para reencontrar o rumo do desenvolvimento, resgatar empregos e fazer o país voltar a crescer. A agenda política caminhará em paralelo, com grau de importância extrema, mas a expectativa é que não contamine. O Brasil não pode parar para cuidar da agenda política, tem de caminhar em paralelo — afirma o líder do DEM, Efraim Filho (PB).

— Você tem instrumentos para fazer a investigação. Se tiver denúncia contra deputados, tem a Comissão de Ética e o Judiciário para apurar, e a Polícia Federal também. Isso não tem nada a ver com o que está sendo votado. Essas reformas não são do presidente Temer, são uma questão de Estado. O Brasil precisa das reformas independentemente das apurações desses casos, que devem ser realizadas — defende o líder do PSDB, Ricardo Tripoli (SP).

O ambiente no Congresso pode ficar ainda mais conturbado pelo fato de os presidentes da Câmara e do Senado terem sido citados no caso. Tanto Rodrigo Maia (DEM-RJ) quanto Eunício Oliveira (PMDB-CE) foram mencionados pelo exdiretor da Odebrecht Cláudio Melo Filho como receptores de recursos em troca da atuação em favor da empreiteira no Congresso. Não há informação sobre uma possível investigação deles pela PGR.

Maia nega ter praticado qualquer irregularidade e defende o fim do sigilo das delações.

— O fim do sigilo é uma decisão do ministro. Ele sabe se deve ou não liberar. Eu sempre defendi isso. No meu caso, o tempo vai provar que aquela história não existe — afirmou o presidente da Câmara.

O deputado Silvio Costa (PTdoB-PE) afirma que os colegas estão preocupados com as consequências da investigação:

— O que sinto no Congresso é muita preocupação mesmo. Não de minha parte. Tenho horror a paladino da ética, mas eu tenho sentido no Congresso uma preocupação grande por uma quantidade razoável de parlamentares de todos os partidos.

O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), vice-líder do partido, compara a demora pela revelação da lista dos envolvidos a uma novela.

— A Lava-Jato precisa andar. Isso vai ser mais um passo. A novela da Odebrecht já está comprida demais. A Lava-Jato é um processo sofrido e necessário para o país avançar, assim como as reformas que o presidente Michel Temer está fazendo, e o Congresso vai continuar, mesmo dentro da crise — afirma o peemedebista.

JANOT PEDIRÁ QUEBRA DE SIGILOS
Eunício, por meio de sua assessoria, reafirmou que nunca autorizou ninguém a negociar recursos em seu nome e que todos os recursos recebidos em suas campanhas eleitorais foram declarados à Justiça Eleitoral.

Para evitar eventuais críticas sobre “seletividade”, Janot decidiu, desde o ano passado, que pedirá a quebra do sigilo das investigações. Só deverão permanecer em segredo informações consideradas essenciais para futuras medidas de interesse dos inquéritos.

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