- Valor Econômico
Momento é de exibicionismo e falsidade
É absolutamente normal a pré-candidata Marina Silva (Rede) encontrar-se com o PSDB mesmo que jamais pense fazer uma aliança com os tucanos. Mais ordinário ainda o pré-candidato Ciro Gomes expressar o desejo de ter o PSB e marcar encontro com o DEM, a quem já insultou, inclusive esta semana mesmo, ao dizer que pretende criar um núcleo de esquerda na sua candidatura para depois abrir o caminho a outros, a serem recebidos fora da sala vip. Do périplo pela Força Sindical, então, nem se fala.
O pré-candidato do Solidariedade (SD) é Aldo Rebelo, que há meses vem fazendo o circuito sindical e realizando conversas e palestras Brasil afora, possivelmente o candidato que mais viajou o país, apenas conversando. Rodrigo Maia (DEM) já passou pela Força, Ciro (PDT) foi ontem, certamente Marina e Alckmin (PSDB) também irão, a disputa pelo mundo sindical está aberta.
Algum problema para os pré-candidatos que procuram cada interlocutor desses encontros? Nenhum. Neste momento é exatamente a hora certa de todo mundo conversar com todo mundo. Incluindo Josué Gomes (PR), que ensaia a sua candidatura pelo centro, sem medo de atropelar alguém na via já congestionada.
Nem para o PT, seu extremo, que vem conversando também com muitos, à procura de apoio ao seu candidato a ser indicado na parte legal da campanha, a partir de agosto.
Conversar não tira pedaço, diziam os antigos. E o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não tem se incomodado com os excessos da campanha acintosa, extrarregulação, dos ainda não candidatos.
Todos os postulantes se movimentam, um deles está preso mas redige cartas que podem dar aos seus representantes condições para manter o vigor eleitoral. O eleitor parece não ter em quem votar e demonstra também desinteresse por escolher agora. Portanto, mostrar-se é fundamental.
Os nichos à esquerda e à direita estão consolidados, mas a eleição ainda é abstrata para a maioria da população irritada com tudo e todos.
Nesse clima, o Brasil pode exercitar uma de suas principais características eleitorais: a falta de convergência em torno de programas, ideologias ou qualquer um outro sistema de agregação mais adequado que existe, por exemplo, numa campanha eleitoral da França.
Aqui, não. Um encontro, uma reunião, não significam nada. Ontem mesmo, em reunião com integrantes do Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE), o presidente da Câmara, Rodrigo Maia se exibiu para um sindicato; Ciro Gomes se exibiu para outro, a Força Sindical, que com o SD tem candidato próprio.
Na conversa de ontem, o pré-candidato do PDT, que vem se aproximando do DEM, deixou a senha para explicar o significado deste momento em que ninguém é de ninguém, após encontro com a Força Sindical, em São Paulo. "Não há negociações. Há um ambiente de fofoca e, em cima das fofocas, muita intriga", disse Ciro, com seu pensamento e linguagem peculiares, segundo reportagem de Fernando Taquari. Que conta, também, sobre declarações de Ciro: "Não cometeria qualquer [sic] tipo de indelicadeza de chamar para me apoiar um partido ou aliança que tenha comprometimento. O que quer dizer? Que eu não gostaria do apoio? Não, o oposto", afirmou.
Entendeu? Não. mas ele completa: "O próximo presidente deve estar preparado e ser capaz de unir diferentes forças e concepções políticas sobre a base de um projeto nacional de desenvolvimento, de centro-esquerda". A troco de quê levaria, então, para sua aliança a centro-direita e a direita?
"Com quem o povo eleger será com quem eu negociarei. Pouco importa a sua intriga ou de outrem", ressaltou Ciro, levando mais trevas à compreensão do seu pensamento. Uma de suas propostas mais repetidas é o fim da PEC dos Gastos. Votada e aprovada sob a liderança de Rodrigo Maia, de quem quer se aproximar. Ou não.
Ciro é um dos candidatos que deverão ter mais dificuldade para reunir-se com outros. Para ele, todos já foram, um dia, "salafrários", vagabundos", ladrões", "fascistas", "babacas" e quantos mais adjetivos de má fama existirem na língua portuguesa.
Mas quem ouviu alguém dizer que não conversa com um porque foi insultado por ele, ou porque é privatista, ou não conversa com outro porque é a favor da reforma da Previdência?
Que nada, isso não está em jogo. Aqui, primeiro o sujeito se elege, depois diz o que quer da vida.
O caso de São Paulo é um exemplo clássico, pois o pré-candidato Alckmin apoia dois candidatos ao governo, declaradamente, um por ser do seu partido, outro por afinidade programática compulsória, foi seu vice por anos quando governou o Estado. Apenas uma base territorial os aproxima. Nada junta essas candidaturas a não ser o interesse. No entanto, a campanha segue impávida, sem atropelos constrangedores.
Ontem, Rodrigo Maia foi ao paroxismo da tentativa de definir essa rodada de conversas dos candidatos: "Dialogar com Bolsonaro não tem problema, mas tem mais dificuldades de a gente conseguir construir uma aliança com ele". Por quê? Simplesmente porque a aliança em que Rodrigo deve estar, quando chegar a hora (fim de julho, começo de agosto) é ao centro, e Jair Bolsonaro, o pré-candidato em primeiro lugar nas pesquisas, está à direita.
Há algo mais parecido com isso do que a declaração "vamos conversar para que a gente pactue uma agenda de recuperação para o país nos próximos anos (Maia), ou, com a "construção de um plano nacional de desenvolvimento, para enfrentar um quadro de desindustrialização"? (Ciro)...
O momento é exploratório, de exibicionismo e falsidade e não dá para levá-lo muito a sério.
De olho no tempo da TV
Ensaio feito pela XP sobre a relação entre as alianças prováveis e a soma do tempo de propaganda gratuita na TV de cada candidato mostra como estão longe da realidade concreta essas conversas exploratórias. Segundo o trabalho, Geraldo Alckmin (PSDB) está em primeiro lugar, com 5min (aliado ao PSD, DEM, PTB, SD, PRB, PP, PSC).
Em segundo vem Fernando Haddad (PT), com 1min40s, em voo solo.
Em terceiro, Ciro Gomes (PDT), com 1min30s (aliado ao PSB e PCdoB).
Em quarto Jair Bolsonaro (PSL) com 9s em voo solo.
Em quinto Marina Silva (Rede), com 8s também em voo solo.
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