- Folha de S. Paulo
Avaliação presidencial, mercado, confiança na economia, paz política: tudo piora
A barulheira virtual abafa várias notícias do mundo dos fatos da economia e da política, que seguem devagar quase parando e malparados, no entanto.
No universo do trabalho, dos negócios, das empresas e das expectativas, o assunto mais relevante dos cem dias do Brasil sob o governo de Jair Bolsonaro foi a estagnação produtiva e a reversão dos ânimos políticos e econômicos.
As empresas levantaram menos dinheiro no mercado de capitais neste primeiro trimestre do que no início de 2018 (venda de novas ações, empréstimos via debêntures e outros títulos, captações no exterior etc.). Os dados foram divulgados nesta quinta-feira (11) pela Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais).
O custo e o risco de levantar capital estão mais altos, em suma.
A CNI (Confederação Nacional da Indústria) rebaixou sua previsão de crescimento do PIB industrial para 2019 de 3% para 1,1%, também nesta quinta-feira. Reduziu sua estimativa do crescimento do PIB de 2,7% para 2%. Ainda está até otimista. O pessoal de consultorias e bancos já começa a chutar na direção de 1,5%.
Como já se sabia, de resto, também a confiança de consumidores e empresários regrediu, a perspectiva de melhoria no mercado de trabalho se aproxima de zero e o crescimento do PIB no primeiro trimestre deve ter ficado por aí. Não é sinal de que a atividade econômica esteja embicando inevitavelmente para baixo, mas é um aviso de que o caldo está entornando rápido.
A inépcia do governo degrada um pouco as condições financeiras (juros, Bolsa, câmbio, risco), mas já por tempo bastante para causar incômodo e, daqui a pouco, efeitos reais na economia.
A irritação começou no terço final de março, quando o presidente e sua guarda ideológica fizeram questão de criar caso com lideranças no Congresso que se tinham declarado aliadas do governo, tal como Rodrigo Maia, presidente da Câmara, mas não apenas.
A desaceleração da economia no primeiro trimestre nada tem a ver com Bolsonaro, mas a degradação de expectativas é sim obra do novo presidente e do núcleo puro do bolsonarismo.
Dá para virar o jogo: a cada dia, seu tormento. Mas o governo não falha em dar tiros no pé ou na testa, diariamente.
Não é este o governo do ajuste fiscal? Bolsonaro então diz que vai cumprir a promessa de anistiar dívidas previdenciárias de ruralistas, por baixo R$ 12 bilhões, dinheiro que não tem nem de onde tirar (e, se o fizer, deve burlar a lei fiscal ou a orçamentária).
Para piorar, contraria seu próprio Ministério da Economia.
A Câmara anuncia que vai tocar uma reforma tributária razoável e respeitada, um projeto liderado pelo economista Bernard Appy.
Gente do governo diz então que quer aprovar uma outra, que pode até incluir uma espécie de CPMF, ideia que costuma causar revolta ou escárnio na elite econômica.
O governo anuncia que quer aprovar a autonomia do Banco Central, projeto “pop” entre o eleitorado bolsonarista de elite, mas nem isso dá certo, pois a Câmara já tem um projeto seu e se sentiu outra vez esnobada ou atacada pela falta de modos políticos do governo.
As conversas do presidente com lideranças partidárias até agora não surtiram efeito maior, se algum. O centrão continua entre ressabiado e avesso ao governo, o PSL presidencial ainda é uma bagunça e não há quadros bastantes no Planalto e no Congresso para articular uma coalizão partidária.
Até agora, a maior obra do governo foi o desânimo.
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