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Silêncio perigoso
Imagine-se jogando uma partida de xadrez. Você joga com as peças brancas ou as pretas. Seu adversário é o Poder.
Você é um bom jogador. Pratica há anos. Leu os livros dos grandes mestres. Participa de torneios. E costuma sair-se bem.
Mas enquanto você respeita as regras do jogo, o Poder, não. Seu Bispo só se move na diagonal. O do Poder, como ele quer.
Seus peões só avançam uma casa de cada vez. Os do Poder avançam quantas casas ele quiser, podem recuar ou andar de lado.
Ah, a Rainha – a peça mais importante no tabuleiro! Você joga com uma. O Poder joga com duas desde o início da partida.
Impossível que você vença. Simplesmente impossível. A não ser que o Poder cometa um erro estúpido, indigno de um iniciante.
Talvez com algum exagero, é o que acontece no confronto desigual entre a imprensa e o Poder que desrespeita as regras do jogo.
Jornalista não pode mentir. Pode errar – e se erra, é obrigado a reconhecer que errou e a pedir desculpas.
O Poder mente, mente muito, mente descaradamente. E se flagrado mentindo, joga a culpa na imprensa. Diz que foi mal interpretado.
Pergunte a um governante sobre seus erros. Ele gagueja e, quando admite ter errado, cita os erros mais irrelevantes.
É mais fácil lidar com um governo ditatorial do que com um governante eleito que usa a mentira como a sua maior arma.
A ditadura diz o que pode e o que não pode ser publicado – e, quando nada, ficamos sabendo das coisas que ela quer esconder.
O governante mentiroso é mais letal porque mente para esconder, mas mente também para enganar os que acreditam nele.
O objetivo de um governante mentiroso é desmoralizar a imprensa para enfraquecê-la, e assim alargar os limites do próprio poder.
Onde existe democracia sem uma imprensa livre e robusta? Onde? Uma imprensa castrada é antessala da ditadura.
O que pretende um governante que por hábito ataca a imprensa como instituição, agride repórteres com desaforos, corta assinaturas de jornais e ameaça os seus anunciantes?
Tudo, menos respeitar o Estado de Direito sob o qual foi eleito. Ao fim e ao cabo, por mais que não confesse, quer destruí-lo para poder jogar sozinho.
Se a oposição, por fraqueza ou temor, não o incomoda, ele precisa de outros supostos adversários para se bater e derrotar.
O confronto é a vitamina que o faz sentir-se vivo, e forte, e indestrutível, e capaz de alcançar o que almeja.
Pouco se lhe dá se a maioria dos governados discorda dos seus propósitos. Basta-lhe uma fração aguerrida de devotos e… O silêncio.
O silêncio dos inocentes. O silêncio dos culpados. O silêncio dos omissos. O silêncio dos que se negam a enxergar. O silêncio dos oportunistas. O silêncio dos covardes.
O silêncio é o principal aliado de um governante com vocação de ditador. E, se um dia, o silêncio vier a se quebrar, poderá mesmo assim ser muito tarde.
Então dará lugar ao choro dos arrependidos e à euforia dos insensatos.
Quem é “seu Jair”
Pergunta que não quer calar
A Polícia Civil do Rio espera pacientemente que retorne das férias o porteiro do condomínio da Barra da Tijuca onde moravam Jair Bolsonaro, então deputado federal, e o policial aposentado Ronnie Lessa no dia em que a vereadora Marielle Franco foi assassinada.
Entre as muitas perguntas que lhe caberá responder, a principal talvez seja esta: Quem é “seu Jair” com o qual o senhor diz ter falado por telefone naquele dia? Foi Jair, o pai, ou foi Jair Renan, o filho, conhecido também como Zero Quatro?
Ao que informou, ontem, o jornalista Lauro Jardim, colunista do jornal O Globo, foi outro porteiro, não o que está de férias, que falou por telefone com Lessa. O segundo porteiro dessa história é o que apareceu na gravação periciada por Carlos Bolsonaro, o Zero Dois.
Foi com base nessa gravação que os peritos do Ministério Público, num espaço de menos de três horas, concluíram que o porteiro por ora desaparecido mentira.
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