- O Globo
Ele não sabe de nada, não controla coisa alguma
Pronto. Bolsonaro outra vez deu um passo atrás, e lá vamos nós passar a mão na sua cabeça. A história se repete. Como um moleque bagunceiro que faz arte, depois carinha de bebê chorão, e todos acham que ele realmente se arrependeu e ficam felizes porque o menino finalmente se emendou e agora vai ser um bom rapaz. Bobagem! Bolsonaro não se emenda.
Primeiro ele convoca uma manifestação contra o Supremo e o Congresso, depois volta atrás e diz que não é bem assim. Com o coronavírus na porta, faz pronunciamento dizendo que não é hora de aglomeração. Depois, incontido e falso, vai à manifestação e se esbalda com os manifestantes. Não bastasse o gesto político, o menino travesso se agarra à turba e, mais do que se submeter ao contágio, pode estar contaminando as pessoas, já que ele é o risco. Dezessete dos seus mais próximos assessores testaram positivo, até o braço-direito general Heleno.
Mais adiante reclama da “histeria” que toma conta do país, ataca governadores por tomarem corretas medidas de controle e diz que isso atrapalha a economia, lamenta que vendedores de mate perderão seu sustento com o cancelamento de jogos de futebol e se diz preocupado com flanelinhas porque ninguém sai de casa. Todos condenam o comportamento absurdo do presidente, e ele volta atrás. Mas depois faz um post dizendo que ele e a mulher vão fazer uma festinha para comemorar seus aniversários que estão chegando. É um aloprado. Alguém tem dúvida?
Em seguida, por orientação do Ministério da Economia, manda mensagem ao Congresso pedindo autorização para decretar estado de calamidade. Com o decreto, o governo pode remanejar despesas e fazer gastos não previstos sem infringir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Medida vital num momento como este. Ah, que bom, o moleque se corrigiu, nem tudo está perdido. Seríamos tolos se acreditássemos em mais essa. O fato é que ele não está mais no comando. Bolsonaro não importa. Não deve ser levado a sério. Ele não conta.
Somos condescendentes com ele porque, afinal, se trata do presidente. Foi eleito pelo voto para governar o país. Só que não governa. Bolsonaro é um irresponsável. Fica cada vez mais claro mesmo para os que o cercam e usufruem do poder que a ele foi concedido pelos eleitores. Ministros, secretários, assessores fora do círculo infernal da família não suportam mais nem ouvir a sua voz. Suas audiências continuam acontecendo, mas muitos dos seus subordinados só vão a ele quando são chamados, não pedem despacho.
Bolsonaro é um problemão que precisa ser resolvido. E já está sendo, aos poucos. As medidas contra o vírus tomadas acertadamente pelos ministérios da Saúde e da Economia ocorrem à revelia do presidente, como o decreto de calamidade pública. Ele não sabe de nada, não controla coisa alguma e não comanda ninguém além da turma ideológica que o cerca, o contamina e por ele é contaminada.
Ontem, o capitão se materializou liderando um grupo de ministros mascarados no Palácio do Planalto. Falaram das medidas já em curso e anunciaram o decreto de calamidade pública. Foi uma pajelança desenhada para reconstruir a imagem do presidente. Ao ser perguntado sobre as declarações de histeria, disse que cumpria seu papel de tranquilizar a nação. Sobre seu encontro com os manifestantes de domingo, falou que se comportava como o líder de uma batalha. Disse que estava dando um bom exemplo e ainda jurou amor ao Congresso e ao Supremo. Francamente, alguém cai nessa?
No auge da maior crise sanitária dos últimos cem anos, nem mesmo o super esquisito Boris Johnson conseguiu superar o extra ordinário Jair Bolsonaro. Como ele, apenas o presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, que no fim de semana saiu às ruas abraçando e beijando populares. Obrador faz discurso muito parecido com o do capitão brasileiro. Claro que estamos falando de um populista, como Bolsonaro, só que de esquerda. Opostos politicamente, mas iguais na estupidez. Nem Lula seria capaz de ir tão longe.
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