Precisamos
de uma ação coordenada e planejada para lidar com esta crise
Mesmo
com sorte e acesso à vacinação, ainda teremos de enfrentar os efeitos da
pandemia sobre a economia ao longo de todo o ano de 2021. Isso significa um
esforço de políticas públicas e ações de enfrentamento por algum tempo e,
consequentemente, a necessidade de se focar em iniciativas de apoio que estejam
direcionadas aos setores e às camadas da população mais atingidos. Essas
deverão substituir os amplos programas de socorro que foram o padrão na
primeira fase de enfrentamento e que foram tão importantes para minimizar os
efeitos primários da interrupção da atividade econômica. A provisão de liquidez
foi fundamental. Agora é hora de olhar para a solvência.
Essa é a conclusão de um relatório recém divulgado pelo Grupo dos 30, grupo consultivo para assuntos de economia internacional e monetários. O G-30 é composto pelos atuais e ex-chefes dos bancos centrais da Argentina, Brasil, Grã Bretanha, Canadá, China, França, Alemanha, Índia, Israel, Itália, Japão, México, Polônia, Cingapura, Espanha e Suíça, além dos presidentes do Federal Reserve Bank de Nova York, do Banco Central Europeu, do Comitê de Supervisão Bancária de Basileia, do Bank for International Settlements (BIS), dos economistas-chefes do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial. Participam também representantes de grandes bancos privados e membros de instituições acadêmicas e internacionais.
Ressuscitando
e Reestruturando o Setor Corporativo Pós-Covid – Desenhando intervenções de
política pública (Reviving and Restructuring the Corporate Sector
Post-Covid - Designing public policy interventions) é o título do
estudo. Ele visa a alertar formuladores de políticas públicas sobre os riscos
de, passado o primeiro momento de enfrentamento e realizada a expectativa de
vacinação da população, se buscar restabelecer o status quo pré-pandemia,
ignorando as transformações que em boa parte se manterão ao longo deste ano,
senão de forma perene, sobre o mundo corporativo. Agora é hora de permitir uma
realocação de recursos e garantir que as economias sairão melhores das transformação
ocorridas nesses últimos tempos. Nesse processo, instituições financeiras e o
mercado de capitais terão papel fundamental e precisarão estar prontos para
apoiar essas transformações e os impactos delas sobre as empresas. Mais
desenvolvido e profundo o mercado financeiro, maiores as chances de recuperação
econômica – e mais rápida ela será. Além disso, alertam os membros do grupo de
trabalho liderados pelos ex-banqueiros centrais Mario Draghi e Raghuram Rajan, caberá aos governos
estabelecer as condições para que isso aconteça, se afastando cada vez mais das
ações amplas de apoio e se concentrando em iniciativas mais focalizadas e de
maior eficácia.
Na
medida em que as ações emergenciais vão sendo retiradas, segue o relatório, há
que se antecipar um conjunto de problemas que deverão emergir e que exigirão
respostas de políticas públicas adequadas. Esses problemas vão desde as
distorções geradas pelas políticas de apoio à liquidez (que não necessariamente
atuaram de forma proporcional aos impactos diversos sobre diferentes setores),
passam por eventuais problemas de sobreendividamento, gerados pelo estímulo ao
crédito num ambiente de fraca atividade econômica e vão até uma intervenção
excessiva do setor público, causando alocações subótimas de recursos.
Não
menos importante e particularmente grave no Brasil, são os impactos fiscais das
medidas de enfrentamento e a falta de sustentabilidade dessas ações no longo
prazo. Para guiar o enfrentamento desses problemas o relatório avança com
recomendações baseadas em princípios e instrumentos de política pública e
acompanhados de um processo de decisão que leva em conta as particularidades
locais. Não os exponho aqui pelas restrições de espaço, mas também para deixar
ao leitor curioso a possibilidade de se aprofundar nas possibilidades e nos
detalhes ali apresentados.
A
mensagem principal que fica desse trabalho é a de que precisamos de uma ação
coordenada, planejada e focalizada para lidar com esta que é uma crise sem precedentes
na História. Dados os efeitos – temporários e permanentes – da pandemia, há que
se criar as condições para que a economia se recupere, protegendo vidas,
entendendo as limitações de cada país, mas também minimizando o custo para a
população e para as gerações futuras. Para isso será necessário garantir que o
setor privado assuma seu papel com ações de política pública que restaurem a
confiança, garantam a solvência (em particular a do setor público) e tragam
resultados estruturais.
Sem
dúvidas, um grande desafio para um país como o Brasil, que tem um governante
que nega a pandemia e um governo que demonstrou baixa, senão nenhuma,
capacidade de coordenação e planejamento. Mas sempre é tempo de sair da
paralisia e apresentar um plano de recuperação que possa nos trazer esperança
de que dias melhores virão quando o dia seguinte da pandemia chegar.
*Economista e sócia da Consultoria Oliver Wyman.
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