quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Maria Hermínia Tavares: Delírio ou desfaçatez

Folha de S. Paulo

Desmatamento na Amazônia subiu 56,6% de agosto de 2018 a julho de 2021

No domingo (6/2), os leitores desta Folha foram apresentados ao que seria o rascunho de um cartapácio da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, contendo nada menos de 200 diretrizes de ação governamental. Não ficou claro, porém, se foram imaginadas para ser cumpridas nos meses que podem restar a Bolsonaro no Planalto, como plataforma de candidato à reeleição, ou só para não deixar ociosos os comandados do almirante Flavio Rocha, chefe do órgão.

De toda forma, as presumíveis propostas surpreendem pela distância entre o que sugerem e o que tem sido dito e feito —ou, não— pelo governo do ex-capitão. Abrem alas o compromisso expresso com a eliminação do desmatamento ilegal; o fomento à bioeconomia e à floresta em pé; o aumento da capacidade de monitoramento dos biomas e a afirmação da sustentabilidade como eixo do desenvolvimento. Delírio ou desfaçatez —dá no mesmo.

Enquanto isso, estudo recente do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) constata que, entre agosto de 2018 e julho de 2021, as taxas anuais de desmatamento subiram 56,6% em relação aos três anos anteriores. Mais da metade do estrago ocorreu em terras da União —florestas públicas não destinadas e unidades de conservação—, bem assim em terras indígenas. Nada que surpreenda.
De seu ângulo, o Greenpeace estima que 1/3 da devastação da floresta tropical se dá hoje em terras públicas. Para entender o processo, a ONG prescrutou o que vem acontecendo em quatro áreas críticas no entorno da BR-163, na sua porção amazônica. Encontrou o esperado: inegáveis evidências de roubo e venda irregular de áreas que a União deveria proteger.

O aumento do ritmo da derrubada não se deve ao acaso nem ao imponderável. O estudo do Greenpeace, apropriadamente intitulado "Grilagem: uma empreitada conjunta do governo federal e do Congresso", mostra que o rentável mercado da apropriação ilegal de terras viceja sob a maligna negligência do governo e a expectativa de aprovação de alguns dos projetos que tramitam no Parlamento para pavimentar o caminho à regularização da propriedade das terras açambarcadas.

Políticas regulatórias, como as de defesa ambiental, nascem de incentivos às condutas desejadas, de punições daquelas que se quer banir e, sobretudo, da fiscalização da obediência às regras estabelecidas.
Em tempos idos, o país mostrou que sabia fazê-las bem, acumulando um patrimônio institucional reconhecido no exterior. Hoje, ele sangra sob o bolsonarismo instalado no Planalto e representado no Legislativo federal.

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Até a própria natureza está pedindo para o Bolsonaro sair,e não ''ficar'',como no samba da Beth Carvalho,rs.