sexta-feira, 22 de julho de 2022

Vinicius Torres Freire - Inflação ainda está bem viva

Folha de S. Paulo

Preços das commodities até compensa carestia do dólar, mas há outros problemas

O real voltou a ser uma das moedas mais desvalorizadas do mundo, seja em relação a um ano ou ao início da epidemia. Foi-se a melhora surpreendente que se viu de janeiro a abril (dólar a R$ 4,76, na média de abril, ante R$ 5,41 na última semana). Pegamos um dos bondes da desvalorização quase mundial em relação ao dólar, mas pegamos aquele que corre mais ladeira abaixo, quase como de costume.

A diferença agora é que, no que diz respeito a inflação, a resultante poderia não ser tão ruim, por um lado (o lado de preços de commodities). Mas a pressão inflacionária pode vir de outro lugar.

O preço de commodities relevantes, grãos básicos, açúcar, ferro e cobre, carnes e mesmo o do petróleo, por exemplo, passou a cair em ritmo que compensa a carestia do dólar no Brasil. Em reais, apenas o preço do barril do petróleo está mais caro (muito mais caro) do que no início do ano, por exemplo. É bom, mas é ruim: é medo ou sinal de recessão global.

Isso quer dizer que a inflação de produtos ligados a esses preços pode subir menos, pode haver menos pressão, vamos dizer assim. Não quer dizer, necessariamente, que vai. Os preços ao consumidor não dependem apenas desse fator. Mas um bode colocou uma parte do corpo para fora da sala. Outra parte ainda empesteia o ambiente.

Primeiro, pode ser que indústria de transformação e comércio decidam recuperar margens: decidam recuperar o extra que cobram além dos custos que têm, margem que em vários casos estava achatada ou, dito de modo mais neutro, menor do que a esperada ou requerida pelos donos do negócio. Em conversa reservada, um ou outro executivo de supermercado, por exemplo, diz coisa assim.

A recuperação de margem seria um plano, não é uma decisão que se tome facilmente. Depende, por exemplo, da reação dos consumidores na boca do caixa, por assim dizer. Essa reação, depende do que vai ser da renda real disponível nos próximos meses.

O rendimento médio real, o salário médio descontada a inflação, ainda caía muito até maio, último dado disponível, em relação a maio do ano passado. Mas a situação pode despiorar.

A inflação vai cair um tico por causa de intervenções do governo: redução de impostos sobre energia e combustíveis, principalmente.

O aumento nominal do salário médio tem sido crescente. Em novembro do ano passado, por exemplo, crescia nada (sempre em relação ao mesmo mês do ano anterior, neste caso novembro de 2020). O aumento nominal ganhou ritmo, desde então. Agora em maio deste 2022, crescia a 4,9% ao ano.

Sim, o salário médio ainda perde da inflação. O ganho real é abaixo de zero, o IPCA sobe mais do que o salário médio. Mas a situação despiora.

Alguns economistas chegam a dizer que a taxa de desemprego, apesar de horrível, está baixando a um ponto de que não contribui mais para segurar preços (por meio de salários). Parece perverso, mas é o argumento.

O fato é que os salários nominais crescem de modo acelerado desde o final de 2021. Se isso vai pesar na inflação, sabe-se lá. De resto, é preciso saber se a desaceleração da economia prevista para a segunda metade do ano vai acabar até com essa despiora do salário médio.

Em terceiro lugar, temos o problema da inércia: inflação mais alta gera inflação alta por meio de indexação formal, informal e reajustes preventivos por causa de expectativas de preços altos adiante.

Dadas as reduções de preços devidas a intervenções do governo, a previsão para o IPCA para este ano caiu da casa dos quase 9% para 7,5%. Para o ano que vem, 2023, vem subindo e já está em 5,2%, muito além da meta do Banco Central, de 3,25%. Os juros ainda vão ficar altos por muito tempo. Mais herança maldita para 2023.

2 comentários:

Anônimo disse...

E enquanto o ministro for o Paulo Guedes vai ser assim. Não é ele que fez fortuna cambalachando com o dólar. Isso é o que faz ministro, guardando sua fortuna

ADEMAR AMANCIO disse...

A inflação está mais viva do que nunca.