Correio Braziliense
O livro tem um olhar crítico sobre a atuação de
Prestes, sem embargo de reconhecer seu papel decisivo na história do Brasil
Biógrafo do jornalista Carlos Castelo
Branco (Todo aquele imenso mar de liberdade) e do senador Teotônio Vilela
(Senhor República), o escritor e jornalista político Carlos Machi lança hoje o
seu mais novo livro: Longa jornada até a democracia (Fundação Astrojildo
Pereira), o primeiro volume de uma história dos 100 de fundação do Partido
Comunista Brasileiro (PCB), desde as ideias que lhe dariam origem, em 1922, até
a realização do VI Congresso, em dezembro de 1967. Será às 19h, no Beirute,
tradicional reduto de estudantes, jornalistas e boêmios de esquerda, na Asa Sul
do Plano Piloto de Brasília.
Quem imagina uma obra apologética e maniqueísta, irá se surpreender. O livro conta a história do PCB como quem prepara o peixe com um olho no gato e o outro na frigideira. O duplo olhar de Marchi contextualiza o papel do PCB na história do Brasil e, ao mesmo tempo, mostra as contradições de seus dirigentes com a antiga União Soviética, e entre eles próprios. Um processo no qual uma das vítimas foi o próprio fundador do partido, o jornalista e escritor Astrojildo Pereira, que caiu em desgraça após uma viagem a Moscou, em 1930, mesmo depois de capitular diante dos dirigentes do Comintern, que consideravam muito próxima uma revolução comunista no Brasil.
Havia, sim, uma revolução em gestação, mas
era a de 1930, liderada por Getúlio Vargas, com adesão dos líderes tenentistas.
Entretanto, não obteve apoio de Luiz Carlos Prestes, que havia se aproximado
dos comunistas. Astrojildo lhe entregara uma mala de obras marxistas durante o
exílio do comandante da Coluna Prestes na Bolívia. Por pura ironia, Prestes
voltaria ao Brasil anos depois, para fazer a tal revolução, enquanto Astrojildo
amargava o ostracismo político: vendia bananas e escrevia críticas literárias e
ensaios sobre a sociedade brasileira.
O livro tem um olhar crítico sobre a
atuação de Prestes, sem embargo de reconhecer seu papel decisivo na história do
Brasil. O líder comunista teve o destino do país nas mãos em 1930, quando
recusou o comando da Revolução, e em 1945, quando saiu da cadeia e decidiu
apoiar Vargas, na redemocratização. Quando o ex-ditador voltou ao poder, eleito
em 1950, os comunistas lhe fizeram oposição. Só foram defendê-lo depois do
suicídio, em agosto de 1954.
A tórrida paixão entre Prestes e Olga
Benário, a judia alemã treinada pelos serviços de inteligência do Exército
Vermelho e escalada para fazer sua segurança, chamava atenção. Era um casal
improvável: ele, baixinho; ela, muito alta — razão pela qual a volta de Prestes
de Moscou para o Brasil foi uma longa viagem, que durou quatro meses e virou
lua de mel. Percorreram várias capitais europeias, atravessaram o Atlântico até
Nova York, de onde desceram para Montevidéu. A entrada clandestina no Brasil,
com escalas em Buenos Aires e Florianópolis, foi rocambolesca.
Aggiornamento
Marchi põe o holofote nas divergências na
cúpula do Comintern sobre a linha a ser adotada por Prestes e no papel de um
agente inglês infiltrado no grupo de revolucionários que o assessorava. O
alemão Johann De Graaf, que era oficial do Exército Vermelho, desembarcou no
Brasil com o nome falso de Franz Paul Gruber. Foi encarregado de montar uma
caixa-forte que explodiria com os documentos de Prestes e os planos da
insurreição, mas isso não aconteceu. Johann manteve os serviços de inteligência
britânicos informados sobre tudo e chegou a receber uma carta de agradecimento
de Vargas. Olga, grávida quando foi presa com Prestes, foi deportada para a
Alemanha. Morreu num campo de concentração nazista, onde nasceu Anita Leocádia
Prestes.
Ao longo do livro, o foco de Marchi é o
progressivo “aggiornamento” do PCB, da opção pela armada, em 1935, ao
compromisso com a democracia, na Declaração de Março de 1958. Como bom
repórter, revela, em primeira mão, a localização do “aparelho” no qual foi
realizado o 6º Congresso do PCB, em São Paulo, em 1967, quando o partido adotou
a linha de ampla frente democrática para a redemocratização do país e rechaçou
a opção pela guerrilha urbana contra o regime militar, defendida pelo líder
comunista Carlos Marighela e alguns dirigentes históricos do PCB, sem a menor
chance de dar certo.
Contraditoriamente, na preparação do
congresso, o dirigente comunista Salomão Malina, ex-integrante da Força
Expedicionária Brasileira (FEB) e herói da tomada de Montese, na Itália,
durante a II Guerra Mundial (recebeu a Cruz de Combate de 1ª Classe), perdeu os
dedos da mão direita e teve o pulmão perfurado ao desativar uma granada
defeituosa. Em coma, foi operado clandestinamente no Hospital das Clínicas de
São Paulo.
Sapador, Malina estava encarregado de garantir a fuga de Prestes caso o congresso fosse localizado pelos órgãos de segurança do regime militar. Mais tarde, seria o último secretário-geral do partido e, em 1991, apoiaria a mudança do nome e da sigla do PCB para PPS, atual Cidadania.
2 comentários:
Alguns dos melhores e outros dos piores homens foram comunistas!
Cidadania é o antigo PCB,bom saber.
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