Valor Econômico
Lula sinaliza que precisa de paz nos
quartéis para fazer o que pretende na economia
Ao abrir as nomeações para o ministério por
Fernando Haddad e José Múcio Monteiro, provavelmente na segunda-feira, 5, o
presidente eleito parece sinalizar que precisa de paz nos quartéis para fazer o
que pretende na economia. Diferentes em tudo, dos 25 anos que os separam às
trajetórias na política, as indicações sinalizam, além da confiança de Lula,
sua convicção de que não dá para comprar todas as brigas ao mesmo tempo.
Ninguém no PT hoje comunga tanto o ideário
lulista quanto Haddad. Se Antonio Palocci, autor de uma delação falsa, foi a
maior decepção de Lula no PT, o ex-prefeito, que ruma para ocupar o mesmo
lugar, é sua expectativa de redimi-la. Desde que a caserna seja despolitizada.
Os militares hoje se dividem entre bolsonaristas e antibolsonaristas. Só o antipetismo os une. Isso é parte da explicação para a preferência, na Defesa, do engenheiro que iniciou sua carreira pública no PDS e, em sua primeira disputa eleitoral, que Múcio conta com bom humor até hoje, perdeu de lavada o governo do Estado de Pernambuco para Miguel Arraes.
Nelson Jobim era o preferido da base
lulista, entre outros motivos, porque já se mostrou capaz de impor autoridade
civil sobre os militares. A falta desta mercadoria nas prateleiras da transição
é reconhecida até por um general que já comandou a Defesa: “Se fossem do MST,
esses manifestantes teriam tolerância zero dos quartéis”.
O convite a Jobim, que ocupou o cargo no
segundo governo Lula, não aconteceu. Anfitrião do almoço que, no ano passado,
reaproximou o presidente eleito do antecessor, Fernando Henrique Cardoso, o
ex-ministro indicou integrantes para o grupo da Defesa em contato feito por
emissário de Geraldo Alckmin.
O grupo acabou por não se concretizar e, no
último contato com Lula, no fim de semana, Jobim limitou-se a distensionar as
relações do mercado financeiro, onde hoje atua, com o presidente eleito - um
meio de campo quase tão minado quanto aquele que hoje separa os militares da
transição.
Múcio nunca perdeu o contato com Lula desde
que deixou a pasta de Relações Institucionais de seu governo. Nem mesmo quando,
ministro do Tribunal de Contas da União, cargo para o qual foi indicado por
Lula, reprovou as contas da ex-presidente Dilma Rousseff.
Antes de a presidente do PT, Gleisi
Hoffmann, ligar para Múcio convidando-o para a reunião que acabaria acontecendo
na semana passada com Geraldo Alckmin e militares da reserva, chegou à
transição a notícia de que os comandantes pretendiam entregar os cargos antes
da posse.
“Quem entende dessa área é Aldo [Rebelo]”,
rebateu Múcio no telefonema, sendo aconselhado a procurá-lo. O ex-ministro, que
apoiou a candidatura de Ciro Gomes e se afastou dos petistas, fez sondagens e
recebeu sinal verde de militares preocupados com a possibilidade de a Pasta
ficar com Aloizio Mercadante ou Ricardo Lewandowski e repassou-o a Múcio.
Na segunda-feira aconteceu o encontro com
Lula e, no dia seguinte, a divulgação do documento apócrifo “Carta dos oficiais
superiores da ativa ao comandante do Exército brasileiro”. Atribuído a coronéis
da ativa, o documento teve suas digitais rastreadas até o Palácio do Planalto.
Se os comandantes resolverem levar à frente
essa disposição de entregar os cargos antes da posse, caberia ao atual
presidente indicar os substitutos escolhidos por Lula. São três os generais, da
mesma turma, que preencheriam o critério da antiguidade, Julio Arruda
(Departamento de Engenharia), Valerio Stumpf (chefe do Estado-Maior do
Exército) e Tomás Paiva (comandante do Sudeste). Os dois últimos foram
incluídos na lista de “melancias” dos bolsonaristas.
É uma missão quase impossível. Não está
dissociada desta tensão o pedido de Lula, já aceito, de antecipar em uma semana
a diplomação pelo TSE, agora marcada para o dia 12. Vem daí a busca pelo
engenheiro filho da elite usineira de Pernambuco que convidava o líder das
Ligas Camponesas, Francisco Julião, para suas rodas de violão e é amigo de
Bolsonaro.
Múcio é aquele, do entorno lulista, que tem
a melhor relação com o atual presidente. A afeição é pública. “Sou apaixonado
por você, José Múcio. Gosto muito de Vossa Excelência”, disse-lhe Bolsonaro num
evento público no final de 2020.
Vencida esta etapa mais conflitiva da
transição, outros predicados valorizam o passe de Múcio. Quando ministro das
Relações Institucionais fez gestões, junto aos donos do Orçamento, a pedido dos
comandantes. Mais recentemente, nas varreduras do TCU nos contratos do
Ministério da Defesa, mais de um ministro ouviu dele um “vão com calma”.
O predicado, visto por uns como sinal de
conciliação excessiva, é, para outros, um caminho que pode favorecer a volta
dos militares para a caixinha da qual nunca deveriam ter saído. Envolve o que
terão que abrir mão se quiserem preservar, além do CPF, benesses como a reforma
dos benefícios previdenciários arrancada deste governo.
Só o andar da carruagem será capaz de dizer
se outros avanços serão possíveis, como a reforma do currículo das escolas
militares, no sentido de podar o cultivo do golpismo, ou mesmo a reforma de uma
carreira que permite a existência de 16 generais de quatro estrelas no Brasil,
enquanto no maior exército do mundo, o americano, são apenas 15.
Se uma autocrítica do conjunto da obra hoje
parece uma concessão intolerável para os militares, definitivamente a perda de
postos de comando de quem se insurge contra as instituições não o é. Há uma
penca de oficiais que, desde a posse de Bolsonaro, permanecem sem punição.
Tampouco parece aceitável que ainda se volte a comemorar datas como o golpe de
1964. Enquanto as Forças Armadas não se limitarem a celebrar o que une o país,
e não aquilo que o divide, estará mantido o liame com o bolsonarismo.
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O apoio do PT à recondução do atual
presidente da Câmara é um indicativo de que o presidente eleito avalia ser mais
custoso montar uma base parlamentar do que alugar aquela do deputado Arthur
Lira (PP-AL). Até porque estão em jogo os recursos para dar início ao governo.
A posição sugere que os ministros a serem indicados conjuntamente depois da
diplomação têm dois anos, até a renovação das Mesas Diretoras do Congresso,
para se mostrarem imprescindíveis e infensos à composição da base parlamentar
almejada por Lula.
Um comentário:
Maria Cristina Fernandes.
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