Folha de S. Paulo
Frente de batalha contra extremistas também
é cultural, no plano dos valores
A democracia convive mal com a radicalização
política. Por isso, desradicalizar, verbo que arranha os ouvidos, é uma das
tantas urgências que o governo e a sociedade brasileira têm diante de si.
Na sequência das imagens panorâmicas do ataque da extrema direita que a TV transmitiu ao vivo, no domingo (8), as emissoras vêm mostrando, a cada dia, os detalhes da destruição. Ela foi gestada pela pregação de Bolsonaro contra as eleições e as instituições democráticas; facilitada pela omissão do governo do Distrito Federal; e executada por indivíduos que se consideram em guerra contra um imaginário perigo comunista, contra o qual pensavam desencadear o golpe final.
A diversidade dessa tropa aparece de corpo
inteiro no documentário
"As Vozes de Bolsonaro", da jornalista Carla Araújo e
disponível no portal UOL. E uma primeira tentativa de entender os executores da
devastação e como são mobilizados pode ser seguida na série
"Extremistas.br" (Globoplay), dirigida por Caio Cavechini.
Eis aí dois poderosos documentos visuais da radicalização que, embora derrotada
nas urnas e pelos três Poderes, não desaparecerá como que por encanto.
De resto, não é a primeira vez que o país
está diante de uma fratura política radical das elites e da parcela engajada da
sociedade. Foi assim entre 1935 e 1937, na sequência da Revolução de 1930 que
levou Getúlio
Vargas ao poder. Foi assim também no início dos anos 1960, durante a
presidência de João Goulart.
Nos dois casos, prevaleceu a solução autoritária: o golpe do Estado Novo, em
1937, abortando o ensaio de governo constitucional, sob a Carta de 1934, e
o golpe
civil-militar, em 1964, sepultando os 18 anos de experiência democrática da
Constituição de 1946.
Por ora, a democracia prevalece, mas
precisará enfrentar —dentro das regras e com os instrumentos que lhes são
próprios— a oposição das falanges do autoritarismo para quem Lula e
o PT são
anátemas.
Apurar responsabilidades e submeter aos
rigores da lei os incentivadores, financiadores,
organizadores e executores do golpe que gorou é imprescindível, mas não basta.
Dissolver a desconfiança entre paisanos e fardados e obter a obediência estrita
destes últimos à Constituição é crucial, mas tampouco suficiente.
Outra frente de batalha é cultural, está no
plano dos valores: pela tolerância política; pela aceitação das diferenças de
crenças e comportamentos; pelo valor da informação fidedigna; pela capacidade
de discernir entre o preconceito e o conhecimento produzido pelas ciências.
Para esse combate não temos experiência prévia nem fórmulas fáceis.
*Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.
3 comentários:
Importantíssimo o que diz a professora Maria Hermínia. E essa luta cultural contra o fascismo do século XXI é uma luta de longo prazo e que depende do projeto educacional do governo da frente democrática. E chamo atenção para o clima cultural cultivado pelo fascismo bundalelê bolsonarista. É como se a gente vivesse num mundo onde fato e ficção se misturam. Versões e narrativas valem mais que fatos e realidades. As pessoas andam chamando urubu de meu louro. Falam em Jesus Cristo e apoiam torturadores. O boçal disse que Jesus não tinha revolver porque no tempo dele não se fabricava isso. É preciso que todos, independente de mais nada, concordem que a natureza é um fato, e que existem pessoas, que as pessoas trabalham para modificar a realidade. E que deve ser um objetivo de todos que a melhor política em relação à natureza é a ecológica e em relação ao próximo a melhor política é o amor.
O candidato falava em VERDADE (a qual nos libertaria...) no seu bordão e inventa e repete milhares de MENTIRAS...
Maria Hermínia Tavares sabe das coisas.
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